Mônica Bergamo

Mônica Bergamo é jornalista e colunista.

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Presidente do São Paulo diz que Muricy foi convidado para trabalhar na seleção brasileira

Julio Casares diz que fez 85 testes de Covid-19 para acompanhar os jogos do tricolor: 'Achavam que eu era louco'

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Jogadores do SPFC celebram o título do Campeonato Paulista no estádio do Morumbi, em São Paulo Rubens Chiri - 23.mai.2021/São Paulo FC

Presidente do São Paulo Futebol Clube desde janeiro, Julio Casares diz que, quando revelou a dez amigos que concorreria à presidência da agremiação, “oito achavam que eu estava louco e dois tinham certeza”. Com dívida de R$ 580 milhões, queda de receitas, maratonas de jogos que exigem testes de Covid-19 a cada 48 horas (Casares já fez 85), o tricolor arrematou o título de campeão paulista na semana passada —o que fez um torcedor se ajoelhar e lhe agradecer. Casares diz que multiplicou seus “cabelos brancos”, que a vacinação pode reabrir os estádios às torcidas “com cuidados” —e que um novo ciclo está começando para o clube.

A VITÓRIA

Assumimos o São Paulo com muitas dívidas. Estou trabalhando 15 horas por dia. Mas a gente não imaginava que já fosse chegar em um resultado tão bom como a conquista do título.

E têm acontecido coisas inusitadas. Eu sempre fui um cara de televisão [diretor do SBT e da TV Record], e era um pouco conhecido no marketing do São Paulo [que já dirigiu].

Mas agora eu vou a restaurante, o torcedor me abraça. Outro dia uma pessoa se ajoelhou! Eu falei ‘meu Deus, para com isso!’ [risos]. Dei um abraço nele.

São 20 milhões de torcedores que estavam há muito tempo sem vencer. Não ganhávamos um campeonato paulista desde 2005. Há cinco anos o São Paulo não ia para as oitavas de finais da Libertadores. E desde 2012 não ganhava nada. Tinha criança que nunca viu o São Paulo ser campeão.

O torcedor estava num processo de autodestruição. As crianças não queriam mais torcer. Eu pegava depoimento de pais e de avôs: “Julio, estou perdendo o meu filho para o Corinthians, para o Palmeiras”.
E graças a Deus, com essa vitória... Pode registrar: eu chorei várias vezes em campo, vi jogador chorando, o Muricy [Ramalho] chorando. Mas o que mais me emocionou foram os vídeos que recebi de criancinhas de três, quatro anos, oito anos, dez anos, gritando no tapete porque não podiam estar aqui no Morumbi. Uma nova geração que realmente pôs a camiseta [do time] e foi para a escola no dia seguinte.

Jogadores do São Paulo celebram o título com a taça do Campeonato Paulista no gramado do Morumbi
Jogadores do São Paulo celebram o título com a taça do Campeonato Paulista no gramado do Morumbi - Carla Carniel - 23.mai.2021/Reuters

Os pais agradecem pelos filhos, pelos sobrinhos, pelos afilhados. Eu recebo presentes. Todo dia chego aqui [no Morumbi] e tem um doce caseiro que me mandam, uma camisa, uma cadeira. Sim, uma cadeira! Os caras [torcedores] me acompanham nas redes sociais. “Você tá trabalhando muito. Tem que cuidar da postura”. Um deles disse: “Tenho uma cadeira ultrassônica. Fica para o São Paulo”. Fez um termo de doação para o clube. Eu apenas uso.

AS DERROTAS

Existe uma comunhão maior na derrota. Você pode ver que o São Paulo nunca caiu para a série B. Quando o time cai, todo mundo quer ajudar. Mas eu prefiro aumentar a comunhão na vitória. Porque nela você faz bons contratos, você valoriza.

O COFRE

Eu tinha uma vida [profissional] exitosa na televisão. Eu fiquei 13 anos no SBT e 17 na TV Record [como diretor nacional de publicidade]. Quando resolvi aceitar a candidatura [para a presidência do São Paulo], conversei com parentes, amigos. Eu já estava definido. Mas falei: “O que vocês acham?”. De dez pessoas, oito achavam que eu era louco. E dois tinham certeza de que eu era louco. Para sentar nessa cadeira...[risos]. Confesso que nos primeiros dias de janeiro falei: “Puxa vida, onde eu vim parar?”. Credor batendo na porta, pandemia, sem jogo, sem receita.

Nunca exercitei tanta oração. A fé, juro mesmo, foi uma coisa de louco. Meu pai foi um grande são-paulino que nos deixou em 1997. Minha mãe hoje tem 93 anos. Eu pedi a eles a proteção. Porque não é fácil o que nós enfrentamos e o que ainda estamos enfrentando. E aí vem o título. Estamos começando a virar a baixa.

Julio Casares posa no vestiário do São Paulo Futebol Clube - Rubens Chiri - 23.mai.2021/São Paulo FC

Quando cheguei aqui [em janeiro], tinha cara batendo na porta, era oficial de Justiça, era penhora, bloqueio. A nossa dívida era de R$ 580 milhões. Do total, R$ 70 milhões eram de curtíssimo prazo. Imagina sentar nessa cadeira [e pensar]: como é que eu pago?

E nós equacionamos. Algumas [pendências] já quitamos, outra parcelamos, tiramos do curtíssimo para o médio e o longo prazo. Desafogou. Montamos um time bom. Contratamos um técnico [Hernán Crespo] e uma comissão técnica excelentes. Estamos caminhando.

