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Julio Wiziack é editor do Painel S.A. e está na Folha desde 2007, cobrindo bastidores de economia e negócios. Foi repórter especial e venceu os prêmios Esso e Embratel, em 2012

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'Algumas empresas estão pagando a conta de toda a economia', diz associação de shoppings

Presidente da Abrasce sugere redução de imposto para compensar perdas pelos fechamentos

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São Paulo

As empresas de shopping centers têm pedido aos governos a criação de um programa de isenção ou desconto de impostos pelos próximos anos para compensar as perdas acumuladas na pandemia, porque não podem suportar toda a conta dos fechamentos enquanto outros setores ficaram livres para funcionar, segundo Glauco Humai, presidente da Abrasce (associação dos centros de compras).

No caso do IPTU, eles argumentam que não faz sentido cobrar de um proprietário de um imóvel que foi proibido de usá-lo. Humai diz que o grupo estuda a possibilidade de levar o assunto à Justiça, mas acredita que os governos vão compreender o pedido antes.

Glauco Humai, presidente da Abrasce
Glauco Humai, presidente da Abrasce - Divulgação

Doria recuou da flexibilização nas restrições do comércio. Como receberam isso? Entendemos a gravidade da situação e apoiamos, mas não acreditamos que não estender das 21h para as 22h impacte algo na saúde. Concentrar as pessoas em um tempo reduzido é pior. Pode ser uma medida simbólica para passar mensagem da preocupação, mas o comércio, mais uma vez, está sendo punido, enquanto outros continuam funcionando normalmente.

Vocês fizeram movimento forte contra a cobrança de imposto. Têm falado com os governos? O empresário não pode ficar sem suporte econômico. Estamos fazendo uma comparação das medidas de suporte às empresas em mais de 50 países. O Brasil está lá embaixo. As medidas do país para o trabalhador foram efetivas, com valor considerável, auxílio emergencial etc. Mas para as empresas o suporte foi quase zero, para o pequeno e o médio empresário. E foram obrigados a fechar.

Se não tem dinheiro para passar para as empresas, isente impostos. Vamos isentar ou dar desconto de 50% no ICMS das empresas que foram drasticamente afetadas pela pandemia pelos próximos dois, três anos? E o IPTU? Isso aconteceu em vários países.

Hoje, tem shoppings começando a fechar pela terceira vez. Ninguém resiste. São milhões de empregos perdidos. Estamos começando a discutir um possível ressarcimento. Só o setor de shoppings, entre lojistas e empreendedores, chega próximo a R$ 100 bilhões de perdas. Quem vai pagar? Não é justo, enquanto outros setores continuam ganhando, trabalhando, continuamos pagando essa conta.

Qual setor? Cada um tem a sua especificidade. O setor industrial não parou, nem o de construção. Não quero atacar nenhum, mas alguns continuaram trabalhando.

A conta não vai ficar difícil, porque também faltou auxílio para pessoas físicas nessa situação? Com planejamento, tudo é possível. Estamos sabendo desde novembro de Manaus, que os casos estavam aumentando. Demorou seis meses para fazer um novo BEm e um novo Pronampe. Quantas empresas ficaram pelo caminho? E o auxílio emergencial? Acabou, mesmo todo mundo sabendo que ele tinha que continuar. Levou meses para voltar.

Tem despesas orçamentárias que não são prioritárias. Sabemos que é inviável agora, que tem problemas fiscais, mas em 4, 10 anos, conseguimos recompor isso para as empresas que estão pagando a conta de toda a economia.

Vocês têm planos de ir à Justiça em algum momento pedir esse ressarcimento? Estamos estudando as possibilidades jurídicas sim, mas acreditamos que os governos vão entender a necessidade de recompor parte das perdas geradas pelos fechamentos.

No caso do IPTU, qual é raciocínio de vocês? Se não podemos usar ou se o imóvel tem o uso restrito, como devemos pagar o IPTU? Isso é para o que já ficou para trás. Mas a dedução de impostos pode ser utilizada para o futuro, para ajudar a recuperar as perdas. De acordo com a perda de faturamento dos lojistas, aplica-se um desconto de IPTU, ICMS, ISS, por exemplo, por alguns meses ou anos.

