Eduardo Sodré

Jornalista especializado no setor automotivo.

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Sem carro popular, governo Lula e Anfavea alinham discurso sobre crédito

Zero-quilômetro a R$ 50 mil é sonho distante, e taxas são vistas como principal barreira para retomada

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Em seus discursos durante a inauguração da nova sede da Anfavea (associação das montadoras) na sexta (12), em São Paulo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, mencionaram os juros praticados pelos bancos nos financiamentos de automóveis. A queda nas taxas é vista como principal estímulo às vendas de carros novos.

Não houve referência ao preço dos automóveis –que foram criticados por Lula há um ano, pouco antes do programa de incentivo que levou a reduções temporárias de valores.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) recebe placa comemorativa entregue por Márcio de Lima Leite, presidente da Anfavea, durante inauguração da nova sede da associação das montadoras - Nelson Almeida/AFP

Hoje, governo e montadoras estão alinhados: os valores praticados não vão ceder a ponto de reviver o segmento de carros populares –que, no início, não eram tão populares.

"Se aplicarmos a inflação sobre o preço dos carros populares do passado, o valor chegaria a R$ 80 mil hoje", disse Márcio de Lima Leite, presidente da Anfavea, durante o evento da semana passada. O executivo também destacou que os juros altos são o problema do momento.

Mas o cálculo feito por Leite, que se refere a alguns dos modelos 1.0 lançados no início dos anos 1990, não conta toda a história.

Em junho de 2017, a Renault lançou o hatch compacto Kwid, que pode ser considerado o último carro genuinamente popular lançado no mercado nacional. Naquela época, seu preço inicial era de R$ 29.990 —que, corrigido pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), equivale hoje a R$ 42.631.

Por esse valor, o modelo era equipado com quatro airbags (dois a mais do que os exigidos por lei), mas não trazia direção com assistência, ar-condicionado ou acionamento elétrico dos vidros dianteiros e das travas das portas. Tais itens estavam disponíveis na versão Zen, cujo preço subia para R$ 34.990, valor equivalente a R$ 49.739 hoje.

Mas o mercado mudou: carros básicos como o Renault mais barato de 2017 deixaram de existir, tanto pelas exigências dos clientes como por mudanças de estratégia das montadoras. Assim sendo, um automóvel deveria custar por volta de R$ 50 mil para ser considerado popular nos dias de hoje.

Entretanto, o Kwid 2024 parte de R$ 72.640 na versão Zen, que se tornou a opção mais em conta da Renault. Além dos itens de antes, foram acrescentados controles de tração e de estabilidade, que passaram a ser exigidos por lei.

Há constantes promoções, mas o menor preço encontrado atualmente é de R$ 63.990. Em junho de 2023, em meio às medidas de incentivo adotadas pelo governo, o valor caiu para R$ 58.990, ainda distante dos R$ 50 mil.

A alta expressiva nos últimos anos é resultado de uma combinação de fatores, em que se destacam a redução no volume médio de vendas, os reflexos da pandemia de Covid-19 e a recomposição de preços após anos de estabilidade.

Para um futuro próximo, as regras ambientais que levam à eletrificação vão pressionar as tabelas, mas haverá compensações por meio de ajustes no IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados).

A faixa de R$ 70 mil tende a se consolidar como a dos modelos mais baratos à disposição, habitada pelos 1.0 flex sem turbo e com câmbio manual. Abaixo disso, as margens de lucro estreitas exigiriam um volume de vendas deslocado da realidade.

Os preços não deverão ceder por mais um motivo: a alta nas vendas diretas, modalidade em que os principais clientes são as locadoras. Essas empresas fazem compras em grandes volumes e com descontos, não sendo interessante para as marcas uma redução vultosa dos valores sugeridos ao mercado.

Carro popular é pouco rentável para as montadoras. Em meio a um ciclo de R$ 125 bilhões de investimentos, as empresas vão continuar priorizando os veículos de maior valor agregado para acelerar o retorno. Dessa forma, o caminho para a retomada só poderia vir do crédito e do aumento da renda, outro ponto mencionado por Lula na festa da Anfavea.

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