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Você, por quem marcha?

As ideias estão em disputa no México; a rua é o campo onde se joga a partida

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Manifestantes protestam contra reforma eleitoral na praça Zócalo, na Cidade do México - AFP
Alberto Ruiz Méndez

Alberto Ruiz Méndez é doutor em filosofia e professor na FFyL, UNAM, Universidad Anáhuac México e na Barra Nacional de Advogados no México

Eu estava sentado na parte mais alta do auditório, que estava lotado, pois a pessoa que deu o curso é uma das figuras-chave para a democracia no México. De todos os ensinamentos e experiências que ela compartilhou conosco durante aqueles dias, há um que eu não pude esquecer: "A construção de nossa democracia foi baseada na desconfiança".

Com essa frase resumiu as diferentes disputas técnicas, teóricas, ideológicas e políticas que, entre partidos políticos, estes e a sociedade civil, e entre ela e o governo, levaram à criação do então IFE (Instituto Federal Eleitoral), que hoje, como INE (Instituto Nacional Eleitoral), está mais uma vez no centro da desconfiança que fez com que os mexicanos caíssem em um dos dois campos: "transformadores" ou "continuístas".

Os "transformadores" apoiam a iniciativa do presidente Andrés Manuel López Obrador de reformar o INE através do chamado Plano B, que, entre outras coisas, inclui cortes na estrutura operacional do instituto. Por sua vez, os "continuistas" criticam o Plano B, mostrando que seus cortes estruturais e orçamentários significariam que a condução e validação das eleições passariam de fato para o governo em exercício.

Além da discussão das brechas legais do plano, este novo episódio de desconfiança traduz a narrativa de ambos os lados em uma mise-en-scène: as marchas. Os "continuistas" saíram primeiro às ruas em 13 de novembro de 2022 para denunciar a tentativa de destruição do instituto; López Obrador convocou uma marcha em resposta em 27 de dezembro do mesmo ano para mostrar o amplo apoio popular de sua iniciativa. Para este ano, os "continuistas" saíram às ruas em 26 de fevereiro; os "transformadores" farão o mesmo no próximo 18 de março.

Quais são as ideias concorrentes? O governo colocou a "austeridade" no centro de sua reforma: quem não defenderia poupar mais e gastar menos (quase) no que seja? Por sua vez, os continuístas fizeram o mesmo com a "segurança", ou seja, defendem a ideia de que, embora o INE possa ser caro, a certeza que outorga aos processos e resultados eleitorais está acima de qualquer cifra.

As marchas de ambos os lados são um bom sinal dos tempos de polarização afetiva em que vivemos. A maioria das reformas promovidas pelo governo nos obrigaram a ser a favor ou contra e, como resultado, a pluralidade democrática teve que ser artificialmente sincretizada para defender como bloco algo sobre o qual tem diferenças.

A dinâmica da atual democracia mexicana está novamente sustentada na desconfiança que lhe deu origem e em afetos que a debilitam ao nos dividir. O discurso governamental reflete a desconfiança que tem em relação à própria democracia; o INE nada mais é do que a face visível do desprezo que os "transformadores" têm pela democracia, mas que adornam com o discurso de serem os portadores da voz do povo. Por sua vez, os "continuistas" terão pouco sucesso em traduzir sua ideia de "segurança" para a população se só a associarem à rejeição e à raiva que a figura de López Obrador desperta neles.

Depois das crises que atravessamos neste século, os mexicanos concordariam que poupar é uma boa ideia, mas, ao mesmo tempo, sabemos que o alto custo das eleições nos permitiu, durante este mesmo século, a alternância no poder e a expressão de nossa voz através do voto. Neste duplo contexto, marchar é expressão da crise/oportunidade em que se encontra a democracia mexicana.

Embora ainda haja um longo caminho legal pela frente para que o Plano B se torne realidade, é provável que, apesar da segunda marcha cidadã dos "continuistas", os "transformadores" já tenham dado os primeiros passos para sua implementação. Portanto, não devemos perder de vista as ideias que sustentam a disputa pelo INE, pois elas definem não apenas a estrutura e o funcionamento de uma instituição, mas também o futuro da democracia mexicana.

Você, para quem marcha: pela austeridade ou pela segurança? As ideias estão em disputa; a rua é o campo onde se joga a partida.

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