Marcos de Vasconcellos

Jornalista, assessor de investimentos e fundador do Monitor do Mercado

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Com estratégia faca no pescoço, Guedes se esforça para afastar investidores

Reforma proposta pelo ministro nasce sob tiroteio e coloca em risco o planejamento de quem investe em ações

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O que o ex-superministro da Economia (hoje ministro) Paulo Guedes chamou de “reforma tributária”nasce sob tiroteio e coloca em risco o planejamento de quem investe em ações no mercado brasileiro.

Claro que é mais fácil para qualquer oposição bater no governo em meio a uma CPI com acusações de corrupção na compra das tão sonhadas vacinas contra a Covid-19, mas é importante entender o que está em jogo, em relação ao seu dinheiro, neste projeto que especialistas em Direito Tributário se recusam a nomear como reforma, por não atacar a raiz do nosso complexo sistema.

Com a taxação dos dividendos, hoje isentos de imposto de renda, em 20%, o investidor perde 1/5 do valor que seria recebido na distribuição dos lucros da companhia, em função da sua participação acionária.

Homem branco fala e se gesticula
O ministro Paulo Guedes (Economia), que apresentou recentemente a segunda parte da reforma tributária - Pedro Ladeira - 20.mai.21/Folhapress

Os dividendos são a forma pela qual as empresas com ações negociadas em bolsa conseguem remunerar seus acionistas com alguma constância, dando a percepção de ganho constante e incentivando a participação no mercado.

Como já discutimos em outra coluna, a busca do investidor brasileiro por “dinheiro na mão”, ou pela chamada renda passiva, que é receber uma graninha sem ter necessariamente trabalhado por ela, faz com que corretoras recomendem carteiras de ações focadas no pagamento de dividendos.

Bancos e gestoras também oferecem uma miríade de fundos com o mesmo foco. Através deles, os investidores recebem frações dos dividendos pagos pelas diversas empresas cujas ações estão no portfólio do fundo.

Analistas já apontam que a tributação poderia levar investidores a vender suas ações e procurar outros ativos. E nós sabemos o que acontece quando muita gente vende ações: os preços caem e o Ibovespa, principal indicador do nosso mercado, também.

O tributarista Luiz Gustavo Bichara fez a conta: grosso modo, hoje o lucro das empresas é tributado a 34% (25% de IRPJ + 9% de CSLL). Com a prometida redução de 5 pontos percentuais do IRPJ e o acréscimo de 20% sobre os dividendos, a soma da tributação do lucro empresas e de seus acionistas no Brasil saltaria para 49% (20% de IRPJ + 9% de CSLL + 20% de IR sobre os dividendos).

Em resumo: metade do lucro vai virar imposto. A soma é só para facilitar o raciocínio, já que quem será tributado no caso da distribuição de dividendos serão os acionistas e não a empresa em si.

Para quem investe pensando em abocanhar fatias dos lucros, um péssimo negócio, já que as empresas que negociam suas ações na bolsa estarão fora da faixa de isenção da tributação de dividendos, que o governo quer ampliar para R$ 20 mil por mês.

Vale lembrar que o aumento de pessoas investindo na Bolsa de Valores foi exponencial nos últimos anos, atingindo a marca de 3,5 milhões de pessoas. Ainda um número baixo para a nossa superlativa população, mas que no início de 2020 não passava de 2 milhões. Um ano antes, não chegava a 1 milhão. E tem espaço para muito mais gente, desde que mudanças de regra no meio do jogo não tirem a atratividade do mercado.

A proposta de Guedes, a bem da verdade, facilita um pouco a vida de quem investe em renda fixa, como CDBs e títulos do Tesouro Direto, que vai pagar sempre 15% do rendimento em imposto de renda (e não mais usar a tabela progressiva, que começa em 22,5% e termina em 15%). Também fica melhor a vida dos day traders (que compram e vendem ativos no mesmo dia), cujo IR sobre lucros vai de 20% para 15%.

No entanto, ao abocanhar quase metade dos lucros, o projeto deixa o mercado pouco competitivo. A pressão por mudanças na proposta tem sido tamanha que, de acordo com o noticiário, a equipe de Guedes já definiu como estratégia condicionar uma ampliação do Bolsa Família à aprovação da tributação de lucros e dividendos. Conhecida como “faca no pescoço”, a estratégia mostra a indisposição para discutir o teor da proposta.

Nesse “ou vai ou racha”, perde quem espera diálogo e transparência em vez de uma inútil queda de braço. A faca no pescoço só gera insegurança e afasta investidores de um mercado que tem hoje uma fila de empresas buscando fazer IPO (oferta inicial de ações) para captar investimentos, crescer e desenvolver nossa economia ainda tão dependente da exportação de commodities.

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