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Julio Wiziack é editor do Painel S.A. e está na Folha desde 2007, cobrindo bastidores de economia e negócios. Foi repórter especial e venceu os prêmios Esso e Embratel, em 2012

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Empresa interessada escreve voto usado por conselheira do Cade, que vira alvo de investigação

OUTRO LADO: Empresa nega ter escrito voto ou obtido acesso ao acordo entre Ultragaz e Supergasbras aprovado pelo Cade; conselheira diz que documento está nos autos

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Brasília

O Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) aprovou com restrições o consórcio entre Ultragaz e Supergasbras há quase vinte dias, mas o caso não acabou.

A relatora do processo, conselheira Lenisa Prado, virou alvo de uma denúncia feita pelo próprio órgão que integra por suspeitas de favorecimento a uma empresa concorrente, a Copagaz.

Mulher e homem estão sentados olhando para a plateia
Lenisa Prado, conselheira do Cade, durante audiência no Senado - Edilson Rodrigues - 24.set.2019/Agência Senado

A principal evidência é um documento escrito no Word e enviado pela conselheira para seus colegas de tribunal dias antes do julgamento.

Nele, Lenisa informa ter feito ajustes, com remédios (condicionantes) sugeridos ao acordo proposto por Ultragaz e Supergasbras para que, em vez de reprovada, a operação pudesse ser aprovada.

No entanto, ao abrir as propriedades do documento (registro do histórico das mudanças no arquivo), os demais conselheiros verificaram que ele havia sido escrito por um executivo da Copagaz.

O arquivo foi criado em 12 de agosto, às 18h57, e, na sequência, enviado para Lenisa Prado, que, ainda de acordo com os relatos, fez a última modificação às 19h14, antes de transmiti-lo.

Ou seja: ficou claro para os conselheiros que, em 17 minutos, a conselheira não teria como fazer análise técnica aprofundada e modificações minuciosas nas 12 páginas.

Além disso, o acordo era sigiloso e o acesso restrito somente aos conselheiros e às partes. A Copagaz não poderia ter acesso a ele para, a partir de seu conteúdo, redigir um documento com uma proposta de remédios.

Esse foi o principal motivo que levou ao pedido de abertura de investigação disciplinar contra a conselheira e ao envio dos autos para que o MPF (Ministério Público Federal) apure se houve desvio de finalidade em seu ato.

Lenisa Prado foi indicada pelo senador Flávio Bolsonaro e chegou ao conselho em outubro de 2019. Seu mandato se encerra neste ano.

Liderança em jogo

Líder do mercado de distribuição de gás de cozinha, a Copagaz sempre foi contrária ao negócio das concorrentes. Para ela, na verdade, tratava-se de uma fusão e, por isso, deveria ser impedida.

Ao Cade, Ultragaz e Supergasbras disseram que estavam se aliando em uma espécie de consórcio, prevendo compartilhamento de estruturas operacionais, como as de envasamento do gás de cozinha.

A pressão pelo veto à operação começou em março, pouco após a aprovação do consórcio, sem restrições, pela Superintendência-Geral (SG) do Cade.

A Copagaz apresentou um recurso contra a decisão da SG e ele foi aceito.

Diante da sinalização de que o voto da conselheira-relatora seria pela reprovação e que ela seria acompanhada por outros conselheiros, Ultragaz e Supergasbras apresentaram uma proposta de acordo, com alguns remédios, para sanar o que a Copagaz defendia ser uma excessiva concentração de mercado.

Outro lado

Por meio de sua assessoria, o Cade disse que não comentaria o caso porque eventuais processos envolvendo servidores tramitam sob sigilo.

A conselheira Lenisa Prado respondeu após a publicação desta reportagem. Ela negou ter havido compartilhamento das informações do acordo.

"Como todos os demais integrantes do conselho estavam cientes, sempre me manifestei contrariamente à operação", afirmou. "Por sugestão de alguns colegas, demos início às negociações. Após ser apresentada uma proposta, eu fiz algumas sugestões que, se acolhidas tivessem sido, eu votaria pela aprovação condicionada à celebração do ajuste."

Segundo a conselheira, como não houve acordo, ela votou pela reprovação.

"O documento que eu utilizei para servir de base para as minhas considerações foi um documento apresentado pela Copa, que está nos autos."

Via assessoria, a Copa Energia, dona da Copagaz, nega veementemente que qualquer um de seus executivos tenha tido acesso ou escrito qualquer trecho do voto da conselheira.

A empresa esclarece que é praxe a solicitação, por parte dos conselheiros do Cade, do envio de contribuições pelas partes para a discussão de potenciais restrições a atos de concentração.

"A Copa Energia reitera o seu compromisso absoluto e irrestrito com a ética e a integridade", disse em nota.

Com Diego Felix

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