Leandro Narloch

Leandro Narloch é jornalista e autor do Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil, entre outros.

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A esquerda e a agenda da abundância

Centro-esquerda americana está finalmente entendendo a importância da oferta de bens para o poder de compra dos pobres

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Suraj Patel é um político do partido Democrata; Ezra Klein e Matt Yglesias são fundadores do site de notícias Vox e colunistas do New York Times. Esses três nomes, entre outros da centro-esquerda americana, têm chamado atenção para um dos principais temas de 2022: a necessidade de se formar um consenso quanto a uma "agenda da abundância".

Em condições normais, se a oferta de um bem aumenta mais que a demanda, os preços caem. Isso é ótimo para os pobres, pois um jeito de fazê-los ganhar mais é tornando as coisas mais baratas.

Tendo essa regra em vista, quem se importa com o poder de compra dos pobres deveria fazer uma pressão enlouquecida por abundância —ou seja, para que se aumente a oferta de apartamentos, médicos, alimentos, energia e outros itens de necessidade básica.

Pessoas em situação de rua em San Francisco, na Califórnia - Shannon Stapleton - 27.mar.2020/Reuters

Mas então por que a esquerda costuma se importar tão pouco com medidas que aumentam a oferta, isso quando não defende abertamente regulações que impedem a abundância? Eis a pergunta, com um quê de autocrítica, que os intelectuais americanos estão fazendo.

Uma resposta é o foco excessivo em subsídios, cotas, controles de preços, vouchers e programas de distribuição de renda.

"Muitos dos grandes sonhos da esquerda focam no lado da demanda", escreveu Klein no artigo "O equívoco econômico que a esquerda está finalmente enfrentando". Para ele, está na hora de se criar um "supply-side progressivism", uma esquerda focada no lado da oferta.

San Francisco é o melhor exemplo de estrago causado pela falta de preocupação com a oferta de bens.

Governada há décadas por Democratas, a cidade tem regras superestritas de construção e uso do solo. É mais fácil Elon Musk mandar um carro para Marte do que construir um prédio na cidade. Com a oferta estável mas a demanda em alta, o preço dos imóveis subiu 900% desde 1980.

O poder dos moradores de vetar novas construções no bairro e o excesso de restrições acabaram tornando San Francisco uma cidade excludente, para poucos.

Milhares de pessoas moram nas ruas porque não conseguem comprar uma casa ou pagar um aluguel do metro quadrado mais caro dos Estados Unidos.

Para não jogar do lado das incorporadoras, a esquerda costuma responder ao problema com medidas paliativas (cotas de apartamentos populares, controle de aluguéis, crédito subsidiado).

"Mas é criando abundância —muitas casas para todos, com o preço das novas moradias relacionados aos custos básicos de construção e casas ‘usadas’ disponíveis a preços com desconto— que se constrói uma sociedade mais funcional", diz o jornalista Matt Yglesias em sua newsletter.

Fenômeno semelhante ocorre na saúde, área em que o lobby dos médicos impõe regras que restringem a oferta de profissionais e a simplificação de procedimentos.

Com menos concorrência, médicos e hospitais podem abusar dos preços. A resposta do governo (subsídios dos planos de saúde) acaba aumentando ainda mais a demanda —e os preços.

Na área da energia, alguns defensores da agenda da abundância dizem coisas que parecem ter vindo do ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles.

"Precisamos ampliar o poder da Comissão Federal de Regulação de Energia para contornar comunidades que tentam bloquear a construção de linhas de transmissão", disse numa sequência recente de tweets o ativista Suraj Patel, que foi candidato a deputado pelo partido Democrata.

Matt Yglesias acredita que um primeiro passo é aceitar as leis básicas da economia.

"Há um certo tipo de pessoa para quem a chave para destravar uma mudança radical e progressista na política econômica é desmascarar o modo econômico de pensar", diz ele. Em outras palavras, está na hora da esquerda aceitar a lei da oferta e procura.

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