Lygia Maria

Mestre em Jornalismo pela Universidade Federal de Santa Catarina e doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP.

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Liberdade esfaqueada

Seja pela religião ou pela política, o fundamentalismo não suporta o livre pensar

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Na última sexta-feira, um escritor foi esfaqueado apenas por ter publicado um livro considerado ofensivo por líderes de uma religião. Chega a ser surreal que isso aconteça em pleno século 21. Salman Rushdie foi vítima da fatwa, decreto que o aiatolá Khomeini, líder supremo do Irã, emitiu contra o autor de "Versos Satânicos". Tradutores da obra também foram atacados nos anos 90, e impossível não lembrar do massacre perpetrado por radicais islâmicos contra cartunistas do jornal francês Charlie Hebdo em 2015.

Perseguir artistas e pensadores não é exclusividade da religião islâmica. Na Idade Média, a Inquisição católica torturou e matou quem discordava dos dogmas da Igreja. O cientista Giordano Bruno, por exemplo, foi parar na fogueira, e o Índex listava livros proibidos. A lógica da Inquisição é a mesma da fatwa, a diferença é que o catolicismo passou por um longo processo de laicização, ou seja, perdeu espaço como poder de Estado.

Já países islâmicos como o Irã estão sob regimes teocráticos, nos quais a religião comanda todos os aspectos da vida dos cidadãos. Até quem está fora do regime pode sofrer ataques, como demonstram os atentados contra Rushdie e Charlie Hebdo.

Mulher coloca uma caneta na praça central da cidade de Estrasburgo, no leste da França, em 8 de janeiro de 2015, para homenagear as vítimas de um ataque de homens armados contra o jornal satírico francês Charlie Hebdo, em Paris, no dia anterior, que deixou pelo menos 12 mortos e muitos outros feridos
Mulher coloca uma caneta na praça central da cidade de Estrasburgo, no leste da França, em 8 de janeiro de 2015, para homenagear as vítimas de um ataque de homens armados contra o jornal satírico francês Charlie Hebdo, em Paris, no dia anterior, que deixou pelo menos 12 mortos e muitos outros feridos - Patrick Hertzog - 8.jan.2015/AFP

Atacar a liberdade de expressão também não é exclusividade da religião. Já vimos que uma política de Estado baseada no ateísmo pode promover massacres. Como esquecer os artistas e pensadores torturados e mortos em gulags na URSS? O fundamentalismo político também não aceita o livre pensar.

Ou seja, o problema é o Estado se meter em assuntos que não devem ser da sua seara, como a expressão intelectual, artística, religiosa e política. A filosofia liberal, desde Espinosa —que, por sinal, estava no Índex católico—, passando por John Stuart Mill até hoje, alerta para a necessidade de restringir a área de atuação do poder de polícia do Estado. Sem a defesa intransigente dessa restrição, ataques bárbaros como o sofrido por Salman Rushdie continuarão a estampar os noticiários.

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