Mauro Calliari

Administrador de empresas pela FGV, doutor em urbanismo pela FAU-USP e autor do livro 'Espaço Público e Urbanidade em São Paulo'

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Pequena retrospectiva 2023. O ano em que a cidade de São Paulo parece ter andado para trás

Plano Diretor sem diagnóstico, Zoneamento descontrolado, Câmara dos Vereadores em rota independente, aumento da violência no trânsito e vazios na gestão municipal ameaçam a urbanidade da vida cotidiana

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Plano Diretor

Era para ser apenas uma revisão do plano de 2014. Na Câmara, virou uma nova lei, que vê na verticalização a resposta para todos os problemas da cidade. Muito sobre construções e pouco sobre e a qualidade de vida, os espaços públicos, o transporte, a desigualdade, as premissas de crescimento, as consequências dos novos empreendimentos ou os efeitos do aquecimento global na cidade.

Zoneamento

O que se insinuava no Plano Diretor foi escancarado no Zoneamento, aprovado nos últimos dias do ano. Numa deferência explicita ao mercado imobiliário, sem estudos e sem tempo para discussão, a Câmara dos Vereadores jogou por terra o preceito do Plano Diretor de ligar a densidade ao transporte público.

O projeto votado aumentou as áreas de verticalização para os miolos das quadras, flexibilizou regras de moradia populares perto das nascentes, e, num ato inusitado, determinou que os estudos de patrimônio histórico sejam decididos na Câmara.

A Prefeitura tem até 15 de janeiro para decidir se vai vetar os itens que desconfiguram (mais ainda) a cidade.

2023, o ano em que a cidade de São Paulo parece ter andado para trás
2023, o ano em que a cidade de São Paulo parece ter andado para trás - Zanone Fraissat - 28.set.23/Folhapress

Aumento de mortes no trânsito

Antes de serem computados os dados de dezembro, 2023 já é o pior dos últimos oito anos, com mais de 880 mortes em acidentes e atropelamentos. A Prefeitura retirou a meta de redução de mortes no Plano de Metas, deixou de divulgar os números mensalmente e afrouxou a fiscalização.

O resultado pode ser visto no dia a dia: motocicletas passando impunemente nos sinais vermelhos, automóveis acelerando acima do limite, ciclovias interrompidas e pedestres amedrontados.

Calçadão do centro

A substituição das pedras portuguesas do centro foi anunciada em 2019. A obra finalmente começou e apenas o primeiro trecho deve ser inaugurado no próximo aniversário da cidade.

Tarifa Zero

Em dezembro, a Prefeitura anunciou que não cobraria tarifa de ônibus aos domingos. A Tarifa Zero é um tema complexo, que tem o potencial de ampliar o acesso à cidade de gente que sofre com o custo da tarifa. Do jeito que foi feito o anúncio, porém, faltou combinar com o Governo Estadual, que não só não vai aderir, como vai aumentar a tarifa. Não é impossível que haja migração do metrô para os ônibus, aumentando ainda mais os R$ 5 bilhões anuais que já são pagos em subsídios às empresas de ônibus.

Anhangabaú

O novo Anhangabaú completa seu segundo ano de vida sem estar completo e sem obrigar a concessionária a cumprir suas obrigações. Desde a inauguração, em 2021, o vale passou quase 100 dias fechado com tapumes para abrigar os shows privados. Os quiosques, que abrigariam m cafés e lojinhas nos desenhos do projeto original, continuam melancolicamente fechados no dia-a-dia.

Cracolândia

Em 2023, a Cracolândia passeou por vários lugares do Centro, se espalhou e chegou até a ameaçar os frequentadores da Estação da Luz. Sem programa consistente, a discussão vai do ‘interna compulsoriamente’ ao ‘não interna de jeito nenhum’, sem conseguir resolver o problema de segurança e sem equacionar o problema da doença.

Administração Estadual no Centro

O Governo Estadual anunciou a vinda da administração para a região dos Campos Elíseos. Seria ótimo trazer mais gente para centro e seria excelente desativar o anacrônico Palácio dos Bandeirantes. Para se viabilizar, a ideia ainda vai precisar de muito refinamento e coordenação com a Prefeitura.

Concessões de parques e áreas públicas

Tanto a cidade como o estado aceleraram as concessões de áreas públicas no ano passado e começaram a medir os primeiros resultados. Além de Ibirapuera, Villa Lobos, Trianon e alguns parques menores, até a ciclovia do Rio Pinheiros está concessionada. O modelo parece estar funcionando para zeladoria e segurança, mas deixa a desejar nos eventos privados, que fecham acesso a pedaços das áreas públicas e no excesso de propaganda em locais onde o verde deveria ser o protagonista.

Minhocão

No ano em que o Rio comemorou dez anos da demolição da Perimetral, em São Paulo, não foi discutida nenhuma alternativa de solução urbanística, nem projeto de parque e nem o projeto de demolição para o monstrengo que suga a vitalidade do centro.

Alguma notícia boa

Depois de tanta coisa difícil, procurei lembrar de coisas boas na frente do urbanismo durante esse ano. Há pelo menos dois bons programas municipais, que merecem destaque.

O primeiro é o programa de reurbanização de favelas, tocados pela Secretaria Executiva do Programa Mananciais, com ótimos projetos e execução firme e consistente, com raro cuidado na implantação. O segundo é um projeto-piloto chamado Reencontro, de acolhimento a pessoas em situação de rua com famílias, em moradias pequenas, mas dignas, que mereceria ser replicado no futuro.

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