Maria Hermínia Tavares

Professora titular aposentada de ciência política da USP e pesquisadora do Cebrap.

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Maria Hermínia Tavares

Pior que uma jogada suja

O país não está diante de uma disputa eleitoral como qualquer das anteriores

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Recentemente, o colunista Fareed Zakaria, do Washington Post, pediu a Henry Kissinger que comparasse o arrombamento da sede do Partido Democrata, no conjunto de escritórios Watergate, à invasão do Capitólio. O primeiro evento, em 17 de junho de 1972, foi tramado por íntimos do então presidente republicano Richard Nixon, em busca da reeleição (conseguiu o que queria, mas teve de renunciar mais adiante). O segundo, em janeiro de 2021, consistiu na invasão do Congresso por hordas trumpistas para impedir a ratificação da vitória do democrata John Biden nas urnas.

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O presidente Jair Bolsonaro durante encontro com chefes de missão diplomática - Clauber Cleber Caetano - 18.jul.22/PR/Divulgação

Kissinger argumentou que, no passado, tratou-se de uma jogada suja numa disputa eleitoral entre dois partidos que apoiavam o sistema democrático. Quase meio século depois, emendou, o que o republicano Trump queria era destruí-lo.

Kissinger, 99 anos, não é bem um observador isento. Foi secretário de Estado de Nixon e seu admirador confesso. Mas a diferença que estabelece entre os dois episódios faz sentido nos Estados Unidos —e se aplica perfeitamente ao Brasil.

O país não está diante de uma disputa eleitoral como qualquer das oito outras, desde 1989. Desta vez, o candidato à reeleição, como o seu inspirador americano, não está jogando dentro das quatro linhas da Constituição, ao contrário do que apregoa.

Na segunda-feira, 18/7, reiterou para uma plateia de diplomatas estrangeiros, em voz pausada, o que vem berrando sem cessar: não aceita as regras eleitorais vigentes, nem as autoridades a quem a Carta incumbe garantir que sejam cumpridas à risca.

Semear a suspeita em relação às urnas eletrônicas e à presidência do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) é pretexto para que possa contestar resultados da votação que tendem a lhe ser desfavoráveis. Ou, antes disso, para incentivar os seus seguidores a criar tumultos capazes de impedir o próprio pleito.
Essa nem é a única forma de atropelar as regras democráticas. Na verdade, o governo já o fez ao patrocinar a aprovação do Projeto de Emenda Constitucional 1/2020, a chamada PEC Kamikaze. O que o Congresso votou foi um pacote de benefícios sociais —que expiram em dezembro!

Por motivos óbvios, a lei que regula a reeleição proíbe os governantes de distribuir benesses em ano eleitoral. Para contornar a restrição, os políticos aprovaram um estado de emergência totalmente descabido que abre perigoso precedente a outras manobras antidemocráticas. Desacreditar as instituições eleitorais ou passar a perna na lei em busca de votos são caminhos que Bolsonaro vai utilizando para seus fins, opostos aos que podem fortalecer a democracia.

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