Luís Francisco Carvalho Filho

Advogado criminal, é autor de "Newton" e "Nada mais foi dito nem perguntado"

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Luís Francisco Carvalho Filho
Descrição de chapéu Folhajus STF

STJ, STM e as licenças para estuprar e matar

STJ tratou um homem, maior de idade, como persona vulnerável

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Dois julgamentos recentes estão desconectados do mundo contemporâneo e acentuam o sentimento de desamparo e violência.

O Superior Tribunal de Justiça acaba de absolver, por maioria de votos (3 a 2), um homem que, em Minas Gerais, aos 20 anos, engravidou menina de 12. O Código Penal define, com clareza, o crime de estupro de vulnerável, com pena de 8 a 15 anos de reclusão, e estabelece: o "desconhecimento da lei é inescusável".

O STJ entende que a punição do agressor prejudicaria o "bem-estar" da criança nascida do estupro (aos 12, não se fala em consentimento, a violência é presumida). "Temos uma criança, e o pai continua dando assistência a essa criança", sustenta o magistrado.

A decisão, apesar de mencionado o caráter "excepcional", em determinadas situações, constituiria licença para estupro. Provavelmente o caso irá para o Supremo. Mas, se ela prevalecer, o réu de amanhã vai dar "assistência" à vitima e à criança, manifestar seu amor e dizer que desconhecia o teor da lei, tão severa. O precedente se encaixa como uma luva.

O tribunal é sobretudo machista. Trata o homem, maior de idade, como persona vulnerável no processo: afastado da criança e condenado à prisão, teria a vida desnecessariamente destruída. Que se dane a vida da menina, destruída pelo estupro, pela gravidez indesejada e também pela desconfiança que aparece em relação ao comportamento da mulher.

Cresce o número de estupros no Brasil. Cresce o número de estupro de vulnerável, normalmente praticado por alguém de perto, que convive com a vítima ou que dela se aproxima, maliciosamente.

Começo do mês, o Superior Tribunal Militar iniciou julgamento do recurso de oito militares envolvidos no assassinato, por engano, do músico Edvaldo Rosa dos Santos e do catador Luciano Macedo, em 2019, no Rio de Janeiro.

Os soldados confundiram o automóvel (com o de um suposto bandido) e desferiram 257 tiros contra as vítimas. Nenhum tiro desferido contra eles. Em liberdade, estão condenados a penas que variam de 28 a 30 anos de reclusão.

Protesto no Rio em 2019 contra os militares que mataram o músico Evaldo Santos - Lucas Landau/Reuters

O relator vota pela absolvição dos réus, por legítima defesa: não tinham interesse em matar os civis. Na época, o presidente Jair Bolsonaro manifestou-se na mesma direção. É um "incidente", lamentando a morte do trabalhador honesto (uma das vítimas): "O Exercito não matou ninguém. O Exército é do povo. A gente não pode acusar o povo de assassino".

O revisor sugere solução mais amena (três anos), punição por suposto homicídio culposo –quando não há intenção de matar. Duzentos e cinquenta e sete tiros. O julgamento continua. A única mulher da corte, ministra Maria Elizabeth, nomeada por Lula em 2007, pede vista do processo. Vai votar contra?

Se prevalecer a tese do relator ou do revisor, o STM (formado por quatro oficiais do Exército, três da Marinha e três da Aeronáutica, todos da ativa e do posto mais elevado da carreira, e cinco civis) emitiria uma mensagem judicial que se confunde com licença para matar, beneficiando policiais e militares que atiram a esmo, por engano, porque se confundem ou não têm interesse em matar.

Elio Gaspari relembra outros episódios pouco edificantes da Justiça Militar.

Na contramão do tribunal, aumenta a letalidade policial, particularmente em São Paulo. O governador "não estou nem aí" é um dos seus fiadores.

No Legislativo e nas prefeituras, estão celebrando as bancadas da bala, religiosos e o agronegócio.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.