Luciana Coelho

Secretária-assistente de Redação, foi editora do Núcleo de Cidades, correspondente em Nova York, Genebra e Washington e editora de Mundo.

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Luciana Coelho

'Samantha!', na Netflix, parte de ideia promissora, mas fica a desejar

Comédia se esgota assim que passa a fascinação nostálgica pela protagonista

A atriz Emanuelle Araujo em cena da série "Samantha", da Netflix
Emannuele Araújo foi estrela infantil em ‘Samantha!’  - Fabio Braga/Divulgação

É instigante a escolha da Netflix por "Samantha!" como sua primeira produção cômica no Brasil, e a série de Felipe Braga tem se saído bem em resenhas estrangeiras, com segunda temporada já garantida na plataforma de streaming.

A série, que segue a trilha oitentista já tomada pelo canal em "Stranger Things", tem uma premissa deliciosa, a da ex-estrela mirim de TV que, 30 anos depois, tenta reconstruir sua fama em um meio cuja natureza mudou drasticamente tanto em termos tecnológicos quanto culturais.

A boa performance de Emanuelle Araújo como a estrela-título e de Douglas Silva (o Dadinho de "Cidade de Deus") como seu par e escada para esquetes, o ex-jogador Dodói, também ajudam a segurar o roteiro e a fazer esquecer a canastrice de quase todos os demais atores em cena. Araújo, uma presença vigorosa, tem ótimo timing cômico.

O maior problema de "Samantha!", contudo, é exatamente aquele que atormenta sua protagonista: viver à sombra de algo maior, a ponto de escolher se converter em caricatura de si mesma.

O algo maior, no caso da série, é o filme "Bingo, o Rei das Manhãs" (2017), inspirado na carreira do palhaço televisivo Bozo, outro ícone dos anos 1980 (no qual, aliás, Araújo interpreta a cantora Gretchen).

É cruel comparar "Samantha!" com filme de Daniel Rezende que tem Vladimir Brichta como protagonista, uma obra sensível e sarcástica em que drama e comédia se retroalimentam em simbiose rara.

A série da Netflix não tem essa sutileza —nem sequer para omitir que sua inspiração maior seja a cantora Simony, apesar das negativas.

O roteiro calcado em esquetes, ainda que com algumas boas tiradas, parece fora de sincronia com nossos tempos, sem dar aos demais personagens qualquer dimensão que vá além da piada óbvia.

É um tipo de comédia vencido, que, embora possa entreter por algum tempo, se esgota assim que passa a fascinação nostálgica pela protagonista (a única que mereceu uma história pregressa).

Com isso, "Samantha!" carece de fôlego para sustentar uma maratona, o formato privilegiado pela plataforma. Pode funcionar, se tanto, como entretenimento eventual, já que a curta duração (27 minutos por episódio) e a história sem nós não impõem desafios à atenção do espectador.

A série, afinal, se sai melhor em seus flashbacks, cenas curtas que mostram a personagem central na infância e nos lembram quão bizarra e confusa foi a década de 80, quando a pequena Duda Alencar brilha como a estrela mirim que de fofa só tem a aparência.

De certa forma, trata-se de um exercício de metalinguagem, a TV atual olhando para tempos mais toscos, e sendo tosca ao cumprir essa tarefa.

Pode ser resultado da linha de produção da Netflix, onde há certa pasteurização da produção global. Ao mesmo tempo em que nos serve uma maior diversidade de enredos, personagens e procedências, o canal também tende a passá-los todos pelos mesmo filtros, criando versões mais anódinas do que poderiam ser.

‘Samantha!’ está no ar na Netflix

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