Igor Gielow

Repórter especial, foi diretor da Sucursal de Brasília da Folha. É autor de “Ariana”.

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STF tem de dizer se réu pode ser candidato, mesmo que barre Bolsonaro

Omissão em decisão de 2016 evidencia o preço político que gambiarras jurídicas cobram da corte

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Um presidente da República pode ser réu? Não, é o que diz a Constituição, que prevê seu afastamento por até 180 dias e julgamento político em caso de crimes de responsabilidade cometidos durante o mandato —o velho e bom impeachment, no Senado, ou no Supremo se for um crime comum.

Jair Bolsonaro entra num carro durante campanha no mercado de Madureira, no Rio de Janeiro
Jair Bolsonaro durante campanha no mercado de Madureira, no Rio de Janeiro - Mauro Pimentel - 27.ago.2018/AFP

E se um presidente não está na cadeira, o vice ou quem estiver na linha sucessória pode ser réu? Não, foi o que decidiu o Supremo Tribunal Federal em 2016, ao proibir Renan Calheiros (MDB) de atravessar a praça do Senado ao Planalto por suas contas pendentes com a Justiça.

A lógica dirá que, bom, então candidato a presidente não poderia ser réu, já que se ganhar haveria uma distorção isonômica em relação a mandatários no cargo ou a enrolados na linha sucessória.

É isso, mais do que discutir se falar em arrobas qualifica o sujeito como racista, de que deveria se tratar a discussão ora adiada no Supremo sobre o eventual crime de racismo cometido pelo presidenciável Jair Bolsonaro (PSL).

As vistas pedidas por Alexandre de Moraes, com o julgamento empatado em 2 a 2, darão uma semana de respiro para o tribunal.

É assunto para reflexão, até porque Moraes já está com seu voto pronto —a acusação de que ele está esperando o horário gratuito para ajudar seu padrinho político, Geraldo Alckmin (PSDB), obviamente já está nas redes.

A judicialização que agudizou-se no país desde a ascensão da Lava Jato teve o mérito de obrigar alguns debates que o Legislativo não assumia. O ônus é claríssimo: tira-se do legislador, por mais tosco e chinfrim que seja (e olha, a maioria é continuará sendo), sua prerrogativa constitucional.

É ovo e galinha, “ad aeternum”. Além disso, pululam soluções precárias, como a supracitada do caso Renan: se já fosse pacífico o que fazer com candidatos réus, o impacto político inexistiria. Mas é o Brasil da gambiarra, que beneficiou outros políticos, como Dilma Rousseff (que pode virar senadora graças a Renan e ao presidente do STF durante seu impeachment, Ricardo Lewandowski).

Isso dito, terão os ministros coragem de engatar a discussão sobre a condição de réu para candidatos a presidente analisando justamente o caso do líder das pesquisas eleitorais no cenários que consideram que a Lei da Ficha Limpa será respeitada e Lula estará inelegível?

Aqui cabe um parêntese. Os casos de Bolsonaro e Lula são incomparáveis. O petistas está condenado em segunda instância, desqualificando-se assim para concorrer. Pode acabar inocentado lá na frente, claro, mas aí é a regra da lei que ele mesmo sancionou. O resto é choro.

O deputado fluminense deu uma declaração medonha, como de resto é praxe, mas terá cometido crime? Isso é irrelevante no contexto: ele já é réu, por uma frase ainda mais bizarra (aquela em que diz que não estupraria uma deputada petista).

Logo, se a “a lei é para todos” no caso de Lula, não caberá alegação de tapetão por parte dos bolsonaristas no caso de o STF decidir discutir a questão e eventualmente decidir que não, réu não pode disputar a Presidência. Alguém alegará que a decisão não poderá retroagir dado que Bolsonaro foi aceito candidato pelo Tribunal Superior Eleitoral já como réu. A confusão estará garantida.

Mas é disso que se trata esse julgamento, que pode virar de ponta-cabeça a corrida eleitoral mais tumultuada e incerta de que se tem notícia desde a redemocratização de 1985. Novamente, a solução estará na mão dos ministros, cuja omissão em 2016 agora cobrará sua conta.

 

Na política tradicional, a grelha ofertada usualmente pelo Jornal Nacional na forma de entrevista ao vivo tem fama de matadora de candidaturas. Se essa é a régua, Bolsonaro pode comemorar ter sobrevivido à sua primeira vez. Vai ganhar algum voto? Improvável. Mas não perdeu nenhum.

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