Nosso estranho amor

Paixões, desencontros, estabilidade e loucuras segundo Anna Virginia Balloussier, Pedro Mairal, Milly Lacombe e Chico Felitti. Uma pausa nas notícias pra gente lembrar tudo aquilo que também interessa demais.

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Nosso estranho amor

Não seja real

Vamos manter os poemas que você me manda na madrugada, que gosto de imaginar que foram escritos por mãos quentinhas e pouco marcadas pela idade

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Desculpe avisar assim tão em cima da hora. Se você ainda estiver em casa, não saia! Depois te explico o motivo, agora só preciso correr pra resolver. Se já estiver aqui na porta, desculpe, preciso desmarcar mesmo assim. Falamos outra hora.

Oi. Recebi seu email e fiquei lendo em voz alta algumas vezes. Li umas sete vezes… não vai rir de mim! Me deu saudade e fui ver suas fotos. Ouvi seus áudios. Lembrei da banda que você me indicou e fiquei dançando sozinho pela casa. Queria dançar com você. Pode hoje?

Sei que na segunda eu estava ansioso, e não era mentira. Sei que te mandei 67 mensagens falando “chega logo quinta-feira!”. Não era mentira. Mas você notou que na terça eu já estava um pouco irritado?

Recebi seu email e fiquei lendo em voz alta algumas vezes. Me deu saudade e fui ver suas fotos
Recebi seu email e fiquei lendo em voz alta algumas vezes. Me deu saudade e fui ver suas fotos - afxhome - stock.adobe.com

De manhã o sol bate na mesa da cozinha e acho uma tristeza não te ver sentada ali. Te imagino atrasada, comendo mamão com cara de quem odeia mamão, mas acha que precisa aprender a gostar.

Sei que eu estava estranho na quinta, só que agora é sábado e isto não é mentira: olho para a poltrona ao lado da minha cama e visualizo seu vestido jogado ali. Ninguém senta na poltrona, ela só existe pra receber suas roupas lançadas pelo ar, seguidas das suas risadas. Pode hoje?

Acordei com gastrite. Acho que fiquei nervoso ontem no trabalho. Podemos remarcar o jantar para amanhã ou você voltou a fazer terapia às quartas? Desculpa, me entupi de remédios para o estômago e hoje me deu enxaqueca. Não aguento nenhuma luz ou movimento.

Desculpa, meus amigos apareceram aqui de repente —o que foi péssimo, porque os remédios da enxaqueca me deixaram numa ressaca terrível e eu não queria ver ninguém. Sexta é um dia em que eu fico meio deprimido, você sabe. Sábado combinei de ver minha irmã e já estou arrependido, porque ela fala demais e eu ando com labirintite, acho que medicamentosa. Domingo seria perfeito.

Faz um tempo já. Espero que você receba bem este email. Minha vontade é voltar no tempo, para aquele domingo em que combinamos de nos ver e eu dei um tremendo mau jeito nas costas. Tenho acompanhado sua vida pelas redes. Gostei do cabelo novo, fiquei feliz de saber que terminou o mestrado e confesso que achei seu filho mais parecido com o pai. Queria te ver. Até quando fica no Brasil?

Desculpe, vou precisar resolver umas coisas. Depois te explico. Escrevi uma dedicatória pra você num livro, mando pelo correio. Nela diz assim:
Promete? Vamos manter como está. Você casada e morando em outro país. Ocupada e falando outra língua. Vamos manter os poemas que você me manda na madrugada, que gosto de imaginar que foram escritos por mãos quentinhas e pouco marcadas pela idade. Gosto de pensar que quando meu dia está acabando e eu estou exausto, você deve estar pedindo o seu almoço. Na última foto dava pra ver suas mãos e eu tomei o cuidado de recortá-las. Fiquei com medo de que tudo acabasse. Nosso amor é pra sempre.

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