Flávia Boggio

Roteirista. Escreve para programas e séries da Rede Globo.

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Flávia Boggio
Descrição de chapéu

Caça-cliques de autoajuda

A internet é recheada de iscas perfeitas para nós que precisamos de validação

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"Estudo aponta que pessoas com letra feia são mais inteligentes." Parei tudo que estava fazendo para clicar no link que poderia ser a minha redenção.

Lembrei todas as vezes que tiraram sarro da minha letra feia. Quando, ainda aos sete anos, fui a única aluna da série a pegar reforço de caligrafia. Imaginem quão horrenda pode ser a letra de uma criança dessa idade para ser considerada feia. Mas o estudo finalmente elevaria meus garranchos à categoria da genialidade.

No mesmo portal da matéria, havia links para outros estudos, sem muita credibilidade, caso de "pessoas que bebem cerveja são mais criativas", "filhos do meio são mais bem-sucedidos", "filhos caçulas são mais ricos".

Ilustração
Galvão Bertazzi/Folhapress

Espera, qual dos filhos? Percebi que tinha caído em um caça-clique da autoajuda.

Caça-clique da autoajuda é o nome dado a qualquer link com estudos elaborados por fontes não confiáveis que comprovem que somos pessoas especiais. Esse nome, aliás, foi criado a partir de um estudo feito por mim mesma.

O trabalho do profissional do caça-clique da autoajuda consiste em preencher uma lacuna com um defeito nosso e outra lacuna falando porque somos incríveis por causa desse defeito. Dessa forma, cria-se a isca perfeita para nós que precisamos sempre de validação. Criei alguns usando outras experiências pessoais:

"Pessoas que acumulam louça na pia são mais talentosas."

"Indivíduos que não gostam de contato humano têm QI mais alto."

"Crianças que matam pintinhos na infância por acidente se tornam adultos mais bem- sucedidos."

"Mulheres que bebem sozinhas enquanto assistem a vídeos de gatinhos na internet são grandes líderes."

Os caça-cliques da autoajuda podem vir disfarçados de correntes, testes, física quântica e portais como Fãs da Psicanálise (Freud agradeceria por estar morto se navegasse pelo site). Até mesmo a foto de um tênis verde e cinza —ou seria branco e rosa?— rodou pela internet acompanhada de diferentes análises sobre quem somos nós.

Não é de hoje que tentamos entender quem somos, de onde viemos e para onde vamos. Com o advento da internet, é possível encontrar um estudo sob medida para nos sentirmos especiais. Mas, se todo mundo é, estudos comprovam que ninguém é.

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