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O novo e o velho design brasileiro no combate à covid-19

Dificuldade de importação de peças emperra desenvolvimento local enquanto engenharia reversa e impressão 3D impulsionam novo produto

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Uma das boas notícias durante a crise provocada pela pandemia foi a criação de um ventilador pulmonar emergencial, aparelho essencial no tratamento de muitos doentes graves de Covid-19, por engenheiros da Universidade de São Paulo, no projeto Inspire. Os primeiros testes tiveram êxito e o ventilador pode entrar na linha de produção quando tiver aprovação a Anvisa.

Segundo reportagem da Folha, há empresas prontas para começar a fabricá-lo e a velocidade de produção vai ser determinada pelo fluxo de importação de alguns componentes. E é aí que a falta de investimento em design e tecnologia nacionais cobra seu preço.

Qual é o estado da arte? No início de abril, o Ministério da Saúde afirmou que o país tinha 65.411 ventiladores mecânicos, sendo que 46.663 estariam no Sistema Único de Saúde (SUS).

Enfermeira checa respirador em paciente em hospital perto de Paris, na França
Enfermeira checa respirador em paciente em hospital perto de Paris, na França - Benoit Tessier - 20.abr.20/Reuters

Desse total, 3.639 encontravam-se em manutenção ou ainda nem haviam sido instalados. Em 2019, o Brasil importou 3.881 respiradores mecânicos. A produção nacional está nas mãos de quatro fábricas principais, de acordo com a Abimed. Mas nenhuma delas usa apenas componentes brasileiros.

Componentes essenciais para os modelos atuais são importados. Se a importação nos períodos normais tem seus trâmites subordinados à dinâmica de mercado pura e simples, atualmente a porca torceu o rabo.

Com a demanda mundial aumentada, a concorrência se acirrou. Os preços e condições de compra ficam mais selvagens, os voos internacionais são mais restritos (o que dificulta o transporte de insumos e de equipamentos), e as normas de exportação de cada governo mudam, para proteger os cidadãos. O movimento de proibir a exportação de equipamentos de saúde foi mundial, Brasil incluso.

Não existe hoje em dia um respirador de alta performance com tecnologia 100% brasileira.

Mas nem sempre foi assim. O Mini Ventilador 600, mais conhecido como Takaokinha ou Cebolinha, é um ventilador mecânico brasileiro criado pelo médico anestesiologista, torneiro mecânico e inventor Kentaro Takaoka, nos anos 1950, e que foi usado até o fim dos anos 1980. Portátil, mecânico, era acionado pelo próprio fluxo de oxigênio do paciente. Pesava 200 gramas.

Os estudos para a criação do equipamento começaram numa oficina-laboratório montada pelo médico no nono andar do Hospital da Clínicas de São Paulo, com subsídios do Instituto de Pesquisas Tecnológiocas, o IPT.

O Dr. Takaoka queria um instrumento eficiente, elaborado com peças pequenas e simples, e que coubesse "no bolso do paletó", segundo a sua biografia que está contada no site do Conselho Regional de Medicina de São Paulo.

Depois de desenvolver o ventilador, o médico que queria ser engenheiro fundou a K. Takaoka Indústria e Comércio Ltda para produzir e comercializar o equipamento, que foi patenteado em vários páises.

Agora, diante da escassez de ventiladores, o Takaokinha está sendo ressuscitado num projeto sensacional por um grupo de médicos, designers, engenheiros e advogados voluntários, de 12 estados brasileiros.

A partir de um chamado da Sociedade Brasileira de Anestesiologia, dois Takaokinhas antigos foram cedidos pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e dois vieram de museus particulares de médicos de Campinas e Rio de Janeiro para serem analisados.

Os equipamentos foram submetidos processos de engenharia reversa – a desmontagem para entender o funcionamento, o processo de montagem e separar os componentes – e agora servem de modelo para o respirador Breath4Life, da aceleradora de startups do Hospital Albert Einstein, de São Paulo.

Além de pequeno, mecânico e portátil como o original, o novo Takaokinha poderá ser impresso remotamente e por isso pode chegar a qualquer lugar. O tempo para que esteja disponível é o tempo de impressão das peças em impressoras 3D, somado ao da montagem. Depois disso, basta a conexão a uma fonte de oxigênio.

Segundo o site da iniciativa, a equipe decidiu produzir o equipamento por ser um projeto brasileiro, extremamente portátil e que não necessita de energia elétrica.

No projeto do novo ventilador houve especial atenção para garantir a eficiência na vedação de peças impressas em 3D e foram adicionados sistemas de filtros e válvulas de segurança para proteção dos pacientes.

O ventilador não servirá para os casos mais graves, mas poderá ser usado em hospitais e clínicas que não possuam respiradores mais sofisticados à disposição, em ambulatórios itinerantes, salas de exames de hospitais e em ambulâncias.

A expectativa dos organizadores do projeto é que a partir de 27 de abril os arquivos para impressão devem estar disponíveis no site do Breath4life.

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