Claudia Costin

Diretora do Centro de Políticas Educacionais, da FGV, e ex-diretora de educação do Banco Mundial.

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Descrição de chapéu jornalismo

Mentiras e verdades, o triste papel da desinformação

Só é possível libertar-se de mistificações intencionais por meio do pensamento crítico

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Findos o processo eleitoral e os distúrbios que a ele se associaram, as redes sociais seguiram repletas de notícias fabulosas que chegaram mesmo a incluir uma pretensa presidente do Tribunal de Haia associada ao nome civil e a uma foto de Lady Gaga ou a uma alegada prisão do presidente do TSE, entre inúmeros outros relatos assemelhados aos que consumíamos durante a pandemia.

Mas, fatos como esses, por tristes que sejam, não são novos na história da humanidade. Em dois livros que li recentemente, o "Livre" da escritora albanesa Lea Ypi e o "Fome Vermelha" da Anne Applebaum, a desinformação aparece, em tempos passados, com consequências, por vezes, trágicas.

Lady Gaga estrela fake news de grupos bolsonaristas que pedem "intervenção federal"
Lady Gaga estrela fake news de grupos bolsonaristas que pedem 'intervenção federal' - Reprodução/Twitter

A primeira obra, autobiográfica, retratando a infância e juventude da premiada autora e professora de ciência política na London School of Economics, mostra como, durante o regime de Enver Hoxha, seus pais tiveram que ocultar-lhe fatos de suas histórias de vida ou "biografias", para evitar que sofresse perseguições na escola ou que entregasse inadvertidamente seus pais ao regime. Além disso, a verdadeira situação vivida pelo país era encoberta pela mitificação do líder e de Stálin, o que fez com que Ypi, ao perder a inocência e perceber o que ocorrera, pudesse olhar de forma crítica inclusive para os que se opuseram ao partido na guerra civil de 1997 e que também tentavam encobrir verdades.

O livro de Anne Applebaum, um relato impressionante e bem documentado da grande fome de 1932 a 1934 na Ucrânia, traz a constatação de que autocracias são capazes de intencionalmente dizimar milhares de pessoas para enfrentar riscos percebidos ao seu poder totalitário, como fez Stálin, usando como uma de suas armas a desinformação. O recolhimento de praticamente todos os grãos disponíveis em boa parte do país, a partir de cotas impossíveis de serem atingidas, teoricamente para financiar a industrialização e, mais tarde, para punir pequenos camponeses resistentes às fazendas coletivas, resultou numa fome que levou não só à morte por inanição, mas à destruição completa de cidades inteiras no país.

Um grande esforço foi feito para apagar os arquivos, mudar dados do censo de 1937 que iria revelar o que ocorrera na verdade: um plano para substituir boa parte da população ucraniana anterior por russos e poder, assim, ter de fato a Ucrânia como uma colônia bem-comportada sob a gestão de Stálin.

A desinformação assume múltiplos formatos e vem de diferentes fontes. Mas só é possível libertar-se de mistificações intencionais por meio da promoção do pensamento crítico e da desconstrução democrática de projetos totalitários.

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