Na relação do lojista com o shopping, como ficou a discussão de trocar o IGP-M, que ficou pesado para ele, pelo IPCA no aluguel? É uma medida de desespero de alguém bem intencionado que quer ajudar os lojistas mas traz consequência para a economia, de não respeito a contratos, de insegurança jurídica. Ninguém vai querer investir no Brasil. Você vai construir um shopping mas não sabe se vai ter daqui a dois anos as mesmas condições regulatórias. Hoje, o IGP-M está mais alto do que o IPCA, mas estudos mostram que daqui a dois anos vai ser o inverso.

Os lojistas reclamaram muito de falta de negociação. Não é generalizado. São grupos específicos, pessoas que têm problema muito anterior à pandemia e foi agravado. Essas lojas, talvez por má gestão, problema de força maior, não sei, não estavam performando bem, e jogando a culpa no outro. Cobravam do shopping a solução.

O ajuste é contrato a contrato. Por exemplo, se vou dar um desconto de aluguel, teve muito lojista que faturou muito na crise, ou porque foi um setor considerado essencial ou porque explodiu de venda quando reabriu ou fez boa gestão do negócio e complementou com online, delivery, drive thru. Vou dar um desconto para ele? Não faz sentido. O que a gente defende é negociar caso a caso. Não é interesse do shopping perder lojista. É muito mais difícil ganhar lojista novo do que manter um bom lojista que já está lá.

E o aumento das ações de despejo? A lei do inquilinato é muito mais pró lojista do que pró shopping. O lojista só sai do shopping se ele quiser.

Mas se ele quiser fechar, precisa pagar multa para o shopping para sair? Depende do contrato de cada um. É como contrato de academia, assinatura de TV e revista, se você quer sair antes, tem que pagar multa rescisória. Depende do contrato. Antes de terminar o contrato, ele pode falar que quer permanecer e não tem como o shopping tirar, mesmo sendo alguém que não investe na vitrine, que não renova seu estoque, que não investe em funcionário, que não treina e não inova.

Claro que todo mundo passa dificuldade, o shopping sabe quem é o bom lojista e quem não é tão comprometido com o todo. Aí a aplicação do reajuste vai caso a caso. O shopping quer que o lojista ganhe dinheiro.

Uma realidade é a do dono de quiosque pequeno no shopping, mas tem lojista que é Banco do Brasil, Itaú, Claro, Zara, Apple, Microsoft, Samsung. Esses são pequenininhos? Não têm condições e um departamento jurídico para negociar um contrato, condições de pagar um reajuste? O shopping tem supermercado grande e pequeno, loja grande e pequena. São muitas realidades que não dá para envelopar em uma negociação única.

Se for um cara que sempre paga, investe, mas está passando por um momento difícil, o shopping vai ajudar. Agora, se é um que não investe, que sempre teve problema, vive reclamando, incitando, não pagando, o shopping vai fazer jogo duro. É da vida, é da negociação comercial. Dos contratos que venceram até o momento, o último índice que temos é que 98% já tinham sido negociados e encontrado um ponto de equilíbrio e só 2% ainda estavam em negociação.

Tem esse caso da recuperação judicial da TNG anunciado na semana passada. Não é o primeiro nem será o último na pandemia, mas é emblemático porque o dono, Tito Bessa Jr, é também o presidente da associação de lojistas de redes menores de shoppings e ele se manifestou muito sobre essa crise. Como vocês olham para uma potencial onda disso? Com preocupação? É claro. A gente não gosta que nenhum lojista passe por essas dificuldades. Conheço o Tito, tive várias reuniões com ele e a Ablos, que é a associação que ele ajudou a fundar. É um lojista tradicional, respeitado, todos conhecem e gostam muito. As negociações são feitas, algumas positivas, algumas negativas.

Recebemos com muita tristeza esse tipo de coisa e procuramos amparar o máximo possível a rede TNG, mas chegou um momento em que não foi mais possível para ele se suportar e teve de entrar com esse pedido. Espero que isso não seja alastrado para outras cadeias.


Glauco Humai
Assumiu a presidência da Abrasce em janeiro de 2015. É cientista político e analista internacional pela Universidade de Brasília, pós-graduado em gestão sustentável de empresas pela Harvard Business School e em gestão empresarial pela Fundação Dom Cabral

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