Katia Rubio

Professora da USP, jornalista e psicóloga, é autora de "Atletas Olímpicos Brasileiros"

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Katia Rubio

Fim da Casa Brasil na Olimpíada é demolição de sonho de grandeza

Quebradeira do esporte nacional fica agora expressa na ausência de uma residência em Tóquio

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Casa é aquele lugar sagrado que está associado ao acolhimento. Pode ser uma moradia com diferentes tamanhos, formatos, projetada ou não por arquitetos e engenheiros, com a dimensão de um barraco ou de uma mansão. Sinônimo de segurança, distingue-se de lar, que é a versão afetiva do espaço material constituído por piso, paredes e telhado.

Dentro dessa casa/lar é possível reunir pessoas com diferentes finalidades, que vão de uma reunião de trabalho a uma grande festa para celebrar feitos e conquistas. Diferente das cavernas ou tocas que tiveram a finalidade de abrigo, toda casa é moradia, uma construção cultural que reflete a sociedade que a constrói.

Diante da complexidade desse objeto, que é também conceito, facilmente se entende por que, nos momentos mais difíceis da vida, o desejo de quem está perdido ou demasiadamente cansado é voltar para casa.

Durante o último século, as exposições universais eram uma forma de aproximar os povos. Sem os meios de comunicação atuais, que fazem o mundo se conectar com a pressão de um botão, casas eram construídas ou produzidas em cidades que abrigavam esses eventos. Em 1900, em Paris, ocorreu uma dessas exposições, que ganhou a Torre Eiffel como símbolo e também os Jogos Olímpicos.

Nas últimas edições olímpicas, o Brasil esteve presente com a mesma ação bem-sucedida de outros países que montaram suas casas na cidade olímpica. O objetivo não era apenas mostrar a pujança do esporte nacional ou servir de base para que atletas medalhistas compartilhassem suas histórias de sucesso após o pódio.

Esse espaço com piso e teto, que para alguns chegou a ser um lar porque ali eram apresentadas as memórias de uma difícil trajetória que culminava num final feliz, era também um lugar para mostrar o país.

Contou ao longo dos anos com apoio do governo federal por meio de ministérios que construíram a imagem de uma pátria que dava orgulho aos brasileiros e ao mundo. Era um espaço de apresentação da cultura, da economia, do meio ambiente, do turismo e também do esporte, do que éramos e do que gostaríamos de ser.

É inegável que custava caro, como costuma acontecer com a construção e a manutenção de todas as casas, mas quem está acostumado com economia doméstica sabe que com planejamento se faz festas nababescas nos lares mais modestos.

O então presidente do Comitê Olímpico Brasileiro, Arthur Nuzman, o presidente do Comitê Olímpico Internacional, Jacques Rogge, e o Ministro do Esporte Aldo Rebelo na ocasião, na Casa Brasil em Londres-2012
O então presidente do Comitê Olímpico Brasileiro, Arthur Nuzman, o presidente do Comitê Olímpico Internacional, Jacques Rogge, e o Ministro do Esporte Aldo Rebelo na ocasião, na Casa Brasil em Londres-2012 - Sergio Moraes/Reuters

Sinal dos tempos, este ano caiu a Casa Brasil nos Jogos Olímpicos de Tóquio. Sem apoio do governo federal, sem patrocínios e com despesas mais importantes para pagar, o COB desistiu de um projeto que custaria alguns bons milhões de reais. Faz todo sentido.

Não se pode pensar em construir um palacete quando seus habitantes e usuários estão à beira da fome. Esse ciclo olímpico foi marcado pelo desmonte de uma estrutura construída há anos. A perda de recursos preciosos comprometeu a preparação de atletas e equipes, empurrando para o abismo um projeto que deveria colher ainda frutos do efeito residual da Rio-2016.

As conquistas e pódios que começaram com a medalha de prata de Felipe Wu, a volta por cima de Rafaela Silva, a redenção do vôlei masculino, a consagração de Isaquias Queiroz e da dupla Martine Grael/Kahena Kunze e de tantos outros atletas brasileiros, medalhistas ou não, foram ofuscados pelos escândalos protagonizados por dirigentes máximos do esporte brasileiro.

A quebradeira do esporte nacional fica agora expressa na ausência de uma residência que abrigaria uma construção temporária, onde seria exposta com orgulho a produção de uma nação. A demolição de um sonho de grandeza expõe ainda a fragilidade da estrutura na qual não se sustentaram as paredes que deveriam abrigar as bases para que as gerações futuras pudessem construir o sonho e um país esportivo.

LINK PRESENTE: Gostou desta coluna? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.