Lúcia Guimarães

É jornalista e vive em Nova York desde 1985. Foi correspondente da TV Globo, da TV Cultura e do canal GNT, além de colunista dos jornais O Estado de S. Paulo e O Globo.

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Onda vermelha republicana não aconteceu, e Biden não deve ser pato manco

Presidente pode ter chance de emergir como democrata que menos sofreu derrotas nas primeiras midterms desde os anos 1940

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Lúcia Guimarães

As midterms nos EUA me lembraram de um popular ditado —"Mãos ociosas são a oficina do demônio". Se houvesse TV a cabo e internet no tempo do Velho Testamento, o adágio seria "espaço e tempo ilimitados são a oficina do autoengano".

As pesquisas de opinião erraram de novo sobre quem ia votar e por que, e a propagada onda vermelha de vitórias republicanas não aconteceu. Os levantamentos impulsionaram uma usina de profecias autorrealizadas entre analistas políticos que abominam um vácuo.

Eleitores chegam a local de votação para as midterms em Marietta, no estado da Geórgia
Eleitores chegam a local de votação para as midterms em Marietta, no estado da Geórgia - Bob Strong/Reuters

Há muita expectativa não cumprida para avaliar, ainda que só em dezembro haverá uma definição do cenário em que Joe Biden governará. Como em 2020, a eleição para senador na Geórgia será crucial para os democratas manterem o controle do Senado pelo voto de desempate da vice Kamala Harris.

O Partido Republicano não conseguiu vender a agenda de crueldade teocrática e, em pelo menos quatro de cinco estados que incluíram o direito ao aborto em propostas, venceu a proteção do direito usurpado pela Suprema Corte em junho passado. O que mais não aconteceu?

Candidatos palhaços abençoados por Donald Trump, como o médico charlatão Mehmet Oz, não agradaram o eleitorado conservador. Mas o Partido Republicano continua dominado pela influência do ex-presidente que não para de lhe impor derrotas nas urnas, desde as midterms de 2018.

Os hispânicos não são um segmento monolítico do eleitorado, e não é possível nacionalizar a vitória retumbante que deram ao Trump envernizado Ron DeSantis, reeleito governador da Flórida.

Biden não é um pato manco, ao contrário do que sugerem as imprecisas pesquisas. Quando acabar a apuração e as esperadas contestações dos perdedores negacionistas das urnas, Biden terá a chance de emergir como o presidente democrata que menos sofreu derrotas nas primeiras midterms desde os anos 1940. George W. Bush obteve vitória nas suas primeiras midterms, mas no ano seguinte ao 11/9.

Não é possível usar largas pinceladas para compor uma imagem do cenário político dos EUA. Os estados devem se confirmar como laboratórios de mudanças, para melhor e para o catastrófico pior, como nos esforços para reduzir o acesso às urnas. Mesmo neste aspecto, ficou claro que a estratégia republicana de questionar eleições limpas e dificultar o voto como instrumentos de governo pela minoria foi derrotada.

Eleitores querem votar em massa —presencialmente, em horários prolongados, por correio, e esse direito sagrado da democracia não tem partido. Infelizmente, os sexos parecem ter, porque aumentou a diferença partidária entre homens e mulheres. O início da apuração revelou que 53% das mulheres votaram em democratas, ante 42% entre homens, distância certamente ampliada pelos ataques ao direito ao aborto.

É possível que a polarização política dos EUA resulte em eleições apertadas durante anos. Assim, os planos dos lunáticos trumpistas que comemoram a recuperação do controle da Câmara podem esbarrar no pequeno número de deputados republicanos que vão formar a maioria. Na Casa Branca, um favorito dos comediantes pela idade avançada e os folclorismos não pode ser culpado se estiver sorrindo e encontrar no espelho a imagem do mais consequente presidente democrata do último meio século.

Erramos: o texto foi alterado

O ditado traduzido do inglês "mãos ociosas são a oficina do demônio" não é bíblico. O texto foi corrigido.

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