Eram seis dívidas de curto prazo que me preocupavam. Compramos o centroavante Pablo do Clube Atlético Mineiro por R$ 14 milhões na gestão anterior e não pagamos. Saldamos R$ 3 milhões e estamos próximos de liquidar a metade. Compramos o Volpi do mexicano Querétaro por R$ 10 milhões e não pagamos. Já saldamos. Vendemos o Cueva e tínhamos que repassar uma parcela para o time anterior dele, o Tigres, R$ 6 milhões. Tudo pago. Pagamos outros R$ 6 milhões de um acordo com o Orlando City pela exploração da imagem do Kaká. Nos próximos dias vamos pagar a metade que falta dos R$ 25 milhões que devíamos ao Dínamo pela transferência do Tchê Tchê. O clube foi à Fifa e quase sofremos sanções. Tiramos a espada da cabeça.

Como conseguimos? Com credibilidade. Montamos um comitê financeiro. Os bancos receberam um plano de ação e confiaram. Me concederam carência de 12, 13, 14 meses, com juros negociados para baixo, o que me dá fôlego para uma reestruturação. Estou pagando as dívidas e fazendo a lição de casa. Demos em garantia recebíveis futuros de contratos de pay per view, de direitos de transmissão.

Com a pandemia, de cara perdemos a bilheteria. Sem torcedor, não tenho consumo de bares e restaurantes, não tenho o sócio-torcedor, que agora vai voltar. Ficamos sem ativação de camarote e patrocinadores. Tudo parou. Perdemos R$ 132 milhões em 2020. Neste ano, já perdemos R$ 60 milhões. Despesas e custos evoluíram. Multipliquei meus cabelos brancos. Mas muito!

Mas estamos equilibrando. E o título paulista está ajudando muito. A LG voltou a estampar a nossa camisa na final com o Palmeiras. E a Amazon, em jogos transmitidos pelo SBT.

A PANDEMIA

Foi uma loucura. Eu já fiz 85 testes [de RT-PCR, que detecta o novo coronavírus]. O cotonete já passa direto no meu nariz. Não aguento mais [risos]. Eu tenho uma relação próxima com os jogadores. Eu viajo com o time. Então é praticamente um teste a cada 48 horas.

O presidente do SPFC realiza um dos 85 testes que já fez para a detecção do novo coronavírus -  Rubens Chiri/São Paulo FC

Se tem jogo no sábado, temos que fazer exame na quinta e o teste rápido no dia da partida. Na semana seguinte, tendo jogo na quarta, já preciso fazer novo exame na segunda, e de novo no dia da partida. Os jogadores só podem treinar com testes negativos.

O São Paulo teve até agora quatro jogadores com Covid-19, em um universo de 50 profissionais. Ganhamos até prêmio pelo monitoramento.

Quando tem viagem, fazemos exame com 72 horas de antecedência. No avião é todo mundo de máscara. Chega no país, no Uruguai, na Argentina, faz teste de novo. Espera mais uma hora no terminal pelo resultado. Vai para o hotel, fica confinado, totalmente preso. Só sai para ir ao jogo. Na entrada, tem que apresentar o crachá com o QR Code que diz que seu teste deu negativo.

É uma maratona que causa neura, estresse. O São Paulo graças a Deus tem praticamente dois times competitivos. Jogam alguns num dia, outros no outro. Porque é humanamente impossível jogar a cada 48 horas. O torcedor às vezes não entende. Mas não é apenas jogar. Tem essa maratona desgastante de viagens.

ESTÁDIO CHEIO

A saúde está em primeiro lugar. A gente não deve inverter as ordens. Eu não sou otimista com torcedor [no estádio] ainda neste ano. É um tema muito difícil. Porque tem que vacinar as pessoas.

Talvez pudéssemos começar a discutir a criação de um cadastro nacional de vacinados para que essas pessoas possam vir ao estádio, com 20% da capacidade, máscara e distanciamento, com QR Code para comprovar a vacinação.

Acho que podemos discutir na próxima pauta, agora, em junho [com a CBF]. Não para agora. Mas talvez para agosto, setembro, quando tivermos mais vacinados no Brasil.

MURICY NA CBF

O presidente da CBF, Rogério Caboclo, realmente convidou o Muricy [Ramalho] para trabalhar na seleção. Eu falei que não gostaria de abrir mão dele, que é um profissional sério, um patrimônio do São Paulo. E o Muricy não desejou largar esse projeto.

Agi como um mandatário representando 20 milhões de torcedores. É claro que eu fico lisonjeado porque fomos atrás dos melhores. E os melhores estão aqui.

A BASE

O meu sonho é que o jogador fique aqui pelo menos duas ou três temporadas, deixe um legado esportivo e depois o financeiro. O nosso olhar para a base é esse.

O Rodrigo Nestor estava sem contrato, íamos perdê-lo. Tivemos muitas reuniões com ele, renovamos. Atualizamos a questão salarial do Luan. A partir do momento em que são campeões, ganham mais temporadas, estão aptos para sair e ganhar a realização profissional. Se no ano que vem minha situação econômica estiver melhor, posso segurar um jogador quatro anos em vez de dois.

Queremos transformar o círculo vicioso em virtuoso. Estamos melhorando. Quando chegamos aqui, estávamos vendendo o café da manhã e o almoço para pagar o jantar. Agora começamos a vender só o café da manhã.

Jogadores do SPFC celebram o título do Campeonato Paulista no estádio do Morumbi, em São Paulo - Rubens Chiri - 23.mai.2021/São Paulo FC

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