Paul Krugman

Prêmio Nobel de Economia, colunista do jornal The New York Times.

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Energia solar e eólica não são mais coisas de hippie 

Trump e companhia estão tentando bloquear o avanço tecnológico e o preço dessa obstrução será alto

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Turbinas de energia eólica em alto-mar na Alemanha - Fabian Bimmer-26.ago.2013 / Reuters

Peter Thiel, investidor do Facebook e partidário de Donald Trump, é uma pessoa horrível, pelo que se diz. Mas criou uma frase clássica sobre as decepções da tecnologia moderna: "Queríamos carros voadores, mas o que recebemos foram 140 caracteres". Está bem, agora são 280, mas que diferença faz?

O ponto de sua tirada era que, embora não paremos de descobrir maneiras cada vez mais engenhosas de movimentar informações, continuamos a viver no mundo material, e nosso comando desse mundo material avançou muito menos do que a maioria das pessoas esperava algumas décadas atrás. Onde estão as tecnologias que transformarão a maneira pela qual lidamos com a realidade física?

Bem, existe uma área da tecnologia física --a energia renovável — em que realmente estamos vendo esse tipo de progresso, um progresso capaz de mudar o mundo e salvá-lo. Infelizmente, as pessoas que Thiel apoia estão tentando impedir que esse progresso aconteça.

Não muito tempo atrás, apelos por uma transição rumo à energia solar e eólica eram vistos por quase todo mundo como nada práticos, ou mesmo como coisa de hippie. Parte desse desprezo persiste; minha percepção é que muitos políticos e alguns empresários ainda veem a energia renovável como marginal, e ainda imaginam que homens de verdade queimam coisas, e que pessoas sérias concentram suas atenções nos bons e velhos combustíveis fósseis.

Mas a verdade é quase que o oposto, particularmente no que tange à geração de eletricidade. Aqueles que acreditam na primazia dos combustíveis fósseis, especialmente o carvão, vivem em um beco sem saída tecnológico. São eles, e não a esquerda, que podem ser definidos como luddistas modernos. E infelizmente, ainda podem causar muito estrago.

Quanto à tecnologia: até 2010, gerar eletricidade usando o sol ou o vento sempre custava mais caro do que fazê-lo usando combustíveis fósseis. Mas essa diferença já foi eliminada, e o processo está só no começo.

O uso generalizado da energia renovável continua a ser novidade, o que significa que, mesmo que não surjam grandes avanços tecnológicos, podemos antecipar novas reduções de custo à medida que os setores avançam em suas curvas de aprendizado --ou seja, encontram maneiras melhores e mais baratas de operar, à medida que acumulam experiência.

MOINHOS

Recentemente, David Roberts, da Vox.com, ofereceu um excelente exemplo: as turbinas eólicas. Moinhos de vento existem há mais de mil anos, e são usados para gerar eletricidade desde o final do século 19. Mas para tornar essas máquinas verdadeiramente eficientes, elas precisam ser muito grandes e muito altas --altas o suficiente para explorar os ventos mais firmes e mais rápidos que sopram em altitudes mais elevadas.

E é isso que as empresas estão aprendendo a fazer, por meio de uma série de avanços incrementais: designs melhores, materiais melhores, locais melhores (posicionar as turbinas eólicas em águas costeiras é a solução). Assim, o que veremos dentro de alguns anos serão turbinas eólicas de 250 metros de altura que derrotarão facilmente os combustíveis fósseis em termos de custo.

Para parafrasear o escritor de ficção científica William Gibson, o futuro da energia renovável na verdade já chegou; mas ainda não está distribuído de maneira equitativa.

É fato que restam questões de intermitência a resolver — o vento não sopra e o sol não brilha sempre —, ainda que baterias e outras tecnologias de armazenagem de energia também estejam realizando rápidos progressos.

Também existem alguns usos no campo da energia, especialmente no transporte, em que os combustíveis fósseis retêm vantagem significativa em termos de custo e conveniência. E de que maneira poderemos ter viagens aéreas que compensem plenamente seu impacto em termos de emissão de poluentes é algo que... bem, ainda está no ar.

Mas não existe mais qualquer razão para acreditar que seria difícil "descarbonizar" dramaticamente a economia. De fato, não há razão para acreditar que fazê-lo imporia custos econômicos significativos. O debate realista é determinar o quanto será difícil chegar dos 80% aos 100% de descarbonização.

Por enquanto, porém, o problema não está na tecnologia, mas na política.

DINHEIRO E PODER

O setor de combustível fóssil pode representar um beco sem saída tecnológico, mas continua a ter muito dinheiro e poder. Recentemente, todo esse dinheiro e todo esse poder vêm sendo usados em favor do Partido Republicano, nos Estados Unidos. Por exemplo, no ciclo eleitoral de 2016, o setor de mineração de carvão fez 97% (!) de suas doações de campanha a candidatos republicanos.

O que o setor recebe em retribuição por esse dinheiro não é só um presidente que diz asneiras sobre recriar os empregos perdidos no setor de carvão e um governo que rejeita as conclusões científicas sobre a mudança do clima.

Entre outras coisas, ele recebeu um presidente da Agência de Proteção Ambiental (EPA) que tenta suprimir as provas quanto aos danos causados pela poluição, e um secretário da Energia que tentou, até agora sem sucesso, forçar o setor de gás natural e o de energia renovável a subsidiar o carvão e as usinas nucleares.

Em longo prazo, essas táticas provavelmente não deterão a transição para a energia renovável, o que é algo que até mesmo os vilões dessa história provavelmente percebem. O objetivo deles, em lugar disso, é retardar as coisas para que possam extrair o máximo possível de seus investimentos existentes.

Infelizmente, o que temos aqui é um caso real de "em longo prazo todos estaremos mortos". Cada ano de postergação na transição para a energia limpa traz doença e morte a milhares de pessoas, e faz crescer o risco de uma catástrofe climática.

O ponto é que Trump e companhia não estão apenas tentando nos fazer retroceder nas questões sociais; também estão tentando bloquear o avanço tecnológico. E o preço dessa obstrução será alto.
 
Tradução de PAULO MIGLIACCI

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