Oscar Vilhena Vieira

Professor da FGV Direito SP, mestre em direito pela Universidade Columbia (EUA) e doutor em ciência política pela USP. Autor de "Constituição e sua Reserva de Justiça" (Martins Fontes, 2023)

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Descrição de chapéu Folhajus

Os guardiões da floresta

Supremo estará dando uma enorme contribuição para a contenção do desmatamento se derrubar a tese do marco temporal

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A tese do marco temporal, criada e patrocinada por setores predatórios do meio ambiente, que cobiçam explorar as terras indígenas, nada mais é do que uma tentativa inconstitucional de restringir os direitos dos povos indígenas à própria sobrevivência.

A recente aprovação do PL 490, na Câmara dos Deputados, em nada muda a natureza inconstitucional da malfadada tese. Como já explicou o ministro Edson Fachin, em seu voto, os direitos originários dos povos indígenas compõem o rol das cláusulas pétreas da Constituição, não podendo ser abolidos, sequer por emenda constitucional. O movimento legislativo, portanto, é apenas uma estratégia para tentar constranger o Supremo, que reiniciará o julgamento do marco temporal na próxima semana.

Indígenas na cidade de Presidente Figueiredo, região metropolitana de Manaus; impactos do marco temporal são discutidos - Lalo de Almeida 1º.set.22/Folhapress

Se o Supremo derrubar a tese do marco temporal, como tudo indica, mais do que reparar as injustiças a que os indígenas têm sido historicamente submetidos, consolidando o que lhes é de direito, o STF estará dando uma enorme contribuição para a contenção do desmatamento, manutenção do regime de chuvas— essencial para agricultura brasileira—, para a redução dos conflitos fundiários, o aumento de investimentos em economia verde, assim como para a desaceleração das mudanças climáticas.

As terras indígenas brasileiras, que se concentram sobretudo na Amazônia, têm sido as principais responsáveis pela preservação de nossas florestas. Menos de 2% do desmatamento histórico na Amazônia ocorre dentro de terras indígenas. Ao guardarem as florestas, os povos indígenas geram uma série de benefícios econômicos e socioambientais para o resto do Brasil e para todo o planeta, como a produção e circulação de água doce, o resfriamento do clima, a renovação do ar, a proteção do solo, além da preservação da biodiversidade, como explica o cientista Carlos Nobre, em recente relatório.

A floresta preservada pelos indígenas produz vapor, que se movimenta por toda atmosfera. De acordo com pesquisa do Inpe, apenas uma árvore amazônica chega a transpirar mil litros em um só dia. Como capturado pelas lentes de Sebastião Salgado, esse vapor forma verdadeiros "rios voadores", que permitem o florescimento duma pungente agricultura, não apenas no Centro Oeste brasileiro, mas em toda a região sul do continente. Isso sem falar na grande eficiência dessas florestas para estocar carbono, a um custo imensamente menor que outras formas de mitigação das emissões de gases de efeito estufa. O Brasil pode lucrar muito com sua floresta de pé.

A promoção da tese do marco temporal tem fomentado, por sua vez, insegurança fundiária, ao incentivando a grilagem, o desmatamento, o garimpo ilegal, fazendo da Amazônia uma terra sem lei.

O julgamento do marco temporal será uma excelente oportunidade para velhos e novos "garantistas" demonstrarem o seu verdadeiro compromisso com os direitos fundamentais. Ao declarar a inconstitucionalidade do marco temporal, o STF estará não apenas cumprindo sua missão precípua de proteger os direitos fundamentais de uma minoria vulnerável, mas também contribuindo para o bem-estar de toda a população e para a própria sobrevivência das gerações futuras neste planeta.

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