Claudia Costin

Diretora do Centro de Políticas Educacionais, da FGV, e ex-diretora de educação do Banco Mundial.

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O populismo e as saudades de um mundo perdido

Para abraçar órfãos da ordem anterior, é preciso aprender a dialogar e a evidenciar uma empatia verdadeira com o seu sofrimento

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Em livro recente sobre sua vida na presidência, “Uma Terra Prometida”, Barack Obama descreve o aprendizado que teve, durante e após a campanha, para entender as motivações daqueles que se sentiam excluídos não só economicamente mas também por um mundo em mudança que deslegitimava aquilo que anteriormente era prática convencional.

Sim, refiro-me aqui aos órfãos de uma ordem anterior, nos Estados Unidos, em que um jovem branco conseguia um emprego e uma renda de classe média, mesmo sem terminar seus estudos, tinha sensação de pertencimento em cidades pequenas e podia agredir sem medo a quem lhes parecesse estranho ou desagradável.

Mas os tempos mudaram, os direitos civis trouxeram novos atores com voz e vontade de também pertencer, a consciência dos danos que causamos ao ambiente se ampliou e as demandas por boa formação tornaram-se mais fortes.

O que Obama aprendeu a fazer é dirigir-se a todos, não só aos que haviam acabado de conquistar novo espaço, mas também aos que sentiam que o haviam perdido. “Uma casa dividida não se sustenta”, a frase do evangelho de Mateus incluída em discurso de Abraham Lincoln era constantemente repetida pelo presidente. Há que se governar com todos e prestar atenção nos que se sentem preteridos, mesmo que sem razão, afinal, o ressentimento desfocado pode atingir a todos.

Isso não significa render-se a uma lógica equivocada e dar aos órfãos de uma ordem anterior aquilo que desejam de volta, e sim ser empáticos com sua percepção de perda.

No extraordinário livro “Hillbilly Elegy”, de J. D. Vance, publicado no ano da vitória de Trump, o autor tenta fazer o leitor entender o que é este universo perdido, para que uma empatia sem rendição a um passado que não deve voltar possa ser criada. É a isso que Obama se refere.

Ora, o populismo se alimenta exatamente desses ressentimentos com os quais muitos de nós temos dificuldade de dialogar. E triunfa porque apresenta soluções mágicas e impossíveis para a reconstrução do paraíso perdido. Os mineiros de carvão continuarão sem emprego na América do Norte, os agricultores franceses que lutam contra taxas “ambientais” europeias sobre combustíveis terão que lidar com uma solução apenas parcial para suas reais dificuldades econômicas, pois não podemos destruir o planeta.

Contra isso não basta propor alternativas técnicas na forma de boas políticas públicas e escancarar para os novos excluídos a incongruência do seu ódio. É preciso aprender a dialogar e a evidenciar uma empatia verdadeira com o seu sofrimento e, numa língua que não lhes seja estranha, mostrar que outro mundo é possível.

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