Marcos Lisboa

Economista, ex-presidente do Insper e ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda (2003-2005, governo Lula)

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Marcos Lisboa

República

História dos EUA ajuda a entender o nosso atraso institucional

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Em tempos em que o STF é fonte de incerteza jurídica e os Poderes perderam o pudor de fazer intervenções arbitrárias, talvez seja recomendável, enquanto dura a desordem, deixar na geladeira a comemoração do dia da Proclamação da República.

Reprodução da tela "Proclamação da República", de Benedito Calixto (1893) - Reprodução - www.senado.gov.br

Para entender o tamanho do nosso atraso institucional, vale resgatar uma história.

Em 1783, diplomatas negociavam, em Paris, o fim da guerra pela independência dos EUA. Havia reparações de lado a lado, mas os americanos não aceitavam concluir o acordo sem obter a região para além do rio Ohio.

Os ingleses aquiesceram, e a ex-colônia, ainda sem governo, tornou-se proprietária de terras que duplicavam a sua extensão territorial.

Pouco depois, representantes da Confederação dos Estados Americanos elaboravam a Constituição do novo país na Filadélfia, enquanto seu Congresso, em Nova York, enfrentava os conflitos decorrentes da independência.

A Confederação não tinha poder para cobrar tributos e pagar os títulos de dívida com que remunerara seus soldados durante a guerra. As terras obtidas no acordo de Paris vieram em boa hora.

A engenhosidade americana construiu uma solução surpreendente, que congregava revolucionários e oportunistas, incluindo membros do Congresso responsáveis pela sua aprovação.

Muitos colonos da Nova Inglaterra desejavam ocupar a região, que encantava pelos relatos sobre a generosidade das suas terras. Parte da área recebida seria vendida para uma empresa que comercializaria lotes para os colonos e aceitaria como pagamento títulos de dívida emitidos pela Confederação.

Durante semanas, representantes da empresa negociaram com o Congresso as regras no novo território. “O que valeriam as casas dos homens da Nova Inglaterra na ausência de um bom governo?”, dizia-se então, segundo conta David McCullough em seu livro “The Pioneers”.

Em 1787, o Congresso aprovou a Ordenança do Noroeste, atendendo a muitas condições consideradas essenciais pelos colonos para a construção de uma sociedade justa.

As regras previam liberdade religiosa, direito ao habeas corpus e ao julgamento com júri, proibição da intervenção em contratos livremente pactuados, a menos em caso de fraude, e apoio à educação, “que deve ser para sempre incentivada”.

Ficava também proibida a escravidão no novo território.

Alguns dos celebrados direitos individuais das emendas à Constituição americana copiam, quase literalmente, artigos da Ordenança.

Foi preciso, porém, uma guerra civil no século seguinte para que a escravidão fosse abolida no restante do país.

O desenvolvimento dos EUA é filho de longa, por vezes conflitada, construção das instituições (*), e não de canetadas.

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