Colo de Mãe

Cristiane Gercina é mãe de Luiza e Laura. Apaixonada pelas filhas e por literatura, é jornalista de economia na Folha

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Colo de Mãe
Descrição de chapéu Família maternidade

Até quando as mães vão suportar a maternidade na sociedade moderna?

Mães são vistas como cuidadoras da sociedade, fazem um trabalho que esgota, e ninguém liga para isso

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

As mulheres mães são as últimas a serem consideradas na escala de cuidados da sociedade moderna. É a famosa frase: "Quem cuida de quem cuida?", e a resposta é: ninguém. Ou poucos.

Há certa proteção estatal quando pensamos no direito à licença-maternidade ou no acesso a escolas públicas como espaços em que os filhos possam ser recebidos, além do senso coletivo de que as tarefas precisam ser divididas, mas isso é pouco. Bem pouco.

Fora esses pequenos direitos, não há nada mais que nos proteja. Mãe é a primeira a acordar e a última a ir dormir. Muitas vezes, é a primeira a chegar no trabalho e a última a sair. É a última a ser promovida, a ganhar um reajuste salarial, mas é a primeira a ser demitida.

Quem cuida de quem cuida? Ninguém. A sociedade moderna tem levado a um colapso da maternidade - Antonioguillem - stock.adobe.com

Se trabalha muito é tida como relapsa, pois pode ser obrigada a terceirizar os cuidados com a criança —em geral, com rede de apoio paga— e talvez ela mesma quisesse viver esses momentos. Se não trabalha, é tida como alguém sem ambições sociais.

O resultado é que hoje trabalhamos e criamos filhos, sendo cobradas a ter um padrão ouro que nunca nos leva ao topo de pódio nenhum, nem no trabalho, nem na maternidade. Leva-nos apenas ao esgotamento.

Essa equação, que não fecha, e esse cansaço extremo que ninguém enxerga é o que têm feito muitas mulheres desistirem de ser mães ou mesmo adiarem ao máximo a maternidade, pensando estar imunes a situações difíceis que só as mães passam.

Engano. O mundo capitalista do trabalho nos promete algo que não nos entrega, que é o reconhecimento de nosso potencial. E quando a mulher descobre que esse reconhecimento externo não chegará, muita vezes, vai em busca da maternidade como uma forma de felicidade e satisfação, e é "punida" em várias etapas deste caminho.

As inquietações da maternidade têm me tomado dias e noites, porque sinto na pele, como mãe de duas, esse lugar de dificuldade diária. Há mulheres que não gostam de ser chamadas de guerreiras. Eu não ligo, sou de paz, mas todos os dias, tenho que guerrear.

Luto para cuidar de minhas filhas e ter esse espaço respeitado, luto para que a carga não fique só comigo e seja de toda uma sociedade, luto para trabalhar e ter minhas ideias acolhidas, luto para não cair prostrada em um canto e lá permanecer de tão cansada que fico.

Toda essa carga tem nome, se chama maternalismo, e descobri isso ao participar de um bate papo com mães e com a psicanalista Vera Iaconelli, colunista da Folha, doutora em psicologia pela USP (Universidade de São Paulo) e autora do recém-lançado "Manifesto Antimaternalista - Psicanálise e Políticas da Reprodução" (editora Zahar; 256 págs.; ebook R$ 29,90; livro físico R$ 49,90).

Em seu manifesto —que ainda estou lendo— Vera faz um histórico de como chegamos até aqui e trata também de onde vamos parar se não mudarmos o rumo das coisas. Menos mulheres tendo filhos, são menos pessoas produzindo, e as economias já estão sentindo, com envelhecimento e queda da riqueza.

Se não mudarmos a rota, ninguém vai aguentar. Na realidade, pode ser que nem sobrevivamos.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.