Lúcia Guimarães

É jornalista e vive em Nova York desde 1985. Foi correspondente da TV Globo, da TV Cultura e do canal GNT, além de colunista dos jornais O Estado de S. Paulo e O Globo.

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Apoio de Biden a Netanyahu é como um abraço entre afogados

Premiê israelense é um gângster que finge aceitar apelos de Washington para depois seguir em frente com a carnificina

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"Isto é um Holocausto," disse o presidente americano por telefone ao primeiro-ministro de Israel. "Eu acho que eu sei o que é um Holocausto," respondeu, sarcástico, o premiê Menachem Begin, sobre a comparação feita por Ronald Reagan.

Era agosto de 1982, e um hoje extinto establishment do Partido Republicano começava a se revoltar contra o bombardeio israelense de civis no Líbano. Reagan reagia a um dia de ataques que havia deixado 100 civis mortos. Vinte minutos depois, Begin ligou de volta avisando que tinha suspendido o bombardeio. O diálogo foi reproduzido por Lou Canon, biógrafo de Reagan.

Presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, à esquerda e o premiê israelense, Binyamin Netanyahu, à direita da imagem feita em um encontro em Tel Aviv - Evelyn Hockstein - 18.out.23/Reuters

Muito mais do que um prêmio Nobel da Paz separa Mencahem Begin de Binyamin Netanyahu. O atual premiê é um sanguinário inimigo da paz no Oriente Médio, além de julgado por fraude, por aceitar propina e por atos de desonestidade no cargo. Falta lembrar que ele abraçou neonazistas na sua coalizão de governo, como relatou o Haaretz, o principal jornal do país, há um ano.

Isso torna difícil compreender por que Joe Biden acreditou em Netanyahu, depois de ter passado oito anos como vice de Barack Obama, que chamava o premiê de desonesto para baixo. O isolamento americano na proteção da fúria genocida de Israel em Gaza é crescente, como ficou claro no terceiro veto dos EUA a uma proposta de cessar-fogo. Só houve uma abstenção de um aliado americano, o Reino Unido, cujo atual chanceler, David Cameron, descreveu Gaza, em 2010, como "uma prisão a céu aberto". Japão, Coreia do Sul e Suíça estão entre os 13 membros do Conselho que votaram a favor de um cessar-fogo imediato.

O custo do aparente cheque em branco que Washington passou para Israel matar 12 mil crianças, entre os cerca de 30 mil palestinos mortos desde outubro, vai se revelando bem mais alto do que se sabe lá qual cálculo político Biden fez. O presidente americano tem personalidade impulsiva. E ele não estava sozinho no impulso despertado em todo mundo pelo horrendo ataque do Hamas no dia 7 de outubro.

Mas não há justificativa para ter despejado assistência militar incondicional no colo de um líder que, no passado, já ignorava apelos do país que paga suas contas. Netanyahu é um gângster que repetidamente finge aceitar apelos de enviados de Biden para depois seguir em frente com a carnificina.

Na terça (20) o prefeito de Dearborn, no Michigan, cidade com maior número de muçulmanos dos EUA – mais da metade dos 100 mil habitantes— acusou Joe Biden de trair o segmento demográfico que, segundo ele, votou consistentemente em democratas nas três últimas eleições federais.

Abdullah H. Hammoud relatou, no New York Times, que recebeu um enviado da Casa Branca sob a condição de que Biden retirasse o apoio aos bombardeios de Gaza. Hammoud, filho de libaneses, disse que vai marcar a opção "nenhum nome" na próxima terça (27), na cédula da eleição primária de Michigan, o estado que ajudou a dar a vitória para Donald Trump em 2016 e que Biden levou por apertados 2,8% em 2020.

Uma nova pesquisa mostra que 51% dos israelenses dizem não acreditar ser realista o objetivo de Netanyahu —a destruição completa do grupo terrorista Hamas. Entre os americanos que se identificam como democratas, 62% dizem que Israel foi longe demais. E 35% do público geral diz ver que o que está em curso em Gaza como um genocídio.

O apoio de Biden a Netanyahu é um abraço de afogados que ameaça afundar o legado real da sua Presidência.

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