“O perfeito é o desumano, porque o humano é imperfeito.” Esta frase de Fernando Pessoa diz mais do que vários tratados sobre a imperfeição inerente à condição humana. O STF (Supremo Tribunal Federal), a máxima instância judicial brasileira, é composto por seres humanos, mas sua ação tem sido benéfica para o Brasil em casos emblemáticos, como a decisão de 2006 de que as relações de consumo de natureza bancária ou financeira são protegidas, sim, pelo CDC (Código de Defesa do Consumidor), o que salvou esta legislação consumerista da irrelevância.
Se não abrangesse os bancos e financeiras, o CDC perderia parte expressiva de sua importância, e estaria condenado ao fracasso em médio prazo. Em 2008, em outra decisão memorável, a corte liberou as pesquisas com células-tronco, fundamentais ao desenvolvimento da medicina. Decidiu que elas não violavam o direito à vida.
Em abril do ano passado, referendou liminar do então ministro Marco Aurélio, que explicitava a competência de estados e municípios na adoção de medidas para conter a pandemia do coronavírus. Isso evitou que o negacionismo da Presidência da República inviabilizasse medidas indispensáveis ao combate à Covid-19, como distanciamento social, uso de máscaras e vacinação em massa.
Ainda há inúmeros temas que desafiarão esta máxima instância da Justiça nos próximos anos, e para os quais não há decisões simples, pois a tecnologia e a evolução dos costumes criam parâmetros de convivência e de ação.
Bioética, aborto, eutanásia, inteligência artificial e os algoritmos na vida dos cidadãos são alguns destes, sem contar os que ainda surgirão.
Não temos obrigação de concordar com todas as decisões do STF. Por exemplo, discordo da proibição da prisão após a condenação na segunda instância. Mas discordar não significa atacar, desrespeitar nem desconhecer a importância constitucional do Supremo Tribunal Federal. Muito menos transformar o Dia da Pátria em um referendo tosco sobre ministros desta corte, simplesmente porque suas decisões incomodam os poderosos de plantão.
O caminho para os descontentes é a lei. Trabalhar para aperfeiçoá-las, ajustá-las e modificá-las, se obtiverem consenso ou maioria para as suas propostas. Tentar derrubá-las pela violência, pressão indevida e ameaças envergonha o Brasil em âmbito mundial, transformando-nos em uma republiqueta sujeita aos humores autoritários de grupos ou pessoas.
Com acertos e erros, o foco deve ser sempre a cidadania.
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