Karla Monteiro

Jornalista e escritora, publicou os livros "Karmatopia: Uma Viagem à Índia", ​"Sob Pressão: A Rotina de Guerra de um Médico Brasileiro" (com Marcio Maranhão) e "Samuel Wainer: O Homem que Estava Lá​"

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Sem ciência, será impossível reconstruir o Brasil

Conhecimento científico não existe apenas na universidade e deve ser abraçado pela sociedade

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Otavio Ranzani

Esta coluna foi escrita para a campanha #ciêncianaseleições, que celebra o Mês da Ciência. Em julho, colunistas cedem seus espaços para refletir sobre o papel da ciência na reconstrução do Brasil. Quem escreve é Otavio Ranzani, médico e epidemiologista da USP e do ISGlobal. A iniciativa é do Instituto Serrapilheira e da Maranta Inteligência Política.

Cada dia, ao acordarmos com o celular ou o sabiá, a ciência está presente. Hoje, sabemos que a hora em que os pássaros urbanos cantam é influenciada pelos ruídos do mundo de concreto e a intensidade da luz noturna. Por que sabemos? Porque cientistas observam esses animais há anos, com metodologia e rigor.

Às vezes, temos a impressão de que o mundo da ciência é fechado, sem senso prático, que vive em teses, nas universidades. Porém, esse é somente um viés da nossa percepção do que é ciência. Ela acontece no dia a dia e é feita de tijolos, dispostos consecutivamente, que vão construindo paredes, portas e tetos.

Exames para Covid-19 realizados no Laboratório de Vírus Respiratórios e do Sarampo do Instituto Oswaldo Cruz - Josué Damacena/Fiocruz Imagens

Muitos desses tijolos não se encaixam na construção no momento em que ela ocorre —foram descobertos recentemente e serão usados depois, se é que serão. No entanto, saber que não cabem no presente já é uma informação valiosa, que nos permite buscar outros tijolos. A ciência só avança porque tem autocrítica e método.

Desde 2020, convivemos com o Sars-CoV-2. Todo conhecimento científico acumulado sobre epidemiologia de doenças infecciosas, comportamento viral, cuidado de doenças respiratórias graves e vacinas foi evocado. Outras áreas, estudadas pela ciência, apareceram na discussão, como a necessidade de dar suporte social e econômico às populações vulneráveis ou criar grandes bases de dados.

Enfrentamos o grande desafio de qualquer pandemia, que é a necessidade de aplicar o já sabido e aprender o novo em um momento de grande pressão e urgência. Tivemos também outro problema, maior que o esperado: a desinformação.

A desinformação nasce de mentiras construídas com um propósito: gerar confusão e trazer benefícios para um indivíduo ou grupo específico. Assim como devemos derrubar o mito de que um cientista é uma pessoa enfurnada em um laboratório, desconectada da realidade, devemos vencer o mito de que as pessoas que engendram desinformação são solitárias e vivem em um porão atrás de uma tela.

Se existe algo que a ciência, com seu método, nos trouxe no campo do conhecimento da ecologia da desinformação é que o movimento das fake news (nome leve para problema hediondo) é, na verdade, organizado, estruturado e financiado. Não são meras piadas aleatórias que surgem e se disseminam ao acaso. Não é a ficção que engrandece a humanidade por trazer o exercício da imaginação e crítica.

A ecologia da desinformação tem protocolo: as histórias, em geral envoltas por ideias conspiratórias, são inventadas com o objetivo claro de produzir desconfiança e trazer uma solução pretensamente fácil. As mensagens são formatadas em linguagem sensacionalista para otimizar os algoritmos das redes sociais e garantir sua maior disseminação.

Na pandemia, saltou aos olhos o emprego de termos científicos e a produção de "estudos" para corroborar mentiras da desinformação. Quem está acostumado com metodologia já entende logo na primeira leitura quando o rigor passa longe. Nesse caso, a ciência é inimiga da desinformação.

Quando as políticas públicas tomam decisões baseadas em estudos científicos, os resultados são indiscutivelmente melhores. Entendemos qual é o procedimento seguro e como, quando e onde funciona. Não só os tratamentos médicos, mas também intervenções complexas, como a transferência de renda ou a distribuição de vacinas.

Além disso, o desenvolvimento de novas patentes e o conhecimento tecnológico permitem maior autonomia ao país. A ciência promove o entendimento do dia a dia e o senso crítico, criando uma força que se autoalimenta.

Países que entenderam a importância do investimento em ciência, não só na produção, mas na formação de profissionais e na disseminação, colhem os frutos há décadas. A ciência não é só para a academia, ela deve ser ensinada e discutida na sociedade, já no momento em que crianças querem saber o porquê de tudo.

Hoje, a ciência estimula que a comunidade não acadêmica participe do desenho das perguntas a serem respondidas, pois ela também se beneficia em ser plural. Precisamos de mais mulheres, mais pessoas negras, mais indígenas: maior representatividade de todas as parcelas da população.

A ciência é necessária, palpável e concebe mudanças positivas na sociedade. Ao contrário da desinformação, sobretudo se disfarçada de ciência.

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