Filipe Oliveira

Na Folha desde 2011, Filipe Oliveira é repórter de Mercado e assina o blog Haja Vista. É graduado em música e tem deficiência visual

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Descrição de chapéu Tóquio 2020 paralimpíadas

Transmissão das Paralimpíadas tem 'gol' de narradora pela inclusão

Natália Lara, do SporTV, utiliza técnica voltada para pessoas com deficiência

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Os atletas são os astros pelos quais sofremos e vibramos na competição esportiva. Porém, um dos momentos que já se tornou marcante nas Paralimpíadas de Tóquio foi protagonizado por uma narradora. Aconteceu ainda antes do início da partida de estreia do Brasil no goalball, esporte praticado por pessoas com deficiência visual.

Eu ainda nem prestava atenção. Fui pego desprevenido quando Natália Lara abriu a transmissão no SporTV descrevendo sua fisionomia (uma mulher branca, de cabelos escuros e encaracolados e óculos) e explicou a posição dela e da comentarista Carla da Mata na bancada.

Dentro de mim foi como se acabasse de presenciar um gol de placa. Enfim, uma transmissão em que leva-se em consideração que há espectadores que não enxergam.

Natália Lara, narradora da Globo
Natália Lara, narradora do canal SporTV, nos Jogos Paralímpicos - João Cotta/Divulgação

A técnica usada para a apresentação, chamada audiodescrição, aparece em palestras e debates voltados para pessoas com deficiência.

Também é um recurso que pode ser usado em peças de teatro ou filmes. No caso, uma narração extra é apresentada entre as falas para descrever cenários, pessoas e ações. Outro uso é para tornar acessíveis imagens que acompanham textos em redes sociais.

Durante a transmissão, Natália e Carla também debateram como seria a melhor forma de fazer os espectadores cegos entenderem as ações. Foram trocadas dicas ao vivo, entre as quais contar à audiência com qual mão havia sido feito um lançamento ou descrever as mudanças de posição dos atacantes.

A narração de um jogo não é a mesma coisa que uma descrição. É comum quem não enxerga perder muita coisa que não é dita porque, afinal, todos estão vendo na telinha. O exemplo da abertura dos mesmos Jogos Paralímpicos ilustra a diferença.

A cerimônia foi apresentada no mesmo SporTV pelo narrador Sérgio Arenillas, com comentários dos medalhistas paralímpicos Clodoaldo Silva (natação) e Verônica Hipólito (atletismo).

Informado e engajado, o trio debateu o uso exagerado do termo superação nos Jogos, discutiu o tema do capacitismo, falou sobre as classificações dos atletas em categorias e discutiu a preparação em meio à pandemia.

Por outro lado, não entendi muito da parte artística, e a cerimônia foi em muitos momentos enfadonha. Falou-se em "monoasa". Mas, só quando li na Folha sobre o que aconteceu na abertura soube que a menina estava em uma cadeira de rodas e interagia com aviões representando outras deficiências, que ainda não sei como foram representadas.

Em determinado momento em que a música se adensou e entraram caminhões, o trio dizia coisas como "Estou arrepiado" ou "Estou sem palavras". E eu pensava: "Não me abandonem!".

O aceno de Natália para seus espectadores cegos fez sucesso em redes sociais e já começou a ser seguido. Na madrugada de quarta, Márcio Meneghini e o Clodoaldo se descreveram na abertura do programa, com o nadador, bem-humorado, fazendo a ressalva de que não havia nada de muito bonito para se ver.

Outra surpresa positiva vem do tratamento correto que se dá aos atletas. Uma das expressões mais recorrentes é o alto rendimento e fala-se mais nos recordes que cada um busca quebrar do que as lutas que tiveram para chegar ali.

O cuidado para não direcionar os holofotes às deficiências dos atletas leva a uma situação curiosa. Escutei a narração de muitas provas da natação apoiando nossos competidores sem ter ideia de qual sua deficiência. Por um lado, é bom, por colocar o foco na competição, mas, por outro, gostaria de ter mais informação.

Espero que cada vez mais pessoas entendam que pode ser bom explicar o que, aparentemente, todos estão vendo. Torço para que os espectadores não pensem que esse esforço para trazer mais gente para a torcida atrapalha de algum modo.

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