Deborah Bizarria

Economista pela UFPE, estudou economia comportamental na Warwick University (Reino Unido); evangélica e coordenadora de Políticas Públicas do Livres

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Descrição de chapéu Silicon Valley Bank

O medo pode piorar a atual crise bancária

Emoções podem ter papel fundamental na retirada de depósitos

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A falência do Silicon Valley Bank (SVB) desencadeou uma crise financeira, despertando preocupação e instabilidade em diversos mercados. Dias depois, o Signatura Bank foi fechado e o Credit Suisse teve ações derretidas, derrubando seu valor até ser comprado por seu maior concorrente, o UBS.

Os três bancos já tinham problemas de gestão que foram agravados pela subida de juros nos EUA e na Europa, mas o estopim dramático deu-se pelas corridas bancárias. Como e porque elas estão ocorrendo?

Os bancos mantêm apenas uma fração de seus depósitos em dinheiro ou ativos líquidos, fáceis de vender sem perda de valor. No Brasil, a cada 100 reais que depositamos em um banco, ele precisa guardar pouco mais de 10 reais e o restante pode ser emprestado para consumidores, realizar investimentos e outras operações. Essa dinâmica permite o funcionamento da economia como conhecemos e não costuma ter problemas porque os depositantes não costumam querer sacar tudo de uma vez simultaneamente.

No caso do SVB, a crise começou quando o banco anunciou uma venda de ações para fortalecer suas finanças, após uma perda significativa em seu portfólio de títulos por causa do aumento na taxa de juros pelo banco central americano. Apesar de o fundo segurador do sistema garantir que poderia ressarcir os depósitos dos clientes até US$ 250 mil, mais de 90% dos depósitos ultrapassavam esse valor e ficavam de fora da cobertura, de acordo com a análise da S&P Global.

Fachada da sede do Silicon Valley Bank, em Santa Clara, Califórnia - Brittany Hosea-Small - 13.mar.23/Reuters

O que tornava o banco único era seu perfil de cliente: muitos fundadores de startups e gestores de empresas de tecnologia que tinham dinheiro pessoal, hipotecas e fundos das próprias empresas no mesmo banco —como apontou Colin Camerer, professor de economia comportamental na CalTech. Além disso, afirma, o SVB concedia muitos empréstimos incomuns, como aceitar ações de startups como garantia, nem sempre muito líquidas, o que passava a mensagem de que o banco entendia os investidores e os empréstimos a startups como ninguém.

Com o anúncio das perdas causadas por má gestão de risco, preocupações compartilhadas entre grandes clientes do banco levaram a uma debandada. Nesse sentido, emoções parecem ter um papel fundamental na atitude de manter ou retirar os depósitos.

Em experimento conduzido pelo pesquisador Oege Dijk, os participantes foram submetidos a uma tarefa que induziu emoções de medo, tristeza ou felicidade antes de participar de um jogo de corrida bancária em grupo. O estudo descobriu que o medo aumenta significativamente a probabilidade de saque e, portanto, a ocorrência de uma corrida bancária, enquanto tristeza e felicidade não tiveram efeitos significativos. Mas por que os agentes reguladores e os demais mercados estão e devem ficar atentos ao que aconteceu a tão poucos bancos?

Na crise atual, para além do tamanho desses bancos, a preocupação dos governos é de que haja contágio. Isto é, que a corrida bancária de alguns bancos que já tinham problemas acabe afetando bancos saudáveis. As ações dos depositantes de um banco têm impacto nas ações dos clientes de outro banco, mesmo que o segundo não tenha os mesmos problemas de liquidez que o primeiro - é o que mostra o experimento de Miguel Fonseca e outros autores.

Esse experimento também aponta que a corrida bancária pode ser unidirecional, ou seja, um aumento nos saques do banco com problemas pode desencadear uma corrida em outro banco, mas uma diminuição não acalma os mercados. O estudo sugere que fatores psicológicos e sociais influenciam a decisão dos depositantes e que a coordenação entre eles pode ser frágil e instável, dificultando assim a capacidade de reação dos bancos e dos agentes públicos.

Então a preocupação principal dos reguladores, em especial os americanos, é a gestão das emoções e das expectativas para que a corrida bancária de um banco não acabe se alastrando pelos demais. Resta saber se as medidas de salvar bancos vão conseguir conter o contágio conforme os países sobem as taxas de juros e mais negócios enfrentam dificuldades. Ou, ainda, se essas medidas podem acabar criando incentivos para que alguns bancos continuem desatentos com a própria gestão de risco e com a comunicação adequada com seus clientes.

Se as medidas foram acertadas, o tempo dirá.

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