Lygia Maria

Mestre em Jornalismo pela Universidade Federal de Santa Catarina e doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP.

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Regulação sem censura

Se projeto de lei não definir o que é fake news e regulador, corremos o risco de construir nossa própria prisão

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Há milênios filósofos se debatem sobre quem pode dizer o quê, onde e como. De Aristóteles a Sartre, passando por Espinosa e Rousseau, foram muitos os que falaram sobre a liberdade de expressão.

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Sessão plenária na Câmara durante votação do pedido de urgência para o Projeto de Lei de Combate às Fake News - Pedro Ladeira - 25.abr.23/Folhapress

Mas parece que a questão é simples para o Parlamento brasileiro, e a regulação do tema poderia ser decidida de supetão —o chamado PL das Fake News data de 2020, mas cerca de 40% de suas disposições foram acrescentadas há pouco tempo. Decisão perigosa para tratar de um dos pilares da democracia moderna.

No geral, países não autoritários baseiam-se no famoso "princípio do dano" (harm principle) de John Stuart Milll: tudo pode ser dito, contanto que o dito não faça mal a alguém.

Fazer mal é muito amplo, então o filósofo restringe o dano à invasão de direitos. Direitos objetivos, diga-se. Apenas sentir-se incomodado muitas vezes não é suficiente —afinal, o mal-estar é intrínseco à civilização, já dizia Sigmund Freud.

Mill nos fornece um exemplo que já se tornou um clássico. Publicar um artigo de jornal que impute a fome dos pobres à ganância dos comerciantes de milho é válido. Outros artigos que desmontem tal afirmação podem ser publicados e, assim, a sociedade se aproxima da verdade.

Já bradar a acusação na frente da casa de um comerciante de milho durante protesto popular não é aceitável, dado o risco de violência ou do impedimento do direito de ir e vir.

Mas não estamos no século 19. Mill não viu as redes sociais, que alteraram as noções de tempo, espaço e o raio de ação daquilo que falamos.

Logo, é importante criar regulações que se adaptem a esse novo cenário comunicacional, mas isso não deveria ser feito com uma urgência fantasiosa que mascara potenciais descalabros. Entre eles, a censura.
Sem estipular claramente o que é fake news ou discurso de ódio ou, principalmente, que instituição será a responsável por fiscalizar e punir infrações, corremos o risco de construir nossa própria prisão. Não à toa, os próprios deputados querem ficar imunes aos efeitos da lei.

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