Djamila Ribeiro

Mestre em filosofia política pela Unifesp e coordenadora da coleção de livros Feminismos Plurais.

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Djamila Ribeiro

Sempre voltarei ao 'meu país Piauí', como se diz com orgulho por aqui

Salão do Livro do Piauí é dos principais eventos da cena literária brasileira

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Visitar o estado do Piauí tem sido garantia de bons encontros e muitas histórias. Nesta semana estive pela terceira vez nessa terra que tem o dom de receber as pessoas com um carinho e acolhimento que ressalta o melhor de quem a visita. Em duas dessas três vezes fui por conta do Salão do Livro do Piauí, o SaLiPi.

O evento é um dos principais da cena literária brasileira no ano e tem crescido a cada edição. Escritoras e escritores fazem o possível para poder comparecer à programação oficial do evento e neste ano, por exemplo, estou junto a colegas brilhantes da cena artística e literária brasileira, como Zezé Motta, Ana Maria Gonçalves e Itamar Vieira Jr., entre tantos nomes de referência.

A homenageada desta edição foi a piauiense Esperança Garcia, primeira advogada da história do Brasil, uma mulher escravizada que peticionou ao presidente da província para denunciar os maus-tratos físicos cometidos contra ela e seu filho pelo feitor da fazenda em Isaías Coelho, no centro do estado. Atualmente, as terras de onde Esperança enviou as cartas são as comunidades quilombolas Queimada Grande e Riacho Fundo, ambas tituladas. A história concedeu à Esperança um sentido de seu nome ainda mais poético e ancestral.

desenho em preto e branco de mulher negra, com cabelo black power, segura uma pena em uma das mãos e veste uma blusa branca com um lenço caindo aos ombros.
Esperança Garcia, negra escravizada que foi reconhecida como primeira advogada do Piauí - Ilustração Valentina Fraiz

Vale destacar que chama muito a atenção no SaLiPi a valorização da literatura piauiense, com diversos convidados e convidadas na programação. Entre tantos talentos, nesta edição conheci a poeta Nayara Fernandes, que me entregou sua obra "Asas de Pedra", uma leitura profunda e visceral que me acompanhou no voo de volta de Teresina a São Paulo. Nayara se destaca em um estado de profunda tradição na poesia nacional, a exemplo de Antônio Francisco da Costa e Silva, nascido em Amarante, no oeste do estado, e o teresinense Torquato Neto.

Outro encontro especial foi com um maranhense de nascença e piauiense de coração, o poeta e professor Salgado Maranhão, duas vezes ganhador do Prêmio Jabuti e embaixador do SaLiPi, que dividiu comigo a sabedoria sobre a recepção fidalga do estado de inúmeras belezas culturais e abençoado pela natureza, bem como contou-me histórias sobre sua sábia avó. Foi uma honra encontrá-lo e receber o exemplar autografado de sua obra "Ópera de Nãos".

Texto acessível descritivo: Na ilustração de fundo vermelho, uma pessoa negra está debruçada, enquanto lê um livro. Ela tem cabelos loiros, está usando óculos e uma blusa azul clara.
Ilustração de Aline Bispo para coluna de Djamila Ribeiro de 17 de agosto de 2023 - Aline Bispo

A valorização da literatura no estado promovida pelo evento é ainda ampliada pelo SaLiPi itinerante, que, ao longo dos anos, tem ido a cada vez mais cidades do interior para montar as próprias feiras literárias, como em Valença (onde se torna o SaLiVa), Picos (por sua vez, o SaLiPicos) e, claro, na exuberante Parnaíba, que recebe o SaLiPa.

Parnaíba é a maior cidade do pequeno, mas belíssimo, litoral piauiense, que compreende um dos maiores deltas do mundo, isto é, o fenômeno da chegada capilarizada do rio ao mar, com a formação de várias ilhas.

Estive uma vez na cidade, durante uma semana, para apresentar um seminário na Universidade Federal do Delta do Parnaíba (UFDPar), criada em 2018, na esteira do projeto de expansão das universidades nos governos Lula e Dilma. Passeei por Luís Correa e Barra Grande, outros pontos paradisíacos do estado, de onde trago memórias tão bonitas.

Além do enorme potencial turístico —aproveitado, em boa parte, por estrangeiros que enxergam nas praias com vento o lugar ideal para a prática de kite surf—, Parnaíba tem sido um lugar de produção de pesquisa de excelência.

A cidade é terra da professora Letícia Nascimento, intelectual autora da obra "Transfeminismo", o décimo título da Coleção Feminismos Plurais. A obra da professora Letícia tem sido uma referência importante nos estudos de gênero no Brasil e na França, onde foi traduzido. Aliás, conheci a professora Letícia no SaLiPi 2019, quando fui apresentar a obra "Lugar de Fala".

Outras cidades recebem o salão do livro itinerante, levando a literatura ao encontro do povo que não se desloca ou não possui condições financeiras para ir à capital. Uma ideia de democratização da leitura que merece ser saudada e espelhada em outros lugares do país.

Ficam aqui os meus cumprimentos a toda a organização da feira, ao poder público municipal e estadual, à Universidade Federal do Piauí, que recebe o evento em Teresina, e a todos os patrocinadores por investirem nessa iniciativa de valor inestimável para a população.

Como já disse, só não volto ao SaLiPi se não for convidada. Do contrário, estarei sempre disposta para voltar ao "meu país Piauí", como tantas pessoas dizem com orgulho sobre esta terra abençoada.

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