Igor Patrick

Jornalista, mestre em Estudos da China pela Academia Yenching (Universidade de Pequim) e em Assuntos Globais pela Universidade Tsinghua

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Descrição de chapéu China G20 Rússia

Ausência de Xi no G20 é oportunidade perdida, mas pouco se decide sem ele

Cúpula em Nova Déli pode favorecer Ocidente, mas não se discutem mais problemas mundiais sem Pequim

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A "foto de família" do G20 neste ano terá uma notável ausência. Com exceção dos anos de pandemia, esta será a primeira vez que Xi Jinping não participará de uma cúpula do grupo das maiores economias do mundo. No seu lugar viajou Li Qiang, o premiê chinês que até agora tem tido alguma dificuldade em fechar agendas bilaterais com chefes de Estado de outros países, todos decepcionados pela ausência de um dos principais líderes mundiais.

A falta de Xi será sentida em Nova Déli, anfitriã da cúpula deste ano, mas não chega a ser uma total surpresa. No contexto geral, junta-se às iniciativas chinesas para obstruir grandes fóruns internacionais indianos, país com quem Pequim tem disputas territoriais e com quem já foi para a guerra em 1962.

O líder chinês, Xi Jinping, no último dia da cúpula do Brics, em Joanesburgo, na África do Sul - Alet Pretorius - 24.ago.23/Reuters

Também reflete uma vontade premente da diplomacia chinesa em se distanciar de órgãos multilaterais com influência ocidental em favor das suas próprias iniciativas. O G20 foi criado como um fórum de discussão de assuntos econômicos, mas tornou-se mais representativo e relevante que o G7, naturalmente incorporando a geopolítica na pauta e se consolidando como um espaço de cooperação do Norte com o Sul Global. A China pode estar convencida de que é o novo Brics+, onde exerce mais influência, não o G20, a melhor plataforma de engajamento com países em desenvolvimento.

Talvez nunca saibamos o que motivou a decisão de Xi, mas arrisco dizer que não estar presente foi uma estratégia falha. Sua ausência será acompanhada pela do colega Vladimir Putin, reforçando ainda mais a imagem de uma China alinhada com a Rússia e pouco aberta a dialogar com o Ocidente. Não ajuda na melhora com os laços sino-americanos —embora seja pouco provável que estar lá mudasse qualquer coisa nesta seara—, mas sem dúvidas piora a percepção dos chineses para os europeus.

Ao contrário dos EUA, onde a obsessão com a China e a necessidade de contê-la a qualquer custo foram incorporadas à agenda política de todos os espectros políticos, a natureza fragmentada da União Europeia oferece um pouco mais de espaço para Pequim suavizar o discurso e manter parcerias comerciais ativas.

Ainda não há consenso na Europa sobre como lidar com a diplomacia chinesa cada vez mais altiva e isso não deve acontecer em breve —basta ver o discurso adocicado de Macron em sua visita de Estado a Pequim, quando fechou contratos de venda de aeronaves Airbus para os chineses, em comparação com o novo marco alemão para as relações com a China revelado em junho, muito mais cauteloso e crítico.

Mesmo assim, a diplomacia europeia chegou a um denominador comum sobre a Rússia, considerando-a uma potência militar expansionista que coloca a integridade territorial de vários países no continente em risco e com a qual deve-se evitar colaboração, sob pena de se ver novamente dependente como aconteceu com as importações de gás em 2022.

Pega mal que Xi tenha, assim como Putin, escolhido faltar na reunião. Se não denota alinhamento, mostra ao menos alguma afinidade entre os dois, levando a ainda mais dúvidas entre os europeus sobre quão benéfico é de fato tentar manter grandes parcerias comerciais com os chineses.

No campo regional, não ter viajado também foi interpretado pelos indianos como uma postura antagonista e esnobe por parte de Xi. Retrocede em avanços importantes na relação entre os dois países mais populosos do mundo obtidos durante a cúpula do Brics na África do Sul e ajuda a fomentar o lado da política indiana que pede cada vez mais aproximação com Washington. Também abrevia oportunidades de diálogo para a resolução de conflitos territoriais —e é péssimo que, coincidentemente ou não, os chineses tenham escolhido exatamente os dias que antecederam o início do G20 para divulgar um novo mapa em que incorpora as tais regiões disputadas com os indianos.

Sem presenças fortes de China e Rússia, forças ocidentais na cúpula do G20 deste ano podem até ter mais sucesso em conseguir uma declaração final mais alinhada com seus interesses, quem sabe. Mas é notório que não se discute mais nenhum problema mundial sem a chancela dos chineses e de Xi. Ficará a impressão de um fórum esvaziado… e de uma oportunidade perdida para Pequim.

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