Luciana Coelho

Secretária-assistente de Redação, foi editora do Núcleo de Cidades, correspondente em Nova York, Genebra e Washington e editora de Mundo.

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Luciana Coelho
Descrição de chapéu Maratona

'The Underground Railroad' une escravidão e realismo fantástico

Diretor de 'Moonlight' dispensa sutileza para dar conta da barbárie de uma história real, mas inverossímil

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Não há sutileza na forma como o diretor Barry Jenkins conduz "The Underground Railroad: Os Caminhos para a Liberdade", drama de época com um quê de realismo fantástico em dez capítulos para o Amazon Prime Video. Nem teria como haver.

O cenário, afinal, é o dos estertores da escravidão no sul dos Estados Unidos, cujos tentáculos podres são visíveis até hoje, e não só lá. Essa evolução do racismo, de muitas formas, é tema corrente para o diretor dos filmes "Moonlight" e "Se a Rua Beale Falasse". Aqui, como matéria-prima, Jenkins toma o multipremiado livro de Colson Whitehead (ed. Harper Collins, 2017).

É uma narrativa difícil e visualmente opulenta, não só pela crueza com que retrata os aspectos mais sórdidos da escravidão, mas também pela sofisticação da trama, que interpõe camadas de história e de fantasia com uma destreza que propositalmente confunde o espectador.

Acompanhamos Cora (a excepcional Thuso Mbedu, cujos silêncios guardam uma imensidão), fugida da escravidão no estado da Geórgia com a pretensão de chegar ao norte de negros libertos fazendo uso da "ferrovia subterrânea" do título.

O que no mundo real era uma rede de contatos e rotas de fuga mantida por abolicionistas e ativistas, muitos deles ex-escravizados (a ativista Harriet Tubman foi uma de suas organizadoras mais ativas), no livro e na série se materializa em uma ferrovia que corre por debaixo da terra, com maquinistas, horários e trilhos, e também estações e pontos de parada.

Esse aspecto fantástico contrasta com a violência obscena com que Jenkins exibe os castigos recebidos pelos escravizados, aos olhos de brancos sádicos, indiferentes ou acovardados. A covardia, aliás, é uma constante na história, assim como o sofrimento, embora este último esteja particularmente reservado a Cora em sua fuga circular.

O antagonista de Cora é Ridgeway (Joel Edgerton), um caçador de escravos que parece ser o único a ter propósito entre os cruéis, e sua jornada está cheia de outros personagens fantasmagóricos, como o atordoante Homer (Chase Dillon), o menino negro que acompanha o caçador, e Mabel (Sheila Atim), a mãe que a abandonou na infância e a assombra desde então.

Não é recomendado deglutir tudo que Jenkins oferece de uma vez. Os episódios pesam, as cenas também, e há tanto para ver e pensar que o melhor é evitar uma maratona.

O contraste da beleza plástica da série com a profunda dor que ela retrata é incômodo, e a cada capítulo se torna mais difícil esperar por um desfecho positivo (uma alegoria perfeita ao tema).

Com "The Undergroud Railroad", se torna evidente a predileção de cineastas negros pela fantasia a partir de episódios reais, a se levar em conta as recentes "Watchmen" e "Lovecraft Country", além de toda a produção de Jordan Peele ("Corra!"). Pode mesmo ser o jeito mais eficiente de dar conta do horror de uma história real, mas inverossímil, às novas gerações.

Os dez episódios de 'The Underground Railroad' estão disponíveis na Amazon

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