Mônica Bergamo

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Descrição de chapéu Folhajus

Grupo de advogados questiona OAB-PR por criticar decisão de Toffoli sobre a Lava Jato

Entidade emitiu nota se dizendo surpresa com a postura do ministro e com a suposta ausência de explicações

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Um grupo de 30 advogados paranaenses cobrou explicações da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) do Paraná por se manifestar contra uma decisão do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Dias Toffoli que anulou provas obtidas pela Operação Lava Jato.

Na semana passada, o magistrado determinou que integrantes da força-tarefa sejam investigados por causa dos métodos adotados para firmar um acordo de leniência com a Odebrecht e afirmou que a operação foi o "ovo da serpente dos ataques à democracia e às instituições".

O ministro Dias Toffoli durante sessão plenária da 1ª turma do STF, em Brasília - Carlos Moura - 30.nov.2021/SCO/STF

A decisão não foi bem recebida pela OAB-PR, que emitiu uma nota na quarta-feira (13) se dizendo surpresa com a postura de Toffoli e com a suposta ausência de explicações técnicas para "certos pontos".

Para a entidade, o ministro ignorou o fato de que o acordo com a empreiteira foi realizado dentro do devido processo legal e homologado em todas as instâncias, inclusive pelo próprio STF.

A OAB-PR ainda sugere que, "ao reconhecer erros e abusos praticados" pela força-tarefa, a decisão acaba passando "uma borracha hermenêutica sobre a corrupção" revelada pela Lava Jato.

"Chama a atenção que ao longo das 134 páginas no voto não há, por outro lado, nenhuma linha a respeito das consequências jurídicas da decisão, nem sobre os efeitos práticos relacionados aos recursos públicos desviados criminosamente, já recuperados ou a serem recuperados", afirmou a seccional.

A manifestação causou espécie entre advogados integrantes do movimento Algo Novo, que decidiram questionar a entidade sobre suas motivações. Para o grupo, o fato de a nota pública ter sido assinada com o nome "OAB-PR" estendeu a sua autoria a toda a advocacia paranaense.

"Questiona-se por quais motivos essa decisão, especificamente, levou a OAB-PR a manifestar seu inconformismo, ou, ainda, quais são os interesses que devem ser atingidos para que a OAB-PR resolva se insurgir contra uma decisão, colegiada ou monocrática, proferida pelo STF", afirmam os 30 signatários.

"O que se quer saber é quais são os critérios que orientam a decisão da OAB-PR de se manifestar, seja sobre decisões judiciais, seja sobre outros temas, sem consultar a classe das advogadas e advogados", dizem ainda.

O movimento questiona se por acaso a entidade paranaense desejaria que fossem preservadas "provas imprestáveis e atos inválidos", uma vez que contesta a decisão de Toffoli, e pergunta por que a OAB-PR adota tal postura ao falar de uma operação "que tanto mal produziu para a advocacia".

Veja, abaixo, a íntegra da nota elaborada por advogados do movimento Algo Novo:

"O Movimento Algo Novo, formado por centenas de advogadas e advogados paranaenses, comprometido com a defesa da Constituição, da ordem jurídica, do Estado democrático de Direito, dos direitos humanos, da justiça social, com a boa aplicação das leis, com rápida administração da Justiça e com o aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas (artigo 44, inciso I, da Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994 – Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil), comparece perante Vossa Senhoria para pedir esclarecimentos sobre a publicação 'Manifestação', veiculada no site da OAB/PR, na data de 13 de setembro de 2023.

Em apertada síntese, a publicação manifesta irresignação contra a decisão proferida pelo Ministro José Antônio Dias Toffoli, na Reclamação 43.007. Convém destacar que o texto se inicia com as palavras 'Como dirigentes da Ordem' – o que poderia levar a crer se tratar de uma manifestação exclusiva dos membros da atual direção da Seccional, mas termina assinado como 'OAB Paraná', o que acaba por estender a autoria da manifestação a toda a advocacia paranaense.

