Papo de Responsa

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Por que anseios da sociedade sobre meio ambiente não são respeitados por governantes?

Enquanto dados e pesquisas revelam que tema é importante para brasileiros, Executivo e Legislativo negligenciam o assunto

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Suzana Pádua

Doutora em desenvolvimento sustentável pela UnB, é presidente do IPÊ (Instituto de Pesquisas Ecológicas) e vencedora do Prêmio Empreendedor Social 2009

Henrique Bezerra

Co-fundador da Interface Advocacy Ambiental

Marina Naves

Co-fundadora da Interface Advocacy Ambiental

A relevância dada ao terceiro setor e a organizações da sociedade civil (OSCs) é uma consequência natural do amadurecimento das democracias. O setor desempenha papel estruturante de vigilância social e ambiental, complementando funções do Estado, onde serviços de interesse público podem ser insuficientes.

Este setor cresceu substancialmente nas últimas décadas. Em levantamento do IBGE de 2016, representava 14,7% das organizações geradoras de empregos formais no Brasil e, segundo o Mapa das Organizações da Sociedade Civil do Ipea, as OSCs arrecadaram R$ 13,7 bilhões em 2015.

O Instituto Ipê cria modelos inovadores de conservação da biodiversidade com benefícios socioeconômicos por meio de ciência, educação e negócios sustentáveis - Renato Stockler/Na Lata

A influência e atuação do setor na formulação de políticas públicas são conhecidas pelo termo advocacy, que também passou a significar incidência política.

Sendo um dos pilares de uma sociedade democrática, seria natural que a sociedade civil estivesse no centro dos debates públicos. Contudo, não é isso que ocorre.

Há uma defasagem entre a atuação dessas instituições e sua influência política. Poucos estudos trabalham esse assunto de maneira transversal e os dados estatísticos acabam sendo escassos. Daí a importância de se refletir sobre a participação das organizações da sociedade civil na elaboração e na implementação de políticas públicas brasileiras.

Embora o advocacy ainda não seja tão reconhecido e organizado no Brasil, alguns setores são exceções. A área da saúde, por exemplo, conta com uma bancada forte de apoiadores, sobretudo no Legislativo. No Executivo, tradicionalmente esta é a pasta com maior orçamento.

Contudo, outras áreas de grande relevância para a sociedade —educação, segurança pública e meio ambiente— têm sido negligenciadas ou menos priorizadas. São flagrantes as contradições entre a vontade da população e a atuação dos governantes.

Para entender o fenômeno, vamos analisar o tema do meio ambiente. A área ambiental sofreu grande desmonte e até mesmo incentivos para que se tornasse menos operante e eficiente nos últimos quatro anos. Entretanto, pesquisas de opinião demonstram que a sociedade brasileira prioriza a defesa do meio ambiente.

Uma pesquisa encomendada pelo Ipec, em 2021, revelou que 76% dos brasileiros acreditam que o aquecimento global está acontecendo, 75% creem que a evolução dos incêndios na Amazônia foi causada por fatores humanos e 45% dizem já ter votado em políticos em virtude de suas propostas ambientais.

Outro estudo encomendado pela Confederação Nacional da Indústria ao Instituto FSB de Pesquisa, em 2020, mostrou que 98% dos brasileiros se dizem preocupados com o meio ambiente —dentre eles, 77% afirmaram estar muito preocupados.

O estudo também aponta que 93% defendem que preservar a Amazônia é fundamental para a economia brasileira, 50% se dizem afetados por algum problema ambiental e 77% acreditam que o Brasil deveria destinar mais recursos para a conservação do meio ambiente.

Se dados e pesquisas de opinião revelam que este é um tema importante para a sociedade brasileira, é difícil compreender porque membros do governo, tanto do Executivo quanto do Legislativo, têm negligenciado o assunto nos últimos anos.

A pauta ambiental vem se tornando cada vez mais presente nas agendas de organismos internacionais e governos estrangeiros em todos os continentes. Enquanto isso, o Brasil caminha na contramão da lógica global.

O apoio governamental nessa área nem sempre é fácil. Isso porque grandes empresas ou grupos com fortes interesses econômicos em geral divergem daqueles que desejam proteger o meio ambiente. Tais grupos atuam influenciando governantes em suas escolhas e prioridades, indo, inclusive, contra a opinião pública que apoia iniciativas conservacionistas.

Essa tendência não é nova. Desde a publicação do estudo "O que o brasileiro pensa sobre ecologia", de 1993, essa discrepância entre vontade popular e ações governamentais se evidenciou. Entretanto, as organizações da sociedade civil que defendem a proteção da biodiversidade e outras questões ligadas à sustentabilidade têm se mostrado persistentes e obtido apoios diversos, muitas vezes de maneiras criativas.

Diante dessas reflexões, questionamentos se fazem necessários, especialmente em momentos eleitorais.

Por que os anseios da sociedade civil em relação ao meio ambiente não são respeitados pelos governantes? Existe uma desconexão entre os valores ambientais percebidos pela população e os motivos que direcionam as escolhas na hora do voto?

Essas reflexões trazem pistas importantes para o debate e perguntas surgem para além da análise da correlação entre interesses ambientais, voto e priorização das pautas de interesse público.

Quais forças políticas e grupos econômicos influenciam a tomada de decisão dos membros do governo e desrespeitam os anseios da população? Quem são os representantes desses interesses no governo e defendem a destruição do meio ambiente?

Quem são os defensores das causas ambientais? Quais caminhos podemos traçar para ampliar a atuação política das OSCs em defesa do meio ambiente no Brasil?

Apesar de importantes sobretudo no atual momento eleitoral, algumas dessas perguntas seguem sem respostas definitivas. Que venham escolhas conscientes e cuidadosas e que tragam novos ventos de esperança para nosso país, tão rico em natureza e com tanto a ser feito pela sua proteção.

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