Charles M. Blow

Colunista do New York Times desde 2008 e comentarista da rede MSNBC, é autor de “Fire Shut Up in My Bones"

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Descrição de chapéu The New York Times LGBTQIA+

Meu presente de Natal para mim mesmo foi assumir meu orgulho

Um homem de meia-idade apresentar namorado à família pode inspirar outros a serem vistos e ouvidos

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The New York Times

Neste Natal, apresentei meu namorado à minha família. Foi um dos maiores presentes que já me dei. Foi o dom de exigir ser visto pelas pessoas que amo em minha plenitude. Foi o presente de forçar meus mundos a colidirem e, portanto, a se singularizar. Foi o presente de viver na verdade e caminhar em liberdade.

Minha família extensa desenvolveu a tradição de se reunir para celebrar o Natal na semana anterior, para que todos possam estar em casa com a família principal no dia real. Isso também tem a vantagem de permitir que as pessoas se desloquem quando as estradas e os aeroportos estão menos lotados e saiam juntas para atividades quando bares, restaurantes e locais de entretenimento ainda estão abertos.

Uma grande árvore de Natal iluminada é vista à noite
A árvore de natal do Capitólio, em Washington, nos EUA - Sarah Silbiger - 29.nov.22/Reuters

O local da celebração varia entre os membros da família. Neste ano, pela primeira vez recebi os parentes em minha casa em Atlanta —e só pela segunda vez como anfitrião. Quando eu morava em Nova York, era muito longe para pedir que toda a família viajasse, pois quase todos ainda vivem no sul.

Decidi que se minha família viesse à minha casa iria conhecer a pessoa com quem eu estava namorando. Simples assim. Mas para mim isso não era tão simples. Eu nunca tive a sensação de que eles estavam abertos à vida gay.

Na verdade, achava-os hostis a isso. Minha mãe não ficou contente com "Fire Shut Up in My Bones" [fogo trancado nos meus ossos], livro de memórias que publiquei em 2014 no qual me assumi bissexual. Ela nunca chamou o livro pelo título. Nas poucas vezes em que se referiu a ele, disse: "Sabe, aquele livro que você escreveu".

Quando ele se transformou em uma ópera, apenas um dos meus quatro irmãos foi vê-la. Minha mãe não, embora tenha ido ver a exibição do filme no cinema. Ela não me disse o que achou. Mas um dos meus irmãos morreu há alguns anos, e esse acontecimento me mudou completamente.


Agora começo cada decisão com uma pergunta: se não for agora, quando será? A morte dele infundiu minha vida com urgência e clareza. Não há tempo nem espaço para medo ou indecisão. Não há tempo ou espaço para dias e anos perdidos.

Tenho que viver —agora, totalmente, ferozmente. Eu tive que parar de ser autodestrutivo e de viver com autoproteção e autoperdão. No meu caso, não é exagero dizer que a morte do meu irmão não só mudou minha vida, mas a salvou.

Eu achava que estava sendo rejeitado, o que me mergulhou na escuridão. Quando meu irmão faleceu e foi para a luz, eu escolhi a luz. Parte disso foi escolher iluminar todos os meus cantos, para garantir que todas as pessoas que eu amava soubessem quem eu amava e como eu amava.

Meu namorado é bailarino e coreógrafo. Ele estava fazendo um espetáculo na Califórnia no dia em que minha família chegou, mas pegou um voo cedo no dia seguinte para poder encontrá-los antes de partirem. Minha família não fazia ideia de que ele estaria lá. Além de meus filhos e seus primos, eu nem tinha certeza se eles sabiam que ele existia.

Durante dois dias antes de eles se conhecerem, tive dores de cabeça terríveis causadas por tensão. Mas apenas tomei um remédio para dor de cabeça e disse a mim mesmo que era algo que tinha que ser feito.

Naquele sábado, ele entrou na minha casa com toda a minha família lá, e eu o apresentei reflexivamente com uma piada: "Pessoal, esse é o meu namorado. Ele e eu saímos há dois anos e meio. Se alguém ficar chocado com isso, respire fundo e engula com força. Vocês vão superar".

Minha família respondeu da maneira que eu esperava: ninguém perdeu o ritmo. Eles o abraçaram e prepararam um prato para ele, compartilharam amor e risadas. Meu filho mais novo perguntou a ele com um sorriso irônico: "Você precisa que eu lhe prepare uma bebida?" Meus irmãos começaram a perguntar sobre ele e seu trabalho.

Mais tarde, todos pedalamos no BeltLine em Atlanta (mesmo fazendo frio) e naquela noite fomos jogar boliche. Mais amor e risadas.

Em resumo, minha família podia reprovar esse suposto estilo de vida, mas quando confrontados com a verdade sobre minha vida e uma pessoa de carne e osso que eu amava, eles responderam com amor porque me amavam.

Eu deveria ter ficado exultante com tudo isso, mas fui envolvido por um enorme sentimento de arrependimento. Eu esperei e me preocupei durante tanto tempo! Foram anos, décadas de tristeza e dor que poderiam ter sido evitados. Já falei e escrevi sobre a importância da visibilidade, mas tive que aprender essa lição várias vezes. Aprendi que "sair do armário" para mim não é um evento único, mas uma série de eventos.

Eu estava hesitante em escrever esta coluna. Disse a mim mesmo: quem se importa com a jornada de revelação de um homem de meia-idade numa época em que as crianças se assumem antes da adolescência? Mas me lembrei do que aprendi quando escrevi meu livro: não sou o único. Existem outros por aí com histórias semelhantes, pensando que são os únicos.

A eles, os mais velhos, dou o presente de serem vistos e refletidos. Eu dou esta história e espero que ajude. Dou o presente da permissão que dei a mim mesmo e que meu falecido irmão me deu. Feliz Natal.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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