Marcos Troyjo

Diplomata, economista e cientista social, é diretor do BRICLab da Universidade Columbia

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China e mundo pós-ocidental flertam com autocracia 

Tendo Pequim como referência, risco é de que o mundo fique mais parecido com o país

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Prato decorativo do líder chinês, Xi Jinping, é visto ao lado de estátua de Mao Tsé-tung, primeiro líder comunista do país
Prato decorativo do líder chinês, Xi Jinping, é visto ao lado de estátua de Mao Tsé-tung, primeiro líder comunista do país - Greg Baker/Reuters

Uma das principais características da fase de “desglobalização” que ganhou força em anos recentes é o que poderíamos chamar de “fim do fim da História”. 

Na conhecida formulação do cientista político Francis Fukuyama, que escrevia no alvorecer do pós-Guerra Fria que inaugurou período de “globalização profunda”, a economia de mercado e democracia representativa emergiam vitoriosas. 

A primeira se mostrava mais eficiente na alocação de recursos e geração de prosperidade se contrastada ao planejamento burocrático que funcionou no espaço de influência do comunismo soviético. A segunda, mais afeita a ideia de “accountability” que supostamente deve parametrizar a relação entre governantes e governados. 

Nesse quadro, vale ressaltar que se pode definir o que significa “Ocidente” de várias maneiras. A mais abrangente —e minha preferida é a que expressa o conceito com um fórmula matematicamente singela: Ocidente equivale a soma de economia de mercado e de democracia representativa. 

Se é assim, então, a visão de mundo “pós-ocidental” ganhou novo reforço no último domingo, quando o Partido Comunista Chinês anunciou sua decisão de não mais restringir o teto de permanência de um indivíduo na condição de presidente do país. 

Isso permite a Xi Jinping, ao contrario de seus antecessores nas últimas quatro décadas, evitar o limite de dois mandatos de cinco anos de duração no cargo mais importante da China. 

A medida pode ser considerada pós-ocidental de diferentes ângulos. Ainda que mediante mecanismo políticos distintos, a China junta-se a um grupo de países que possibilitam a consolidação de autocracias. Vêm à mente os casos de Vladimir Putin na Rússia, Bashar al-Assad na Síria, Recep Tayyip Erdogan da Turquia ou Nursultan Nazarbayev no Cazaquistão

Todos esses países têm em comum a noção de que a democracia ocidental é crescentemente disfuncional e confusa. Esse sentimento é particularmente presente na China, onde diferentes atores sociais —nos negócios ou nas forças armadas, na política ou na academia— parecem abominar o que consideram a ineficiência caótica da democracia. 

Na China, a recente decisão parece tão mais acertada num contexto global de marcada ascensão do país —política e militar, é claro, mas sobretudo econômica. Arremetida que permite a China ocupar espaço cada vez mais central no desenho de uma família de instituições e projetos que não tem que ver com a ordem estabelecida no pós-Segunda Guerra Mundial, da qual os EUA foram os grandes arquitetos.

O argumento agora é de que Xi  Jinping precisa de ainda mais poder e estabilidade para continuar a promover reformas. Há algum tempo observadores ocidentais otimistas acreditavam que isso significaria liberalização política no país —e de que a “a China ficaria mais parecida com o mundo”. 

Bem ao contrário, são inúmeros os países em desenvolvimento que admiram, emulam —ou gostariam de emular a oligarquia chinesa. E mesmo no Ocidente não são inaudíveis as vozes que bradam por menos oxigênio democrático e pela contestação do que se pode chamar de “sociedade aberta”.

 Nessa etapa pós-ocidental das relações internacionais, a tentação autocrática é grande. Tendo o que acontece em Pequim como referência, o risco é de que “o mundo fique mais parecido com a China”.

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