Paul Krugman

Prêmio Nobel de Economia, colunista do jornal The New York Times.

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Paul Krugman

Os republicanos continuam em guerra contra os trabalhadores

Os tempos estão bons? Puna o desempregado; estão ruins? Puna o desempregado também

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Será que o Partido Republicano, que defende os interesses das grandes empresas e buscou manter os salários baixos desde o fim do século 19, de repente se tornou populista?

Alguns de seus astros em ascensão gostariam que as pessoas acreditassem nisso. Por exemplo, depois da eleição de 2020, o senador Josh Hawley declarou que “devemos ser um partido da classe trabalhadora e não um partido de Wall Street”.

Mas embora os republicanos tenham recentemente atacado determinadas empresas, sua briga com as grandes companhias parece se referir a questões não econômicas. Muito os incomoda que parte das corporações americanas tenham se posicionado, ainda que moderadamente, em favor da igualdade social e contra a supressão de eleitores.

O que não os incomoda é o fato de que muitas empresas pagam pouco ou nada em impostos, e remuneram mal seus trabalhadores. Quanto a essas questões, o Partido Republicano continua a ser como sempre foi: a favor de cortes de impostos que beneficiam as empresas e os ricos, e contra qualquer coisa que possa melhorar a vida dos trabalhadores comuns.

O presidente dos EUA, Joe Biden, em discurso no Salão Leste da Casa Branca, em Washington - Kevin Lamarque - 10.mai.21/Reuters

O exemplo mais recente: o esforço republicano para pôr fim aos benefícios-desemprego expandidos que apoiaram milhões de famílias americanas ao longo da pandemia, mesmo que o desemprego continue muito elevado.

Múltiplos estados controlados pelos republicanos agiram para tesourar o suplemento mensal US$ 300 (R$ 1.571) oferecido sob o American Rescue Plan (Plano de Resgate Americano, em tradução livre), mesmo que isso signifique a rejeição de seus governos por um dinheiro recebido sem custos, que os ajuda a estimular suas economias –o suplemento é coberto em sua íntegra pelo governo federal.

E quem vem pressionando por um corte na assistência aos desempregados. A Câmara de Comércio dos Estados Unidos, veja só. Mas o Partido Republicano não havia se tornado inimigo das corporações e defensor da classe trabalhadora?

Antes que eu trate das questões substantivas, aqui, é importante estar ciente do contexto histórico –a saber, que os republicanos sempre se opuseram à ajuda aos desempregados, não importa em que situação a economia esteja.

Em 2011, com a economia ainda em profunda depressão como consequência da crise financeira de 2008, a liderança republicana atacou os benefícios-desemprego que, segundo ela, encorajavam as pessoas a “ficar em casa e assistir televisão”.

E na metade do ano passado, quando uma alta nos contágios pelo coronavírus forçou boa parte do país a voltar ao lockdown, o senador Lindsey Graham declarou que expandir os benefícios aos desempregados “só vai passar por sobre nossos cadáveres”.

Menciono esses exemplos do passado para que os leitores se convençam de que o ataque que vem surgindo contra os desempregados não é uma resposta em boa-fé a qualquer coisa que esteja de fato acontecendo na economia.

Isto posto, existe algum argumento para afirmar que os benefícios relativamente generosos estão prejudicando a recuperação econômica, por desencorajar os americanos de aceitar os empregos disponíveis?

Até o relatório sobre o emprego da semana passada, havia um acordo generalizado entre os pesquisadores econômicos no sentido de que os benefícios expandidos adotados durante a pandemia não estavam reduzindo o emprego significativamente.

Notavelmente, o vencimento do benefício de US$ 600 (R$ 3.143) por semana introduzido em março de 2020 não conduziu a uma alta geral no nível de emprego; especialmente nos estados de baixo patamar salarial, nos quais os benefícios deveriam ter criado forte incentivo a rejeitar ofertas de emprego, o nível de emprego não subiu mais do que nos estados de salários altos, quando o benefício expirou.

Na sexta-feira (7), porém, o Escritório de Estatísticas do Trabalho do governo americano anunciou que a economia dos Estados Unidos criou apenas 266 mil empregos novos em abril, muito abaixo do consenso das expectativas, que era da ordem de um milhão de empregos.

Isso foi prova de que a economia realmente está sendo desestimulada porque estamos “pagando as pessoas para não trabalharem?” Não. Para começar, jamais devemos dar importância demasiada aos números de um mês isolado, especialmente em uma economia ainda distorcida pela pandemia. Por exemplo, o número baixo reportado passou por “ajuste sazonal”.

A economia, na verdade, criou mais de um milhão de postos de trabalho; no entanto, o departamento responsável pelos cálculos ponderou os números, para baixo, porque a economia normalmente cria muitos empregos novos no segundo trimestre. Essa é uma prática comum, e estatisticamente correta –mas estamos vivendo um segundo trimestre normal?

Além disso, se os benefícios-desemprego estão impedindo o crescimento do emprego, veríamos o pior desempenho nos setores de baixo salário em que os benefícios são altos com relação ao salário médio.

Mas o padrão real foi o oposto: grande avanço do emprego nos setores de baixo salário, como lazer e hospitalidade, e perda de empregos em setores de remuneração elevada como os serviços profissionais.

Não quero dar importância demasiada a isso, porque há outras coisas acontecendo enquanto a vida volta gradualmente ao normal –ainda que os números do emprego retratem a situação na metade de abril, cedo demais para refletir o forte progresso conquistado recentemente contra a expansão do contágio pelo coronavírus.

Mas de qualquer forma, os números do emprego não justificam a história de que o problema está no benefícios-desemprego.

O que aconteceu de fato, então? Não sabemos. Talvez tenha sido uma aberração estatística, talvez diversos fatores, que variam da escassez de chips à falta de creches, tenham ajudado a frear o crescimento do emprego.

O sensato é esperar alguns meses por novas indicações, e não correr para suspender uma ajuda que se tornou essencial para milhões de famílias.

Punir os desempregados é o que os republicanos fazem, sempre que podem, não importa quais sejam as circunstâncias econômicas. O Partido Republicano, apesar de estar tentando fazer uma nova pose, continua sendo o partido das grandes empresas.

Traduzido originalmente do inglês por Paulo Migliacci

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