Conrado Hübner Mendes

Professor de direito constitucional da USP, é doutor em direito e ciência política e membro do Observatório Pesquisa, Ciência e Liberdade - SBPC

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Conrado Hübner Mendes
Descrição de chapéu Folhajus

O golpe já foi, vai ser ou está sendo?

Bolsonaro e bolsonarinhos não permitirão eleições regulares em 2022, isso sabemos

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Crimes de responsabilidade, crimes comuns e crimes eleitorais em série: do que mais precisamos para conter um autocrata de cartilha? Inflação, desemprego e pobreza subindo, crise hídrica mal percebida, desmatamento em vertigem, 600 mil mortes (boa parte evitável), política sanitária sem rumo: que mais para dar fim à incompetência voluntária?

Não faltam indicadores jurídicos e socioeconômicos sobre o desmoronamento duplo da democracia e da capacidade estatal. Suspiros de alívio pela não decretação de golpe de Estado nos moldes de 1964, desde um carro de som na Paulista, com desfile de tanques, não provam "instituições funcionando" nem democracia respirando. Provam que nosso app detector de golpe ainda não roda na versão 2.0.

A democracia está intubada. Instituições de controle continuam a receitar cloroquina para ver o que acontece. Lira, Pacheco e Aras formam o triângulo mágico da indolência que Mussolini nenhum botaria defeito. Não foram talhados para liderar na crise, mas para o gozo da normalidade magistocrática. Preferem colaborar e fazer pronunciamentos mais insossos que picolé de chuchu. Viram no 7 de Setembro "festa cívica".

Fux está um tom acima, mas ainda tenta acalmar Bolsonaro. Até prometeu mecanismo de legalidade criativa para envernizar calote dos precatórios se o menino delinquente se comportasse ao microfone. O menino delinquente rejeitou o pirulito, deu "ultimato" a Fux e exigiu que enquadrasse seu colega "canalha" ou "esse Poder" poderia "sofrer aquilo que não queremos". Ao colega "pedófilo" também sugeriu jogar "nas quatro linhas" da "Constituição sou eu".

Bolsonaro não é o "homo politicus-democraticus" que costuma inspirar previsões da ciência política. Aliados e adversários fazem seus cálculos eleitorais com base em certas expectativas de como atores racionais se comportam. A racionalidade de Bolsonaro é outra, e isso desconcerta a todos. Em 2018, aquela racionalidade extremista e anti-institucional os derrotou.

Em parte por isso, a grande "lei geral" da ciência política para eleições presidenciais —candidato se elege com dinheiro, tempo de TV, plataforma partidária etc.— falhou. Talvez volte a escorregar em 2022. Em parte por isso, pesquisas que, um ano e meio antes das eleições, começam a mostrar um Bolsonaro sem força até para chegar ao segundo turno dizem tão pouco. Com Bolsonaro na disputa, a viabilidade da terceira via continua um bonito sonho de verão.

Não sabemos se haverá eleições. Havendo eleições, sabemos menos ainda sobre as condições da disputa e a magnitude de práticas ilegais de manipulação sob financiamento obscuro. Temos apenas a certeza de que, mesmo fora da disputa, preso ou solto, impichado ou condenado à pena de inelegibilidade, Bolsonaro e bolsonarinhos formarão falange armada e excitada contra o processo eleitoral. Isso por si só já compromete eleições regulares e precisa entrar na conta.

Temos boas razões para desconfiar que o TSE não dispõe das melhores ferramentas para controlar essa avalanche. Apesar de adotar um dos sistemas de contagem de votos mais eficientes do mundo, por urna eletrônica, o bom funcionamento da maquininha não é suficiente para eleições justas. O jogo sujo acontece antes. Nos porões, nos microfones, nas redes. Ainda não aprendemos a controlar novas técnicas de jogo sujo. Sabemos quem as domina e mais se beneficia.

Há três caminhos para segurar essa derrocada: impeachment pelo Congresso, condenação criminal pelo STF e condenação por infração eleitoral pelo TSE. É tarde, talvez tarde demais. Não há alternativa barata a essa altura. Só não dá para sustentar que algo saia mais caro que a espera de 2022 em ritmo de festa cívica.

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