Igor Patrick

Jornalista, mestre em Estudos da China pela Academia Yenching (Universidade de Pequim) e em Assuntos Globais pela Universidade Tsinghua

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Descrição de chapéu Brics China Rússia

Brasil sai da cúpula do Brics apenas como mais um na festa da China

De todos os ângulos, expansão do bloco foi um exercício da influência de Pequim

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Após muita especulação, os membros do Brics enfim aprovaram a expansão do bloco. Aos cinco sócios atuais juntam-se Arábia Saudita, Irã, Emirados Árabes Unidos, Etiópia, Egito e Argentina. A lista, modesta diante das 23 nações que declararam interesse formal em se juntar ao grupo, denota certa cautela em abrir o clube rapidamente, como a China queria, mas não deixa de atender aos interesses de Pequim.

Há quem veja pontos positivos. Com os países do Golfo, por exemplo, o Brics ganha influência na política energética global, além de atrair dois dos principais Estados mantenedores do chamado "petrodólar", que garantem a hegemonia da divisa americana e sua importância para a principal commodity mundial.

O líder chinês, Xi Jinping, durante fórum com líderes africanos à margem da cúpula do Brics, em Joanesburgo, na África do Sul
O líder chinês, Xi Jinping, durante fórum com líderes africanos à margem da cúpula do Brics, em Joanesburgo, na África do Sul - Alet Pretorious - 24.ago.23/Reuters

O argumento em prol da consolidação do grupo pode até colar. Mas o que os cinco países ganham individualmente? No caso da China, muito. Já no do Brasil, quase nada.

De todos os ângulos, a expansão foi um exercício da influência chinesa. Pequim iniciou o debate para a entrada de novos membros, proposta que inicialmente encontrou resistência em Brasília e Nova Déli.

Brasil e Índia não eram tão fãs da ideia por motivos óbvios. O Norte Global, quando não trata o Brics com absoluta indiferença, tende a considerar o grupo um clube anti-Ocidente. É uma narrativa exagerada que talvez reflita a ansiedade de países cujo poder está em declínio, mas que vem se consolidando graças à invasão da Ucrânia pela Rússia e o subsequente silêncio chinês acerca da transgressão. Os países que se candidataram a entrar no Brics também ajudam a reforçar a impressão: Venezuela, Cuba, Irã…

Diferentemente dos colegas, brasileiros e indianos ainda tentam manter uma relação ao menos cordial com órgãos e países ocidentais. Temia-se que a entrada de membros abertamente hostis ao Ocidente transformasse o Brics em um "movimento dos não alinhados" 2.0, causando fricções desnecessárias e conflitantes com seus respectivos interesses nacionais. Mas os chineses estavam ávidos.

Quem esteve envolvido nas tratativas afirma que a proposta inicial envolvia a inclusão de novos membros por meio de votação com maioria simples, não por consenso, como é tradição. Pequim queria aproveitar a oportunidade para reforçar a imagem de líder do mundo em desenvolvimento e de país pragmático interessado em empoderar seus pares e, acima de tudo, usar o Brics como plataforma de promoção de trocas comerciais com moedas locais, reduzindo a força do dólar e o poder de sanções americanas.

A boa notícia é que, no final, a escolha dos novos membros teve de ser decidida em conjunto. A má é que nós, brasileiros, saímos da cúpula na África do Sul com menos relevância e tendo como colegas uma economia falida, notórios violadores dos direitos humanos e países alvos de sanções.

Mesmo a Argentina, a única democracia plena na lista dos novos membros, pode ter sido uma péssima escolha. A dinâmica da política argentina pode fazer com que logo depois de Buenos Aires ser admitida no bloco, o país já tenha interesse em sair. Javier Milei, que lidera a corrida pela Presidência, já deixou claro que não tem interesse em se relacionar com a China. A segunda colocada, Patricia Bullrich, é outra a afirmar que "de forma alguma" deixará que a Argentina se "associe a autoritarismos populistas".

O prêmio de consolação seria a manifestação pública de apoio chinês à entrada do Brasil no Conselho de Segurança da ONU, bandeira histórica da diplomacia brasileira. Não aconteceu agora, assim como também não aconteceu quando apoiamos a entrada dos chineses na Organização Mundial do Comércio. De protagonista, o Brasil saiu da África do Sul como mais um convidado da festa organizada por Pequim

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