Nelson Barbosa

Professor da FGV e da UnB, ex-ministro da Fazenda e do Planejamento (2015-2016). É doutor em economia pela New School for Social Research.

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Além de ruim para o emprego, mais arrocho fiscal seria ruim para o próprio reequilíbrio fiscal

Provavelmente teremos novo estímulo fiscal no restante de 2021 por dois motivos: a economia precisa e o governo entrou em modo reeleição

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O crescimento do PIB nominal, puxado pelo aumento de preços e produção de commodities, aliviou substancialmente o cenário fiscal de 2021.

Segundo os números divulgados pelo IBGE, o valor dos bens e serviços produzidos no país subiu 11% no primeiro trimestre, em relação ao mesmo período de 2020. Como o PIB nominal é o denominador da relação dívida-PIB, isso significa que o endividamento público está bem menor do que o previsto.

Quanto menor? Gilberto Borça Jr e eu estimamos que o valor do PIB divulgado pelo IBGE tenha reduzido a relação dívida líquida/PIB do setor público para menos de 60% em abril. Com isso, estaremos praticamente no mesmo patamar do fim do governo Fernando Henrique.

Dado que vários colegas dizem que o Brasil não estava quebrado naquela época, presumo que também não estejamos agora, sobretudo porque agora temos elevadas reservas internacionais e nenhum empréstimo no FMI (a herança bendita dos governos do PT).

Voltando ao cenário interno, a dinâmica de nossa dívida pública depende de crescimento, juro, resultado primário e evolução da taxa de câmbio.

No ano passado, houve colapso do PIB nominal e aumento do déficit primário para combater a recessão. As duais coisas elevaram substancialmente a razão dívida líquida/PIB. O aumento só não foi maior porque também houve queda de juro e ganho patrimonial da valorização das reservas internacionais.

Neste ano, tudo indica grande aumento do PIB nominal e redução do déficit primário. Mesmo com elevação de juro e perda patrimonial devido à apreciação do real, a relação dívida líquida/PIB tende a ficar estável ou até cair em 2021. Tudo depende do crescimento e da política fiscal no restante do ano.

O cenário fiscal é não intuitivo. Se o governo continuar com o arrocho do primeiro trimestre, o resultado primário será maior, mas o crescimento do PIB será menor. Se o governo atenuar o arrocho, o resultado primário será menor, mas o crescimento do PIB será maior. Qual é o efeito líquido sobre endividamento público em cada cenário? Depende de juro e câmbio.

Devido à melhora momentânea dos indicadores de dívida, o governo tem espaço fiscal para estímulo adicional à economia sem pressionar juro e câmbio. Apesar do discurso fiscalista, tudo indica que Guedes já percebeu isso, vide o reforço no auxílio a pequenas empresas e sinalização de outra prorrogação do auxílio emergencial.

Porém, há sempre risco de o terraplanismo prevalecer e mergulharmos em consolidação fiscal mais rápida. Se isso ocorrer, o PIB tenderá a desacelerar no restante do ano, à medida que o efeito positivo da acumulação de estoques no primeiro trimestre se dissipar.

Se voltarmos à estagnação do período “Temeraro” (2017-19), a incerteza fiscal tenderá a subir, puxando juro e câmbio para cima. Em outras palavras, além de ruim para renda e emprego, mais arrocho fiscal é ruim para o próprio reequilíbrio fiscal.

Por enquanto, a situação está indefinida. O governo fala de arrocho, mas adota flexibilização. Exemplo: a expectativa de gasto não recorrente contra a Covid, aquele que nossa equipe de ideologia econômica disse que ocorreria somente em 2020, está na casa de R$ 120 bilhões para 2021.

Provavelmente teremos novo estímulo fiscal no restante de 2021 por dois motivos: a economia precisa e o governo entrou em modo reeleição. Como compatibilizar isso com o discurso fiscalista? Recorrentemente adotando medidas não recorrentes (sic) para não reconhecer que o discurso fiscal está equivocado e precisamos de nova regra fiscal. Não é ideal, mas é o que temos.

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