Lúcia Guimarães

É jornalista e vive em Nova York desde 1985. Foi correspondente da TV Globo, da TV Cultura e do canal GNT, além de colunista dos jornais O Estado de S. Paulo e O Globo.

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Descrição de chapéu Eleições EUA

Primárias nos EUA mostram que falta democracia no país

Disfunção do processo eleitoral exibida a cada 4 anos expõe a crescente ausência de vigor democrático no país

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No próximo sábado (3), o estado que salvou a campanha de Joe Biden em 2020 vai realizar primárias eleitorais do Partido Democrata. Em eleições gerais, contudo, a conservadora Carolina do Sul só elege presidentes republicanos desde 1976.

Se essas informações geram confusão entre os leitores brasileiros, eles têm companhia de sobra entre os eleitores americanos.

No último fim de semana, o presidente visitou o estado sulista, cortejando o local onde, em novembro de 2020, recebeu votos de 61% dos eleitores negros, mas só 31% dos brancos. Ele deve a abertura do caminho para a Casa Branca à liderança política negra da Carolina do Sul e, especialmente, ao deputado James Clyburn.

Estação de votos é usada em Moncks Corner, cidade na Carolina do Sul - Brandon Bell - 31.jan.24/Getty Images via AFP

O Biden de 2024 não conta hoje com o mesmo endosso maciço do eleitorado negro, porém, e sua política externa, desde o começo da guerra em Gaza, desperta indignação, especialmente entre jovens. Sinais de apatia entre os democratas negros da Carolina do Sul seriam preocupantes para a candidatura de Biden, cuja popularidade teima em não refletir os benefícios econômicos da sua Presidência.

Já a primária republicana no estado é só no fim do mês, e vai ser mais um episódio do absurdo teatro kabuki em cartaz neste ano. A candidatura de Nikki Haley, a única adversária de Donald Trump que sobrou no ringue, pode dar seu último suspiro na Carolina do Sul que ela governou por dois mandatos, até 2017.

Não há, no momento, uma via para Haley derrotar Trump nas primárias. E é difícil até mesmo chamar essas votações de primárias –um processo criado no começo do século 20 em parte para impedir que caciques de um partido ungissem um favorito nos bastidores.

Mas, a cada quatro anos, a disfunção do processo eleitoral americano vai expondo cada vez mais a falta de vigor democrático no país. O calendário das votações primárias dá peso desproporcional a estados com população esparsa, numa erosão da representatividade.

A vitória de Trump em Iowa, coberta com alarde como um indicativo de seu controle sobre os republicanos, foi atingida com apenas 56.260 votos. E de que vale 50 estados realizarem primárias se quase todos os pré-candidatos republicanos prometeram endossar a eleição do golpista estuprador que promete desmontar a democracia constitucional? Por que votar na cópia, se o original está concorrendo?

No campo democrata, Biden não tem adversário viável. Não por fazer ameaças a grandes doadores como Trump fez, dizendo que seriam perseguidos se ele se elegesse. Mas, pelo menos em certa medida, porque a influência da ala progressista do partido neste governo convenceu líderes de esquerda a não sacudir o barco diante do terror de um novo mandato de Trump que desmonte tudo.

É válido argumentar que seria melhor para a democracia se um democrata sólido e mais jovem tivesse apresentado uma pré-candidatura. Mas não há nada normal neste ano. Um ex-presidente popular, com sinais de demência, promete fascismo. Um presidente visivelmente cansado, aos 81 anos, oferece políticas mais progressistas do que seus antecessores democratas do último meio século.

Donald Trump faz discurso após confirmação de sua vitória por ampla margem no caucus de Iowa, nesta segunda - Getty Images via AFP

E ainda temos o Colégio Eleitoral, um monstrengo de 538 membros com poder de certificar o voto popular que, inventado há 200 anos para aplacar os brancos racistas do Sul, dois terços dos americanos hoje gostariam de ver abolido. Em sua tentativa de golpe de Estado, Trump agiu para apontar falsos membros do Colégio Eleitoral para roubar a vitória de Joe Biden.

George W. Bush foi o último republicano a chegar à Casa Branca pelo voto popular, em 2004. Que democracia é esta?

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