Marina Izidro

É jornalista e vive em Londres. Cobriu seis Olimpíadas, Copa e Champions. Mestre e professora de jornalismo esportivo na St Mary’s University

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Marina Izidro

Precisamos manter nossa conexão com a natureza

Estar perto do mar e de áreas verdes nos deixa mais saudáveis e felizes

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Placas no calçadão avisam: "proibidos cachorros entre maio e setembro" e "churrascos, só depois das 18h". É praia, mas é na Inglaterra. Tem regras, e ai de quem não cumprir.

Passo pelos avisos e começo a caminhar em Bournemouth. Uma vontade enorme de sair da confusão de Londres e estar perto do mar me levou para esta cidade ao sul do país, onde me dei dois dias de folga durante a semana.

A relação dos ingleses com a praia é diferente da nossa. Eles usam biquíni e sunga, mas também vão de casaco e quando chove –o que acontece bastante, como o leitor deve imaginar. Em Bournemouth, a costa de 10 km de areias claras e mar calmo tem fileiras de "beach huts" a perder de vista –casinhas coloridas onde eles guardam mesas e cadeiras de praia. No caminho, uma aula de cidadania: quem quer cozinhar pode usar churrasqueiras elétricas gratuitas no calçadão. E não precisa levar brinquedos para os filhos –há uma caixa com vários, é só pegar e devolver depois.

A praia de Bournemouth, no sul da Inglaterra - Hannah MacKay - 26.jun.20/Reuters

Gaivotas estão de prontidão ao redor de meninas lanchando na areia; moradores passeiam com cachorros; um senhor coloca a touca e vai nadar no mar; mãe e filho passam com pranchas de surfe. À tarde, a ventania traz os kitesurfistas. Em vez de açaí, lanchonetes vendem "fish and chips", o peixe com batatas fritas.

Como sempre na Inglaterra, há respeito pelo passado. Uma placa lembra que o calçadão foi inaugurado pelo príncipe de Gales em 1927. Fui procurar: era Edward, tio da Rainha Elizabeth 2ª, que virou rei e abdicou para casar-se com a divorciada americana Wallis Simpson.

Quase hipnotizada pelo mar –sou carioca e vivo com saudade da praia–, paro em uma barraca de sorvete. O atendente, inglês, resmunga. Diz que a cidade é cara e para turistas. Pago a casquinha de baunilha que custa o equivalente a R$ 15. Está nublado, mas tento ser otimista. Digo que meu aplicativo no celular garante que vai fazer sol em 20 minutos. "Gosto de frio, neve e florestas. Acho que vou morar na Escócia", ele fala, desanimado.

"Nada abala meu alto astral", penso. Despeço-me e sigo. Mas esta não é uma propaganda gratuita da cidade –até porque praias do Brasil dão um banho nas inglesas. É sobre algo que nem sempre damos valor: a importância de estarmos em contato com a natureza. Cada um tem sua forma de conectar-se com ela: se, para mim, é por meio do mar e do cheiro de maresia, para você pode ser surfar, caminhar no parque, cuidar das plantas do jardim, andar na chuva, pisar na grama. Em Londres, conheço quem adora nadar em rios no inverno e me disse que entrar na água gelada todos os dias foi fundamental para a saúde mental na pandemia.

Estar ao ar livre melhora o bem-estar e o humor - Raymond Roig - 24.abr.19/AFP

Inúmeros estudos comprovam que estar ao ar livre melhora bem-estar, humor, sono, diminui o estresse, deixa-nos menos solitários, mais ativos. Em dois dias em Bournemouth, foram 30 km de caminhadas e corridas. Encarar os elementos –sol, vento, chuva– e ver que é a natureza que está no controle traz uma bela dose de vitamina D e de humildade.

Em grandes centros, seja Londres ou São Paulo, essa pausa parece ainda mais necessária. Sei que sou privilegiada por ter acesso a praias e parques e, por isso, penso na importância de termos políticos que tenham a preservação do meio ambiente e a conservação de espaços públicos entre suas prioridades.

Escrevo as últimas linhas já no trem de volta para a agitada Londres, torcendo para que o barulho do mar não saia tão cedo do meu pensamento. Recomendo.

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