Luís Francisco Carvalho Filho

Advogado criminal, é autor de "Newton" e "Nada mais foi dito nem perguntado"

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Luís Francisco Carvalho Filho

Sócios do mal e do atraso 

Depois de um mês, nada se fez na intervenção no Rio e aparentemente não se sabe o que deve ser feito

Depois de um mês, a intervenção no Rio de Janeiro parece destinada ao fiasco. Nada se fez e aparentemente não se sabe o que deve ser feito.

Além do déficit orçamentário (se é para pagar salários atrasados, melhor seria intervenção nas finanças), há problemas de gestão.

O crime premeditado contra a vereadora Marielle Franco, entre tantos sinais de deterioração moral, revela que se perde a imagem de suspeitos pela falta de manutenção de câmaras instaladas para os Jogos Olímpicos de 2016: escuridão e desperdício ampliando o território da insegurança.

Até onde vai o poder gerencial do interventor? Qual o destino das verbas federais? Como escolher prioridades? Quem fiscaliza gastos? Qual o modelo de polícia? O Exército resolve, até dezembro, o comprometimento da "ordem pública"?

A falta de transparência, apesar da austeridade aparente, é da tradição militar. Nas Forças Armadas, processos e inquéritos correm em sigilo. A imprensa não se ocupa das casernas. Ao desenhar o cenário da violência carioca, o general Walter Braga Netto fala do excesso de mídia. Comissões da verdade não são bem-vindas.

O decreto de Temer (aprovado por deputados e senadores) dá poderes extraordinários ao interventor. Não está sujeito às normas estaduais que "conflitarem com as medidas necessárias à execução da intervenção", pode requisitar recursos financeiros, tecnológicos, estruturais e humanos.

O Brasil não reprime abusos de autoridade. Soldados têm código criminal e juízes especiais mesmo quando cometem crime contra civis. Agentes do mal ou do atraso, magistrados lutam pelo auxílio-moradia ou restringem a eficácia de garantias constitucionais (como o habeas corpus) ou celebram a violência policial.

A lei 12.850/13, que define organização criminosa, recebeu emenda em 2015 que conspira contra a transparência da coisa pública: a polícia judiciária, para proteger o sigilo da "capacidade investigatória", está dispensada de fazer licitação e de dar publicidade a contratos de serviços técnicos e de aquisição de equipamentos para "captação ambiental" e "interceptação de comunicações telefônicas e telemáticas".

O interventor sabe que a polícia é corrupta e letal e que o Judiciário é omisso. A presença de tropas nas ruas e favelas impressiona a vizinhança e surpreende bandidos de passagem, mas não elimina a desenvoltura do crime organizado.

O ano eleitoral é componente da agenda intervencionista. Será esclarecido o caso Marielle? Haverá operações contra milicianos e suas conexões políticas?

A intervenção estará associada ao mal se disseminar o militarismo de Jair Bolsonaro ou se replicar a podridão das polícias e do crime organizado.

PT e PSDB são sócios do atraso. Se em matéria de águas, a hegemonia tucana em São Paulo, desde 1995, não extirpou a sujeira dos rios Tietê e Pinheiros, contra petistas e seus parceiros, como Sérgio Cabral, sempre atentos às urgências cariocas, pesa a sujeira da baía da Guanabara.

O crescimento vertiginoso da população carcerária é herança petista. A consolidação do PCC no cenário nacional é parte do legado tucano.

Direita e esquerda ainda fazem rescaldo do século passado. O caráter simbólico da intervenção é a derradeira cartada de Temer.

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