Frequento o restaurante Mocotó, na Vila Medeiros, desde o começo do século. Era a época em que o Rodrigo Oliveira tinha acabado de tomar as rédeas do negócio do pai, então uma casa do norte, e começava a mudar o cardápio.
Não lembro se os dadinhos de tapioca já eram servidos. O carro-chefe, à época, ainda era o caldo de mocotó que batiza o restaurante. Eu, porém, gostava mais de um outro caldo: a favada, uma das comidas mais reconfortantes que conheço, que ainda está no menu.
Favada, numa comparação imprecisa, é uma feijoada feita com favas no lugar do feijão-preto. Favas, para quem não as conhece, são feijões gigantes.
Um antepassado da favada do sertão pernambucano é a fabada asturiana, do norte da Espanha –que é feita com feijão-branco, não com fava.
No tempero, a favada brasileira lembra curiosamente o chili con carne do sudoeste dos EUA. Culpe o coentro e o cominho, que entram em abundância.
Completa o trio de temperos o colorau, que deixa o caldo avermelhado. Colorau é feito de urucum, mas o pó vendido na feira é quase só fubá. Eu extraí a tintura de sementes de urucum no óleo. É só aquecê-las e esperar meia hora.
As favas, brancas ou rajadas, demoram um bocado para ficarem macias. Esse tempo se reduz se você as deixar de molho entre 12 e 36 horas, na geladeira.
Cozinhar na pressão agiliza bastante as coisas, mas tem um senão: você não controla bem o ponto de cozimento. Um vacilo e as favas se desfazem. Não é o que queremos aqui.
Prefiro cozinhar na panela normal, em fogo brando, até as favas estarem cremosas por dentro, porém inteiras. Exige paciência, pode levar umas duas horas (depende se os grãos são novos ou velhos). Vá testando enquanto cozinha.
Algumas receitas de favada equivalem a uma feijoada completa: levam mocotó (aí alguns a chamam de mocofava), bucho, costelinha, pé de porco e tal. Eu fiz uma versão simplificada, só com bacon, linguiça defumada e charque.
Couve? Laranja? Não, não combinam. Arroz? Até vai bem, mas certamente não precisa. A favada é um caldo para tomar de colher, com um pouco de farinha e pimenta.
E uma cachaça branca para rebater.
FAVADA
Rendimento: 4 porções
Dificuldade: média
Ingredientes
250 g de favas secas
100 g de carne-seca
1 colher (sopa) de sementes de urucum
50 ml de óleo
100 g de bacon picado
4 dentes de alho picados
1 cebola grande picada
3 folhas de louro
150 de linguiça defumada em rodelas
1 colher (sopa) de cominho
1 xícara de coentro picado
Sal a gosto
Modo de fazer
- Deixe as favas de molho por pelo menos 12 horas.
- Pique a carne seca em cubos de 2 cm e os ferva por 5 minutos em água abundante. Repita a operação duas vezes, trocando a água. Escorra e reserve.
- Aqueça o óleo com o urucum e reserve por pelo menos meia hora.
- Numa panela, coe o óleo de urucum e derreta o bacon. Refogue o alho e a cebola.
- Junte as favas (descarte a água do molho) e o louro. Cubra com água e deixe ferver. Abaixe o fogo e adicione o cominho, a carne-seca e a linguiça.
- Cozinhe as favas até ficarem macias. Ajuste o sal, desligue o fogo e misture o coentro verde.
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