No campeonato europeu de handebol de praia, em julho, a seleção feminina da Noruega se recusou a competir de biquíni.
As atletas achavam que o uniforme as deixava expostas, já que elas ficam o tempo inteiro correndo e saltando. Jogaram de shorts e foram multadas em R$ 9,5 mil por usar uma "roupa imprópria". Depois de ser acusada de sexismo, recentemente a Federação Internacional de Handebol mudou as regras.
Agora, o código diz que atletas podem usar tops compridos e shorts "curtos e justos." Não é totalmente igualitário, já que o termo "ajustado ao corpo" não está na regra dos homens, que competem de camiseta e bermuda. Pelo menos, é um começo.
O episódio gerou desconforto. A federação norueguesa disse que ia lutar para que as jogadoras usassem o que achassem mais confortável. Ministros do país, da Dinamarca, da Finlândia, da Suécia e da Islândia pediram que a mudança refletisse a igualdade de gênero. Não foi o primeiro nem será o último caso.
Em alguns esportes, mulheres usam roupas mais reveladoras que as dos homens, como na ginástica artística, no atletismo e no vôlei de praia. Não há vantagem competitiva –se houvesse, certamente eles estariam de sunga. E isso não acontece mais nem na natação.
Nos Jogos Olímpicos de Londres, cansei de ler tabloides britânicos com manchetes apelativas sobre o vôlei de praia. O primeiro-ministro britânico Boris Johnson, na época prefeito de Londres, escreveu em um jornal que o esporte era atrativo porque "tinha mulheres seminuas brilhando como lontras molhadas".
Nas Olimpíadas de Tóquio houve avanço. A transmissão oficial acabou com takes fechados que mostram o bumbum das atletas enquanto elas combinam jogadas, ou qualquer imagem com detalhes ou partes do corpo que possam sexualizá-las. A equipe alemã feminina de ginástica artística usou, em vez de maiô, um uniforme mais longo até os tornozelos para, segundo elas, combater a sexualização no esporte e mostrar que qualquer mulher deveria decidir o que usar.
O vôlei de praia parece ter achado um equilíbrio. Há uma década, mudou as regras e permite uma variedade de uniformes no feminino. A imensa maioria ainda prefere usar biquíni por ser mais confortável, prático e fácil de tirar a areia do corpo. O ponto principal é: elas usam porque querem, não porque são obrigadas. A mudança deixou a modalidade mais inclusiva. Em 2016, o Egito competiu pela primeira vez em Olimpíadas e a dupla feminina escolheu jogar de calça, camisa de manga comprida e, uma delas, de hijab.
A campeã olímpica Sandra Pires me contou que quando ganhou o ouro em Atlanta-1996 foi orientada a subir no pódio de biquíni, quando a regra era usar agasalho, porque ouviu da mulher do então presidente da Federação Internacional que seria "mais sexy". Era a estreia do vôlei de praia e, enquanto atletas se preocupavam com performance, autoridades queriam holofotes. Era outra época em termos de discussões sobre igualdade. Sandra se diz feliz com a evolução do seu esporte hoje.
Nem toda mulher fica à vontade de biquíni ou com uma roupa curta e justa e isso pode fazer com que uma menina nem comece a praticar esportes. Fora os comentários sexistas ou, em um mundo onde mulheres são abusadas verbalmente e sexualmente, algo pior. O time norueguês trouxe de volta a discussão: se o esporte quer de fato ser igualitário, precisa pensar nessas questões. Incluir as atletas no processo e dar a elas a escolha.
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