Clóvis Rossi

Repórter especial, foi membro do Conselho Editorial da Folha e vencedor do prêmio Maria Moors Cabot.

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Clóvis Rossi

A violência lhe custou R$ 7.438

Se o número de mortos já não choca, olhe para o custo

Operação das forças de segurança na Cidade de Deus, no Rio
Operação das forças de segurança na Cidade de Deus, no Rio - Carl de Souza - 7.jun.2018/AFP

Mesmo que você não tenha sido vítima direta da violência, saiba que ela lhe custou o equivalente a R$ 7.438 em 2017.

Essa é a conta do GPI (Global Peace Index ou Índice Global da Paz-2018), divulgado na semana que terminou pelo Instituto para a Economia e a Paz, sediado em Sydney (Austrália).

O cálculo decorre da presunção de que o impacto econômico da violência na economia global, em 2017, foi de US$ 14,75 trilhões (R$ 55,18 trilhões) em paridade do poder de compra.

Esse valor equivale a 12,4% do Produto Interno Bruto (PIB) do mundo ou, portanto, US$ 1.988 por pessoa —o que, convertendo para o valor do dólar na sexta-feira (8), dá os R$ 7.438 do título e do primeiro parágrafo.

Na verdade, é possível que o valor para cada brasileiro seja ainda maior, bem maior, porque essa é a média global, mas a violência no Brasil é espantosa. Na mesma semana em que foi divulgado o GPI-2018, saíram também os números de homicídios no país, puxados para um inusual título do editorial principal desta Folha (602.960), número de assassinatos nos últimos 11 anos.

No ranking global, o Brasil aparece como o 106º país menos pacífico do planeta, entre os 163 que figuram no GPI.

Para quem desconfia desse tipo de levantamento, informo que o Índice Global da Paz usa 23 indicadores qualitativos e quantitativos, levantados por “fontes bastante respeitadas”, como dizem seus autores. 

Usa três domínios temáticos: nível de segurança doméstica; extensão de conflitos domésticos e internacionais em desenvolvimento; e o grau de militarização.

Puxo o índice para o aspecto econômico porque o Brasil parece anestesiado para a violência cotidiana.

Parece haver um certo conformismo com o fato de que o poder público perdeu o monopólio do uso da força em boa parte do território nacional.

O público vê, todas as noites, no Jornal Nacional, os ataques a ônibus e prédios públicos em Minas Gerais e no Rio Grande do Norte, por exemplo, e já nem reage mais, como se fossem parte de uma série de terror que ocorre em Marte.

A Folha até tentou, no editorial já citado, incitar partidos e candidatos e discutir propostas para enfrentar o problema, mas não houve respostas.

Se o sangue não parece comover as autoridades, quem sabe os dados econômicos provoquem alguma reação. O GPI diz que a paz “tem considerável impacto no desempenho macroeconômico”. Põe números nessa constatação: “Nos últimos 70 anos, o crescimento da renda per capita foi três vezes maior em países de alto nível de paz, quando comparados com os de baixos níveis de paz”.

A diferença é ainda maior quando se comparam países que melhoraram seu nível de paz e os que pioraram. O crescimento da renda per capita foi sete vezes maior nos primeiros em relação aos segundos.

Suspeito que há dois pontos essenciais a pôr na agenda quando se fala de violência: a questão das drogas, que precisa ser enfrentada de uma maneira diferente da guerra a elas, que fracassou, e uma ação conjunta regional.

A América Latina, com só 8% da população mundial, registra 38% dos assassinatos. É óbvio que a violência vaza de um país para outro, se não há coordenação regional. Pode sair caro, mas o custo da inação é maior, como se vê.

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