Esclareça-se, em primeiro lugar, que não se está a questionar a possibilidade de manifestação contra decisão judicial, notadamente do Supremo Tribunal Federal: nada é mais inapropriado do que o velho adágio, segundo o qual 'decisão judicial não se discute, cumpre-se'. Decisões judiciais devem, sem sombra de dúvida, ser objeto de discussão, somente através do que poderão ser aperfeiçoadas.

Ocorre, no entanto, que não é corriqueira a manifestação da OAB/PR contra decisões da Suprema Corte. Em rápida procura, consultando-se a ferramenta de busca disponível no site da seccional, foi possível obter 42 páginas de resultados (25 para a palavra 'manifestação' e 17 para a expressão 'nota de'), mas nenhuma delas semelhante a esta ora questionada.

Há, tão somente, três notícias, reportando posicionamentos contrários a decisões ou atos do STF: A defesa da democracia se faz dentro dos limites do Estado de Direito: Conselho aprova parecer da Comissão de Estudos Constitucionais que analisa inquéritos no STF (de 10 de fevereiro de 2023), OAB emite nota de repúdio a presidente do STF, que expulsou advogado (de 12 de junho de 2014) e Ophir: STF perdeu bonde da história ao garantir a anistia para os torturadores (de 30 de abril de 2010).

Não houve, por exemplo, nenhuma manifestação sobre a decisão proferida na ADI 5953, acerca das regras de impedimento contidas no artigo 144, do Código de Processo Civil, ou sobre a oscilação do entendimento quanto à execução de penas privativas de liberdade antes do trânsito em julgado, ou sobre a teratológica discussão acerca do marco temporal - que ocorre em flagrante contrariedade à literalidade do texto constitucional. E, se voltarmos no tempo, mesmo a decisão proferida na ADPF 153, proposta pela própria OAB, em relação à chamada 'lei da anistia', não foi objeto de insurgência da OAB/PR.

Convém destacar, ainda, três aspectos que chamam a atenção, no texto publicado pela seccional. O primeiro é a afirmação da 'tardia' identificação da "imprestabilidade das provas" e da "invalidade dos atos" – o que nos faz questionar se a OAB/PR desejaria a preservação de provas imprestáveis e atos inválidos. O segundo é a preocupação com as consequências da decisão, nos fazendo questionar se, em outros casos, as consequências seriam irrelevantes, como em decisões que afirmam a inconstitucionalidade de tributos ou que possibilitam (ou, possibilitaram) prisões indevidas. Por fim, é curioso que a OAB/PR se perfile ao lado de entidades representativas de outras profissões jurídicas e não de advogados, notadamente, em um tema relacionado à finada Operação Lava Jato, que tanto mal produziu para a advocacia.

Por fim, e ainda, se o problema é o fato de se tratar de uma decisão monocrática, segundo o próprio Portal do STF (aba 'Estatísticas'), neste ano, até a data de hoje (13 de setembro), o STF proferiu 71.402 decisões, sendo que 59.502 delas (83%) são monocráticas. Dentre as decisões monocráticas, e em sede de reclamação constitucional, diversas mitigaram competências da justiça do trabalho —nenhuma delas enseja preocupação da OAB/PR?

Diante de tais considerações, questiona-se por quais motivos essa decisão, especificamente, levou a OAB/PR a manifestar seu inconformismo, ou, ainda, quais são os interesses que devem ser atingidos para que a OAB/PR resolva se insurgir contra uma decisão, colegiada ou monocrática, proferida pelo STF.

Em tempos em que proliferam instrumentos de tecnologia de informação, que possibilitariam consultas a advogadas e advogados paranaenses, o que se quer saber é quais são os critérios que orientam a decisão da OAB/PR de se manifestar, seja sobre decisões judiciais, seja sobre outros temas, sem consultar a classe das advogadas e advogados."

com BIANKA VIEIRA, KARINA MATIAS e MANOELLA SMITH

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