Marcelo Viana

Diretor-geral do Instituto de Matemática Pura e Aplicada, ganhador do Prêmio Louis D., do Institut de France.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Marcelo Viana

Matemática é muito mais do que uma linguagem

São as ideias e os fatos que formam a matemática, não a linguagem, diz Artur Avila, ganhador da medalha Fields

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Galileu Galilei (1564–1642), um dos gigantes do Renascimento, escreveu que "A Matemática é a Linguagem em que Deus escreveu o Universo". E o físico britânico Stephen Hawkings (1942–2018) reforçou: "A matemática é a única linguagem que temos em comum com a natureza". Eu concordo com ambos, claro, mas acho importante colocar os pingos nos is: a matemática não é uma linguagem, ela é muito mais.

O meu colega Artur Avila, ganhador da medalha Fields em 2014, explica de modo muito feliz. Tal como a literatura brasileira usa um idioma —o português—, para expressar as vivências, os sentimentos e a visão de mundo de um povo, a matemática utiliza uma linguagem própria para expressar ideias e fatos sobre o Universo. São as ideias e os fatos que formam a matemática, não a linguagem, enfatiza o Artur.

Um ponto importante, que raramente é destacado como merece, é a incrível capacidade da matemática para nos fazer descobrir o mundo à nossa volta. Um exemplo espetacular é o trabalho do matemático e físico britânico Paul Dirac (1902–1984).

Lousa com equações
Lousa com equações - Flickr

Filho de um imigrante suíço francófono, Dirac nasceu e cresceu na cidade inglesa de Bristol. Severo e autoritário, o pai proibia os filhos de falar em casa outro idioma além do francês. Incapaz de se expressar bem nessa língua, Paul optava por ficar calado, e assim se tornou um adulto taciturno. Os seus colegas na Universidade de Cambridge brincavam que "um dirac" é uma unidade física que significa uma palavra por hora.

A física do seu tempo era dominada pelos dois grandes avanços do século 20: de um lado a mecânica quântica, voltada para o mundo infinitesimal, abaixo da escala atômica; do outro, as teorias da relatividade, restrita e geral, formuladas por Einstein. O problema é que esses dois avanços têm naturezas muito distintas e pareciam ser incompatíveis: um dos dois tinha que estar errado!

Dirac focou na busca pela compatibilidade entre a mecânica quântica e a relatividade restrita, que descreve as propriedades do espaço e do tempo na ausência de massa (compatibilizar a mecânica quântica com a relatividade geral é o santo graal da física dos nossos dias). Esse trabalho lhe rendeu o prêmio Nobel da física de 1933.

O mais incrível é que as fórmulas matemáticas de Dirac apontavam para um fato surpreendente, que ninguém tinha previsto: toda a partícula subatômica tem uma antipartícula, uma espécie de imagem no espelho, com a mesma massa e carga contrária! A posterior confirmação experimental dessa previsão constituiu, sem dúvida, uma espetacular vitória da matemática. Voltarei ao tema.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.