Laura Carvalho

Professora da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP, autora de "Valsa Brasileira: do Boom ao Caos Econômico".

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A necessária autonomia do Banco Central

Mercados financeiros globais limitam ações das autoridades monetárias

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Em meio à queda livre das expectativas de crescimento para a economia brasileira em 2019 e dadas as limitações que o teto de gastos impõe à expansão dos investimentos públicos, muitos economistas têm defendido a redução da taxa básica de juros pelo Banco Central como único instrumento possível de estímulo aos investimentos privados e ao consumo das famílias no curto prazo.

As estimativas realizadas pela LCA Consultores são que a taxa de juros real está em terreno neutro há três trimestres. Ou seja, os juros não estariam baixos o suficiente para estimular a economia, ao contrário do que afirma o BC.

Faz todo o sentido, portanto, a pressão sobre o Copom (Comitê de Política Monetária) por um corte na Selic. Só faltou combinar com os americanos.

Roberto Campos Neto, presidente do BC
Roberto Campos Neto, presidente do BC - Raphael Ribeiro - 13.mar.19/BCB

Enquanto o Copom dava início à sua reunião mensal, os mercados financeiros internacionais reagiam em polvorosa a uma declaração do representante comercial dos EUA, Robert Lighthizer, confirmando o aumento das tarifas comerciais sobre produtos chineses em meio às tensas negociações entre os dois países. Até então, os agentes não levavam muita fé nas ameaças proferidas pelo presidente Donald Trump no Twitter.

O índice de volatilidade VIX, que, por ser uma das principais medidas de apetite de risco em Wall Street, costuma ser apelidado de “aferidor do medo”, demonstrou comportamento similar ao de outros episódios de derretimento do mercado de ações norte-americano. Mas o que temos a ver com isso?

Em um influente artigo publicado em 2015, a professora Hélène Rey, da London Business School, concluiu que a existência de um ciclo financeiro global impede que os bancos centrais ao redor do mundo tenham autonomia para definir sua política monetária a partir de seus objetivos domésticos —de combate à inflação e/ou ao desemprego, por exemplo.

Tais resultados contradizem a teoria econômica convencional, segundo a qual bastaria o país se abrir para a entrada e a saída de capitais e deixar sua taxa de câmbio flutuar livremente para garantir essa autonomia.

No artigo, Rey parte da evidência de que um quarto dos movimentos nos preços de 858 ativos financeiros nos cinco continentes é explicado por um fator comum, que mede o apetite de risco global (altamente correlacionado com o próprio VIX).

Isso explica por que uma expectativa de alta na taxa de juros do banco central norte-americano ou uma declaração intempestiva de Trump causam enorme turbulência nos mercados globais, podendo levar, por exemplo, à queda na Bolsa, à alta do dólar e à contração na oferta de crédito mundo afora.

Tais efeitos colaterais acabam obrigando os bancos centrais a reagir, retirando sua margem de manobra para perseguir objetivos domésticos. Rey oferece diversos caminhos para livrar-se dessas amarras —por exemplo, a implementação de controles de capitais e o uso de medidas macroprudenciais.

No Brasil, muitos defendem a autonomia plena do BC em relação ao governo: ao tirar a instituição da alçada dos representantes eleitos, a política monetária não estaria mais sujeita à tentação de priorizar objetivos que não o combate à inflação, o que contribuiria para a sua maior credibilidade com os agentes econômicos. 

Tal debate torna-se no mínimo lateral diante do real desafio que se impõe ao redor do mundo: conseguir a autonomia dos bancos centrais em relação aos mercados financeiros globais e à política monetária dos EUA.

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