Pedro Hallal

É epidemiologista, professor da Escola Superior de Educação Física da Universidade Federal de Pelotas e coordenador do Epicovid-19, o maior estudo epidemiológico sobre coronavírus no Brasil.

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Pedro Hallal
Descrição de chapéu Coronavírus

O cabo de guerra entre a variante delta e a campanha de vacinação

A pandemia de Covid-19 ainda não acabou, embora muitas pessoas insistam em ignorar esse fato

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No tempo de escola, uma das brincadeiras que eu mais gostava, junto com a corrida do saco, era o cabo de guerra. Lembro das disputas acirradas nas Olímpiadas do Colégio Gonzaga. A lógica da brincadeira de cabo de guerra é simples: duas equipes fazem força em sentidos opostos, e aquela que conseguir puxar com maior força vence a disputa.

A analogia com o estágio atual da pandemia de coronavírus é perfeita. De um lado, a variante delta faz força para aumentar o número de casos, hospitalizações e óbitos. De outro, a campanha de vacinação faz força para reduzir os mesmos indicadores. Por enquanto, é uma disputa parelha.

Crianças brincam de cabo de guerra em cidade do Rio Grande do Sul - Leticia Moreira - 2.nov.2011/Folhapress

A média móvel de casos vinha em queda, indicando vitória da campanha de vacinação, mas houve uma preocupante estabilização nos últimos dias e até um aumento da razão de transmissão no Brasil. Seria a reação da variante delta? Em relação aos óbitos, a campanha de vacinação continua vencendo: os números seguem em queda, embora ainda ao redor de inaceitáveis mil mortes todos os dias.

Todos os dias eu sou questionado sobre quando poderemos voltar a viver normalmente. Às vezes a pergunta é formulada de outra maneira: quando acaba a pandemia?

A resposta para essa pergunta, nesse momento, se resume a esse cabo de guerra entre a variante delta e a campanha de vacinação.

Precisaria ser assim?

Claro que não.

O Brasil poderia colocar outras forças puxando a nosso favor, contra o vírus.

Imagina como seria mais fácil para a campanha de vacinação se ela fosse ajudada por outras estratégias, como a testagem em larga escala, o rastreamento de contatos, o isolamento de suspeitos.

Imagina como seria mais fácil se a campanha de vacinação viesse acompanhada de medidas rígidas e curtas de restrição da circulação, como foi feito nos países que obtiveram maior sucesso.

Imagina como seria mais fácil se a campanha de vacinação viesse acompanhada de uma comunicação unificada, dos políticos, pesquisadores, atores, esportistas, jornalistas, todos remando para o mesmo lado.

Imagina como seria mais fácil para a campanha de vacinação se não houvesse um discurso negacionista, coordenado pelo próprio governo federal, tentando desqualificar uma das vacinas em uso no país.

Imagina como seria mais fácil para a campanha de vacinação se o próprio presidente da República tivesse tomado a sua vacina e postado nas mídias formais e informais, para motivar seus apoiadores a fazerem o mesmo.

Imagina como seria mais fácil para a campanha e vacinação se, ao invés de cobrar propina, os negociantes de vacina estivessem focados em salvar vidas.

Imagina como seria mais fácil se, ao invés de investir em cloroquina, o governo tivesse investido, desde o começo, em vacina.

Imagina como seria mais fácil se um dos 101 emails enviados pela Pfizer tivesse sido respondido e as vacinas adquiridas na hora certa.

Imagina como seria mais fácil se o presidente estivesse preocupado com a pandemia, e não com as próximas eleições.

A campanha de vacinação é tão potente que, mesmo com todos esses problemas, ela continua rivalizando com a variante delta. Até quando ela conseguirá?

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